12 junho 2010

DA LINGUAGEM CUIABANA

Livro Virtual com 629 KB – 153 páginas
LEIA A EDIÇÃO DIÁRIA DO “VARANDA CUIABANA”:
www.varandacuiabana.blogspot.com
EDITORA MEMÓRIAS CUIABANAS

02/12/2007

À minha esposa Mindinha.
Aos meus filhos Marcelo, Márcia Fátima, Marcos e Mauro.
Ao meu genro Roberto e às minhas noras Lílian, Cristiane e Joice.
Aos meus netos Lucas, Victor e Daniella.
A todos os mato-grossenses de nascimento e de coração.

Ficha Catalográfica:
JUCÁ, Pedro Rocha. Da linguagem cuiabana. Cuiabá: Editora Memórias
Cuiabanas, 2007. Livro virtual.
Índice para catálogo sistemático:
1. Mato Grosso -
2. Origem do Português e sua Influência na Linguagem Cuiabana.
3. Glossário Cuiabano.
4. Poetas de Mato Grosso.

ÍNDICE
PREFÁCIO, 04.
A – LINGUAGEM CUIABANA: ORIGEM
I – A LINGUAGEM E A COLONIZAÇÃO, 08.
II - DESDE A PENÍNSULA IBÉRICA. 13.
III - DA EUROPA E DO BRASIL, 19.
IV – UM HISTÓRICO DA LINGUA, 24.
V - A CUIABÁ PORTUGUÊSA, 27.
VI – A COLONIAL CUIABÁ CULTA, 36.
VII - HERANÇA PORTUGUÊSA, 44.
VIII - DA CAPITANIA À PROVÍNCIA, 49.
IX - ORÍGENS E INFLUÊNCIAS, 54.
X – UMA EXPRESSÃO REGIONAL, 60.

B – GLOSSÁRIO CUIABANO
DA LETRA “A” ATÉ “Z”, 65.

C – POETAS DE MATO GROSSO
ROMANTISMO, PARNASIANISMO, SIMBOLISMO, MODERNISMO E CUIABÁ EM POESIA, 123.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, 150
DO AUTOR, 153.

"É melhor escrever errado a coisa certa do que escrever certo a coisa errada" - Patativa do Assaré

PREFÁCIO

O autor deste livro é Pedro Rocha Jucá, formado em Direito e em Pedagogia e jornalista profissional desde 1961, registrado sob o nº MTB 47-MT. Nasceu em Crato, Estado do Ceará, em 12.05.1941, com ascendência portuguesa nas suas raízes familiares no Cariri (Rocha, Figueiredo, Maia, Macedo e outras que se fixaram ao redor do Engenho Santa Teresa, os chamados "Terésios", os primeiros que povoaram a Capitania do Ceará), e nos Inhamuns (Feitosa, Freire, Castro, e Jucá - uma homenagem aos índios da região, entre outras). Procedente da sua terra natal, chegou a Corumbá, ainda no Estado de Mato Grosso, onde seu pai residia, em 1959. Ali fundou e foi o primeiro presidente do Centro dos Estudantes Secundários de Corumbá.

Mudou-se para Cuiabá no mesmo ano de 1959 e foi um dos fundadores, vice- presidente e presidente da União Mato-grossense dos Estudantes Secundários. Depois de prestar o serviço militar no então 16.º Batalhão de Caçadores (hoje 44.º Batalhão de Infantaria Motorizada), iniciou suas atividades no jornal “O Estado de Mato Grosso”, que dirigiu por quase 25 anos. Em 1969, fundou o atual Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de Mato Grosso. Foi correspondente em Cuiabá da revista "Visão" e do jornal "O Estado de S. Paulo" e presidente da Academia Mato-grossense Maçônica de Letras. É um dos mais antigos membros da Academia Mato-Grossense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso.

Prestou e presta serviços a Mato Grosso tornando-se um dos Cuiabanizados, cuja figura máxima é o Barão de Melgaço. Foi secretário da comissão especial presidida pelo acadêmico Adauto Dias de Alencar, nomeada pelo governador Júlio Campos para oficializar o Hino de Mato Grosso pelo Decreto nº 208, de 05.09.1983, e sugeriu ao governador Jayme Veríssimo de Campos a necessidade de se regulamentar a aplicação das cores dos símbolos oficiais de Mato Grosso, o que aconteceu com o Decreto nº 5.003, de 29.08.1994.

Foram-lhe conferidos os seguintes títulos e comendas: I – CIDADÃO CUIABANO HONORÁRIO, da Câmara Municipal de Cuiabá, pelo Decreto Legislativo nº 030/72, de 11.12.1972; II – COMENDA DA ORDEM DO MÉRITO DE MATO GROSSO, no Grau de Cavaleiro, do Governo do Estado, pelo Decreto nº 216/83, de 09.09.1983; III – COMENDA DA ORDEM DO MÉRITO LEGISLATIVO CUIABANO, da Câmara Municipal de Cuiabá, pelo Decreto Legislativo nº 029/83, de 29.09.1983; IV – MEDALHA DO PACIFICADOR, pelo Ministério do Exército, entregue em 19.11.1991, em cerimônia militar realizada na 13.ª Brigada de Infantaria Motorizada, em Cuiabá - Mato Grosso; V – COMENDA “MEMÓRIA DO LEGISLATIVO”, da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso, pela Resolução nº 175/98, de 05.01.1999, entregue em 16.08.2001; VI – CIDADÃO MATO-GROSSENSE HONORÁRIO, da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso, pela Resolução nº 85/2000, de 10.05.2000, entregue nessa data; VII – HONRA AO MÉRITO “LUÍS PHILIPPE PEREIRA LEITE”, da Prefeitura Municipal de Cuiabá, no ano de 2000, “pelos relevantes serviços prestados a Cuiabá”; VIII - COMENDA ESCRITOR CIPRIANO JUCÁ, da Academia Maceioense de Letras, entregue em 18.10.2004; IX - COMENDA DO MÉRITO LITERÁRIO, conferido pela Academia Maceioense de Letras, entregue em 18.10.2004.

No jornal “O Estado de Mato Grosso” implantou a primeira empresa jornalística de Mato Grosso. Edita desde 2001, na Internet, o jornal eletrônico "Varanda Cuiabana". É’ o pioneiro na edição de livros virtuais em Mato Grosso.

Publicou os livros: A Imprensa Oficial em Mato Grosso, 1986. Personalidades da Historia de Mato Grosso, 1987. Os símbolos Oficiais do Estado de Mato Grosso, 1990. Exemplo e Palavra de Jornalista, 1995. Diário Histórico de Mato Grosso, 2002 (virtual). Os Jucás dos Inhamuns, 2002 (virtual). Mato Grosso de hoje e Sempre I, II, III, em 2003, 2004 e 2005 (virtuais).

Casou-se com Carminda Póvoas Jucá, de conhecida família de renomados educadores, na qual também se casou o Dr. António de Arruda, de invulgar capacidade intelectual e polimorfismo cultural que lhe permitiu atuação respeitada nos mais diversos campos de conhecimento, dos mais simples aos mais complexos. O casal Carminda-Jucá tem quatro filhos, um genro, três noras e três netos.

Depois de quase 35 anos de pesquisa escreve o jornalista Pedro Rocha Jucá sobre a Linguagem Cuiabana ligando-a ao português arcaico, vulgar, trazido pelos bandeirantes, e culto, de uso dos capitães-generais, e conservada em Cuiabá pelo isolamento geográfico, além da influência da linguagem dos índios e dos negros.

Ele chegou a essa conclusão numa profunda e meticulosa investigação histórica, cuidadosamente comprovada, remontando à formação de Portugal até a sua unificação. Do mesmo modo estudou a História de Cuiabá, o inicio de Mato Grosso, desde os primeiros bandeirantes, a sua fundação, e os capitães–generais, até os primeiros presidentes da Província de Mato Grosso, descrevendo aspectos culturais, estatísticos, políticos, sociais, com cuidado e veracidade.

Registra informações desse período e dos viajantes, com suas impressões. Ao ensejo do estudo da linguagem cuiabana escreve uma História de Mato Grosso a ser lida e conservada, com relatos cuidadosamente investigados e comprovados. Talvez possamos, também, considerar um cuiabanês culto e um vulgar.

Relembra também os nomes dos grandes mestres cuiabanos, o que nunca é demais repetir, desembargadores José Barnabé de Mesquita e António de Arruda, professores Antônio de Figueiredo Cesário Neto, Filogônio de Paula Corrêa, Nilo Póvoas, Isác Póvoas, Benedito Pedro Dorilêo, historiadores Corsíndio Monteiro da Silva, Estevão Anastácio Monteiro de Mendonça e Virgílio Corrêa Filho, entre outros, com destaque para Dom Aquino Corrêa, e os citados nesta pesquisa, e na bibliografia, como o Dr. José Vidal.

Convém enfatizar que o primeiro estudioso da linguagem cuiabana foi o Professor Franklin Cassiano da Silva, seguindo-se os trabalhos do Dr. António de Arruda e Maria Drummond. Outros trabalhos são estudados minuciosamente. No final traz um glossário do falar cuiabano, em que teve a cooperação de Dunga Rodrigues, António de Arruda, Rubens de Mendonça, Ivens Cuiabano Scaff, Carminda Póvoas Jucá, entre outros, com palavras antigas e algumas mais recentes, como ”digoreste”, tema de estudo com o Dr. António de Arruda, de justas ponderações.

Registra os estudos sobre o falar cuiabano guardado do português arcaico, que, desfeito o isolamento geográfico, tende a ser homogeneizado com a influência das grandes massas imigradas que trazem suas pronuncias próprias. Antes disso já se sentia a influência dos meios de comunicação falada, TV e Rádio. E é importante esse registro, que faz parte de nossa história.

O mesmo aconteceu em outros lugares de grande procura pelos que aspiram melhoria de condições de vida, como também no Rio, onde o falar carioca não é o mesmo de meio século atrás. Às vezes os locutores de TV hesitam na pronúncia de alguns nomes, que passaram a ter evidência, Roraima entre eles, em que foi adotada pelos locutores a pronúncia cuiabana, do português arcaico.

Em suma, é um livro que merece ser lido. “A Cuiabá moderna do presente não conseguiu esquecer a Cuiabá histórica que Portugal construiu para a eternidade...” A farta bibliografia mostra a cuidadosa pesquisa. É um livro daqueles que ficam, isento de equívocos.

Rio de Janeiro, 5 de Abril de 2007

LUIZ ALVES CORRÊA



NOTA DO AUTOR:

O Dr. Luiz Alves Corrêa merece meu reconhecimento pelo empenho na correção do texto final do “Glossário Cuiabano”, onde fez valiosos acréscimos. Ao chegar o momento de editar o livro virtual “Da Linguagem Cuiabana”, resultado de quase 35 anos de pesquisa, entre aqueles que reuniam condições de prefaciar este trabalho escolhi o Dr. Luiz Alves Corrêa, um legítimo representante do que há de melhor na vida cultural e política do Estado. Nascido em Cuiabá, Mato Grosso, é filho do Dr. Estevão Alves Corrêa e de Da. Elvira Alves Corrêa. Fez 1º e 2º anos primários na Escola Francisco Cabrita, no Rio; 3º e 4º na Escola Modelo Barão de Melgaço, 1º Ano do Curso Anexo e Admissão, com o professor Isác Povoas; curso secundário no Liceu Cuiabano, de 1932 a 1935; curso complementar no Colégio Lafayete, e no Colégio Universitário. É médico formado pela Faculdade Nacional de Medicina da Universidade do Brasil, é da turma de 1944. Curso de Laboratorista da Saúde Publica Federal.

Sua vida profissional foi exemplar: médico da Saúde de Mato Grosso; médico da Santa Casa da Misericórdia de Cuiabá; médico e vice-diretor da Maternidade de Cuiabá nos seus primeiros anos; Chefe do Serviço Médico do IAPETEC; Chefe da Divisão de Maternidade e Infância, da Legião Brasileira de Assistência em Mato Grosso e depois em Brasília; Médico do SESC; Médico da Fundação Hospitalar do DF, no Hospital L2 Sul.

Recebeu vários títulos e homenagens: sócio fundador da Associação Médica de Mato Grosso e do Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso; membro titular e emérito do Colégio Brasileiro de Cirurgiões; membro fundador do Capitulo de Brasília do Colégio Brasileiro de Cirurgiões e Colégio Internacional de Cirurgiões; possui título de especialista em Cirurgia pela Associação Médica Brasileira, e de sócio da mesma; sócio jubilado da Associação Médica de Brasília; inscrito no CRM de Mato Grosso e no de Brasília, estando hoje aposentado; titulo de Mérito Profissional, outorgado pelo Rotary Clube Rio de Janeiro, Lagoa. O seu nome está em uma Enfermaria da Santa Casa de Misericórdia de Cuiabá

Casou-se em primeiras núpcias com Da. Lydia de Carvalho Alves Corrêa, tendo quatro filhos, 10 netos e três bisnetos. Exerceu a Medicina inicialmente em Cuiabá e depois em Brasília. Reside no Rio de Janeiro onde, enviuvando, casou-se com Da. Josefá Francisca de Sousa, fisioterapeuta.

A – LINGUAGEM CUIABANA: ORIGEM


I – A LINGUAGEM E A COLONIZAÇÃO
A linguagem é uma ciência, com as suas variáveis, pois expressa os pensamentos através de diversas formas de comunicação, seja ela individual ou social, podendo surgir num simples gesto de sensibilidade. A linguagem hoje conhecida por falada foi uma das primeiras manifestações do comportamento humano. Teve uma longa evolução através de 950.000 anos, atingindo há 50.000 anos, aproximadamente, a estrutura que conhecemos. A linguagem articulada é mais recente, como resultado do registro escrito descoberto no Egito, há 3.400 a.C., (há quase 5.500 anos) com a forma de hieróglifos, que descreviam as palavras, antecipando a depois escrita silábica da Mesopotâmia. Os fenícios produziram o primeiro alfabeto conhecido, com 22 letras, em 1.100 a. C (quase 3.100 anos), numa região do atual Líbano.

A utilização, pelos hindus, do sistema decimal de numeração em 300 a.C (há mais de 2.300 anos) foi importante para o avanço da linguagem. O papel, inventado pelos chineses em 100 d.C. (menos de dois milênios), chegou à Alemanha com doze séculos de atraso. A descoberta da imprensa, em 1453, usando os tipos móveis, por Johannes Gutenberg, foi decisiva para a divulgação do conhecimento humano e das suas múltiplas manifestações.



A concentração da linguagem é contínua e acelerada. Até o final do Século XXI, mais da metade das atuais 6.800 línguas está ameaçada de extinção. Entre 3.400 e 6.120 idiomas são usados por comunidades pequenas, com menos de 2.500 nativos (o mínimo que é cientificamente aceito), com a triste estatística de uma língua extinta a cada duas semanas. Em oito países estão mais da metade dos idiomas agora conhecidos: Papua, Nova Guiné, Indonésia, Nigéria, Índia, México, Camarão, Austrália e Brasil.



Na definição de Sêneca, “A linguagem é o semblante da alma”. Por isto, é lógico dizer: “A Linguagem Cuiabana é o semblante da alma mato-grossense”, pois ela sobreviveu durante três séculos no centro da América do Sul. Não é um "vício de linguagem", como alguns pensam. Trata-se de Português legítimo, do Século VI, vindo do Norte de Portugal, com influências do Trasmontano ou Transmontano; do Galego, desde os primórdios da formação da língua; do Mirandês, reconhecido como a segunda língua oficial Portugal, embora mais espanholado; e do Algárvio, mais latino, enriquecido pelo português fidalgo de Lisboa, Coimbra e Porto.



A Capitania de Mato Grosso teve outras manifestações de linguagem, incluindo as indígenas e as africanas. A “Linguagem Cuiabana” é uma mistura do Português Culto e do Português Vulgar, oriundo da Península Ibérica, no Século XVI, e das influências recebidas dos índios e dos escravos africanos. A História Lingüística no Brasil, surgida no Século XX, dará o merecido valor à “Linguagem Cuiabana”, uma das mais antigas versões do Português Europeu, preservado em Cuiabá.



No artigo "Cultura, Um Direito de Todos", na "Folha de S. Paulo" de 08/11/2005, o historiador e professor titular aposentado da UNICAMP Jaime Pinsky disse: "Toda a produção material ou imaterial do gênero humano pode ser chamada de cultura". Para ele, cultura é "o patrimônio que a humanidade acumula a cada geração". Citou, como exemplos: a Filosofia grega, a Ética dos profetas hebreus, o Direito romano, as pinturas e esculturas de Leonardo da Vinci, Michelangelo e Rafael, a música de Bach e Beethoven, e outros.



Mais adiante: "O traço mais marcante da distinção entre os homens e os demais animais é a nossa capacidade de produzir e transmitir cultura". Para ampliar o seu raciocínio, chegou ao ponto que corresponde ao objetivo do "Varanda Cuiabana": "Se sem pesquisa a produção intelectual fica rasa, sem diálogo com a sociedade fica estéril". Si ter Cultura é um direito, divulgá-la é um dever de todos.



Há quase 35 anos pesquiso a “Linguagem Cuiabana”. Iniciei pelo glossário e tive a “fortuna” de concluir que ela é uma valiosa manifestação de cultura regional, com características e individualidades. É uma linguagem que rompeu três séculos. A estrutura da “Linguagem Cuiabana” poderá ser resumida nos seguintes itens:



a) Tem sua origem no Galego-Português falado nos séculos VI e VII, em Trás-Os-Montes, Norte de Portugal. A região foi invadida por suevos, celtas, iberos, gregos, lusitanos, visigodos, germanos, cartagineses, fenícios, romanos e árabes.



b) Na Península Ibérica, somou o Trasmontano ou Transmontano; o Galego, nos primórdios da formação da língua; o Mirandês, a segunda língua de Portugal, com influência espanhola; e o Algárvio, com influência do árabe (Algarve vem do árabe Al-Gharb, o Ocidente). Cerca de 600 palavras árabes estão no Português (quibe e esfirra, por exemplo).



c) A “Linguagem Cuiabana” é um autêntico registro idiomático do Português falado na Europa do Século XVI. Preservou os valores fonéticos do Português Culto que surgiu no Século XVII. Do livro “Os Lusíadas”, de Luiz Vaz de Camões, a obra do mais célebre poeta da Literatura Portuguesa, foram recolhidas algumas palavras como exemplo da identidade existente entre o Português Europeu do Século XVI e a “Linguagem Cuiabana”, mostrando que esta última não é, e nunca será, um vício de linguagem, mas um exemplo vivo da nossa história cultural. Entre elas estão: treição, derriba, alevantado, chuça, alumiasse, estorvar e arreceio.



d) O Galego e o Português são línguas irmãs. A sua ortografia é ainda usada no Porto, onde grande parte da população aplica o "om" em vez do "ão" (coraçom ao em vez de coração, por exemplo). Existem vários outros exemplos.



e) Embora de origem espanhola, o Mirandês, a segunda língua oficial de Portugal (Concelho de Miranda do Douro), marcou presença na “Linguagem Cuiabana”. Somente na letra "M", o seu glossário registra várias palavras faladas em Cuiabá: mimoso, viçoso, modorra (sonolência), madurar (amadurecer), matreiro (ladino), mosca morta (sem iniciativa), moucho (banco de sentar) e entojar (causar nojo).



f) O longo isolamento geográfico do Algarve preservou o Português Arcaico. O "Dicionário do Falar Algárvio", do professor Eduardo Brazão Gonçalves, é fonte de exemplos da sua influência na "Linguagem Cuiabana": a) predomínio da vogal forte: alomear (iluminar), ôrives (ourives), más (mais), sês (seis), ôtro (outro),); b) pouca acentuação esdrúxula: abob'ra (abóbora), apost'lo (apóstolo), rot'la (rótula); c) contração da vogal da penúltima sílaba e da consoante da última: relampo (relâmpago), estâmo (estômago); d) o não uso da vogal fraca do ditongo em crescente final: cemitero (cemitério), noda (nódoa), influença (influência), poliça (polícia), relojo (relógio), viço (vício), maliça (malícia); e) manutenção do "ô" no plural: ôvos, miôlos, jôgos: e) queda do fonema inicial: sobiar (assobiar), presentar (apresentar); f) acréscimo de fonema inicial: apegar, avoar, alevantar; g) palavras terminadas em "ã", femininas, no masculino mantendo o gênero inicial: fruta temporão, amanhão; h) a substituição do “c” por “d”: degotado (decotado); i) o particípio passado irregular recebendo acento tônico na vogal do radical: enxuto (enxugado), roto (rompido), descalço (descalçado); e i) o uso de "'mim" arcaico em vez de"eu": isto é para mim.



g) Os bandeirantes paulistas falavam Tupi-Guarani em casa, Espanhol nas ruas e Português Vulgar nas repartições públicas. Nas Minas do Cuiabá, receberam forte influência do falar dos índios e negros, valorizando a “Linguagem Cuiabana” com várias palavras e expressões.



Essa linguagem secular construiu características históricas e ortográficas em Mato Grosso. Algumas pessoas utilizam: “o” Mato Grosso, "do” Mato Grosso, “no“ Mato Grosso, “para o” Mato Grosso e assim por diante. O correto é nunca usar o artigo definido “o”, citando apenas Mato Grosso, “de” Mato Grosso, “em” Mato Grosso, “para” Mato Grosso e suas variantes. No livro "Universo Verbal de Dom Aquino", o acadêmico Corsíndio Monteiro da Silva cita a única hipótese do artigo masculino em relação ao Estado: "Mato Grosso, de fato, fadara-o Deus - Oração pleonástica. Início da frase com o objeto direto mais adiante reforçado com o pronome o. Objeto direto reforçado. "Mato Grosso, de fato, fadara-o Deus a ser o mais glorioso cenário, para o zelo apostólico do missionário salesiano" ("Discursos. Vol. III. 2.ª ed., 1954, p-10)". Dom Francisco de Aquino Corrêa, com a sua sabedoria, também consagrou um fato consumado desde a criação da Capitania de Mato Grosso, pela Carta Régia de 09/05/1748, firmada por “D. João por graça de Deus, Rei “de” Portugal”... Diversos gramáticos brasileiros trataram do assunto e são unânimes: antes de Mato Grosso não se usa o artigo definido masculino e nem se contrai a preposição com esse artigo.



No seu “Dicionário da Língua Portuguesa”, elaborado sob patrocínio da Academia Brasileira de Letras, Antenor Nascentes diz: “Mato-grossense, adj. Relativo a Mato Grosso. || s.m. e f. Natural ou habitante desse Estado brasileiro”. Além de ensinar a aplicação correta do artigo em relação ao Estado de Mato Grosso, o dicionarista é casado com uma cuiabana e confirma: a grafia correta é “mato-grossense” com o hífen. Para o desembargador António de Arruda, um dos maiores nomes da cultura de Mato Grosso, acrescentou: “Só se deve empregar o hífen quando os elementos da palavra são autônomos e constituem um conjunto específico”. Está evidente que a palavra “grossense”, isoladamente, “não possui vida autônoma”, mas forma um conjunto específico quando se refere ao gentílico de quem nasce em Mato Grosso.



Consultei o jornalista Arnaldo Niskier, então presidente da Academia Brasileira de Letras. Resumindo, este é o seu parecer: a) O gentílico de Mato Grosso é mato-grossense, com hífen; b) A grafia foi mantida pela Academia Brasileira de Letras no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, atualizado pela Lei nº 5.765, de 18/12/1971; e c) Embora respeitando as tradições regionais, a ABL sempre tratou da “uniformidade gráfica”, pois, “não fosse assim, estaríamos escrevendo hoje como se escrevia no Século XVI, um sem número de palavras, cuja grafia logrou sobreviver por séculos”. O professor e filólogo Cláudio Moreno, complementa essa explicação: “Os gentílicos compostos levam hífen; esta é a regra. Por isso, passo-fundense, rio-branquense, mato-grossense, cabo-verdiano. Não há o que discutir: é uma das poucas regras absolutas do emprego do hífen”.

O arraial do Senhor Bom Jesus do Cuiabá, fundado em 08/04/1719, deu origem à primeira vila real portuguesa a Oeste do Tratado de Tordesilhas. Outras três vilas foram instaladas na Capitania de Mato Grosso: Vila Bela da Santíssima Trindade, em 19/03/1752; Vila Maria, Cáceres, em 06/10/1778; e Vila de Nossa Senhora da Conceição do Alto –Paraguai Diamantino, Diamantino, em 23/11/1820. Durante o Império foram criadas mais três: Vila do Poconé, Poconé, em 25/10/1831; Vila de Nossa Senhora do Rosário do Rio Acima, Rosário Oeste, em 25/06/1861; e Vila do Livramento, Livramento, em 04/05/1883. Localizada no centro da América do Sul, Cuiabá é geograficamente privilegiada. Entretanto, os interesses coloniais de Portugal, que enfrentava o avanço dos espanhóis no continente, levaram para Vila Bela o governo da Capitania de Mato Grosso.

Considerando Vila Bela da Santíssima Trindade localizada em região insalubre, o oitavo capitão-general Dom João Carlos Augusto d'Oeynhausen e Grewenbourg fixou a sua residência em Cuiabá a partir de 18/11/1807. Foi acompanhado pelo sucessor, o capitão-general Francisco de Paula Magessi Tavares de Carvalho, o último deles, que governou a Capitania de 06/01/1819 a 20/08/1821. A notícia da coroação de Dom Pedro I, ocorrida em 12/10/1822, somente chegou a Cuiabá em 08/03/1823, pelo correio terrestre vindo de Goiás. Vieram também os atos criando a bandeira e as armas do Brasil independente. Cuiabá foi escolhida para ser a Capital da Província de Mato Grosso, depois de experimentar três caminhos: a) das Monções; b) fluvial amazônico; e c) terrestre de Goiás.



Na linguagem tradicional do Vale do Rio Cuiabá é desconhecida a tal “Baixada Cuiabana”, por exemplo. O IBGE esclarece na sua "Coleção de Monografias”, nº 493: “A peneplanície cuiabana é constituída por uma superfície de erosão senil estabelecida em rochas metamórficas, especialmente em filitos da série Cuiabá e, secundariamente quartzitos, sendo grande parte do solo constituído por arenitos devonianos, rico em ouro e diamantes". Em "Apontamentos para o Diccionário Chorográphico da Província de Matto-Grosso", o almirante Augusto João Manoel Leverger, Barão de Melgaço, diz: "Observações que suponho serem da comissão dirigida pelo Sr. Langsdorff, em 1827, dão por altitude de Cuiabá, acima do nível do mar, 700 pés ingleses, ou 213 metros, não indicando o local da observação. O Conde de Castelnau (1845) dá para altitude do Rio Cuiabá, no porto da cidade, 65 metros, o que me parece errado. O capitão Page, do Waterwicht, dá por altitude à Corumbá 396 pés ingleses, ou 120 metros, sendo a inclinação do Rio Paraguai (0m,23) 23 centímetros por légua. Supondo igual inclinação nos rios São Lourenço e Cuiabá, até a cidade que deita 141 léguas de Corumbá, seguindo as voltas do rio, temos para altitude da Capital mato-grossense 152 metros". A época ideal para uma visita ao Pantanal Mato-grossense é de junho a setembro. Sua altitude oscila de 83 a 200 metros.


II - DESDE A PENÍNSULA IBÉRICA
Portugal é resultado da união de vários condados da Península Ibéria. O Condado Portucalense, o mais importante deles, tinha características latinas. O nome talvez venha de “portu galliae”, o "porto dos franceses" em Latim. Com os arquipélagos dos Açores e da Madeira, Portugal é menor do que alguns Estados brasileiros. A Península Ibérica foi povoada, inicialmente, por celtas, iberos e lusitanos. Visando expandir seu comércio, os fenícios chegaram ao Algarve e ensinaram a fabricação de azeite, enquanto os gregos ocupavam Douro e Minho. Expulsos da Sicília, os cartagineses também desembarcaram na Ibéria e foram vencidos pelos romanos de Vespasiano, que concederam aos habitantes da região os benefícios do “Jus Latinum”, no Século III d.C. Estava implantada a província romana da Gallaecia et Asturica, no Noroeste da Península Ibérica.

Durante o Século V, parte da Lusitânia foi ocupada pelos suevos. A Península Ibérica teve, então, duas invasões: a dos germanos, do Século V ao Século VIII, com as primeiras manifestações do chamado Romano Galego-Português, entre o Século VI e o Século VII; e a dos árabes, mais de cinco séculos, do Século VIII ao Século XIII. Porém, os primeiros documentos particulares escritos em Romano Galego-Português, com registro do "l" e do "n" entre vogais, ocorreram do Século VIII ao Século IX, e não em Latim, até a Guerra da Reconquista. Do Século XIII ao Século XV o Português Arcaico passou a ser usado nos documentos oficiais, por etapas, acentuando o átono final e o "ão" das terminações nasais.

A expansão da língua portuguesa ocorreu a partir do Século XV, quando saiu da Galícia, o seu berço, indo em direção do Algarve, para depois progredir no sentido Norte-Sul, a exemplo do ocorreu também com o Castelhano e o Francês. Deixou, então, de ser um conjunto de dialetos provinciais do Norte para ser a língua oficial de uma das maiores potências mundiais no ciclo das navegações, transformando-se em símbolo cultural de um império que implantou colônias em três continentes: América do Sul, Ásia e África.

O processo de reconquista da Lusitânia foi iniciado por Pelaio, nas Astúrias, indo até 798, ano em que o rei Afonso II chegou a Lisboa e expulsou os mouros. Dom Afonso III ocupou depois Mondego, o passo decisivo para que Dom Fernando, o Grande, reconquistasse em seguida Lamego, Viseu, Coimbra, Cintra e Lisboa, em 1064. Porém, Portugal continuou sendo feudo de Castela até 1139, quando Dom Afonso Henriques proclamou-se rei da Lusitânia independente. Portugal surgiu em 1143, com o acréscimo de outros territórios por conquista.

A língua portuguesa teve origem no Norte e chegou ao Sul de Portugal no início do Século V, atingindo Algarve depois. Começou sendo um conjunto de dialetos provinciais (galego-portugueses). O ciclo de elaboração teve início no Século IX e foi até ao Século XIV. O ciclo de expansão teve início no Século XV quando houve a transferência do poder para Lisboa e o surgimento do Português Culto, com a padronização da língua (a partir do Século XVI), que foi além da Península Ibérica. Por questão sucessória, contudo, de 1580 a 1640 Portugal ficou sob o domínio da Espanha. O Século XVI foi importante para a estruturação do Português com a fixação da ênclise na posição regular dos pronomes pessoais átonos; elevação das vogais átonas em posição pré-tônica; nos dialetos europeus do centro e Sul, a simplificação da africada "ts" em "s" e palatalização do "s" final de palavra e sílaba; na região de Lisboa: centralização do ditongo ei em âi; no Alentejo: monotongação do ditongo ei em ê".

No Século XVII, Portugal compreendia quatro regiões importantes na sua parte continental: a) O Norte, onde teve origem, em Trás-os-Montes; b) o Litoral Norte, com destaque para Lisboa, Coimbra e Porto; c) Alentejo; e d) Algarve, a menos populosa, e onde surgiu a indústria naval que consagrou Portugal na conquista dos mares, possibilitando o início do histórico ciclo que chegou ao auge de 1495 a 1521. Segundo Luiz Vaz de Camões (que viveu de 1524 a 1580), os portugueses “passaram ainda além da Taprobana”, que seria Tapobrana, Sri Lanka, no Ceilão.

Durante quase dois séculos de invasão romana, a partir do Século III, a população de Portugal era superior a um milhão de habitantes, com reduzido crescimento, principalmente no Século XVI, quando foram iniciadas as emigrações para a África e para o Brasil. Em 1801, Portugal tinha três milhões de habitantes no continente, além de 180.000 nas ilhas mais próximas da Península Ibérica. No período das grandes conquistas marítimas, Portugal rompeu os horizontes então conhecidos e ampliou seus limites. Referindo-se à epopéia lusa, o poeta Fernando António Nogueira Pessoa disse em “Mar Português”, no livro “Mensagem”, que é uma atualização épica de “Os Lusíadas”, de Luís Vaz de Camões:

"Oh! Mar salgado, quanto do teu sal

São lágrimas de Portugal.

Por te cruzarmos, quantas mães choraram,

Quantos filhos, em vão, rezaram,

Quantas noivas ficaram por casar,

Para que fosses nosso, oh! mar.

Valeu a pena?

Tudo vale a pena

Se a alma não é pequena.

Quem passar além do Bojador

Tem de passar além da dor.

Deus ao mar o perigo e o abismo deu,

Mas nele é que espelhou o céu”.

Valeu a pena sim. Os portugueses desafiaram os oceanos e mudaram os rumos da História. O ciclo de expansão da língua foi iniciado no Século XV, quando os dialetos do Sul superaram os dialetos provinciais do Norte e fixaram as bases da norma “culta”, com um padrão lingüístico de características meridionais. A língua portuguesa deixou a Península Ibérica, passando pelo Portugal insular, indo até aos continentes conhecidos. Na fase da elaboração do Português, o Algarve foi incorporado, sendo fixadas as fronteiras nacionais portuguesas.

Em 1578, Dom Sebastião, o Desejado, desapareceu na Batalha de Alcácer-kibir. A Monarquia Portuguesa teve descontinuidade e após 60 anos de domínio espanhol (1580-1640), Dom João IV anunciou às casas reais da Europa a restauração da independência de Portugal com um representante da Casa de Bragança no trono de Dom João I, o Mestre de Aviz, responsável pela identidade portuguesa em 1385, vencendo a Batalha de Aljubarrota.

O povoamento de Portugal a partir do Norte levou a língua pátria para o Sul, onde se falava o Árabe, além dos vestígios dos antigos dialetos romanos meridionais. Os dialetos falados ao Sul do Rio Mondego eram mais homogêneos do que os dialetos do Norte, mais antigos, mas tinham origens diversas. A segunda etapa compreende o período de expansão da língua, a partir do Século XV, com a transferência do poder para Lisboa, na região central, fazendo com que os dialetos romanços tivessem maior importância. Superando os dialetos do Norte, formaram a base de uma norma culta tipicamente meridional e deram origem ao Português conhecido que se espalhou pelo mundo.

Para melhor entendimento dessa expansão, aqui está uma cronologia resumida: a) No Século III, o Império Romano instalou a Província da Gallaecia et Astúrica, no Noroeste da Península Ibérica; b) Do Século V ao Século VIII, o Noroeste da Península Ibérica viveu o chamado período germânico da sua história, com as primeiras manifestações da língua Galego-Portuguesa, entre os Séculos VI e VII; c) Do Século VIII ao Século XIII, a Península Ibérica foi novamente invadida, pelos árabes, e acontece a Guerra da Reconquista, quando ocorreu na nascente língua o fenômeno do "l" e do "n" entre as vogais (Séculos VIII e IX), com os primeiros documentos particulares não escritos em Latim; d) Do Século XIII ao Século XV, surgiu o chamado Português Arcaico em documentos oficiais, com novas regras: o uso do átono final em "o", a uniformização das terminações nasais em "ão" e a definição dos hiatos; e) No Século XV, foram iniciadas as conquistas marítimas de Portugal; f) No Século XVI, aparecem obras em Português, com gramáticas e dicionários; g) No Século XVII, consolida-se o Português Europeu com inovações nos dialetos do centro e do Sul de Portugal e no Alentejo. O primeiro documento em Português seria de 1175.

Resultado da expansão e fragmentação do Latim Vulgar, ao lado do Castelhano, do Italiano, do Francês e do Romeno, entre outras línguas, o Português assumiu características fonéticas próprias durante o Século VI. Nessa época, o idioma falado na Galiza e no Norte de Portugal começou a se afastar do Latim Vulgar permitindo o surgimento do Português como língua individualizada, transportando o falar para o escrever, tanto em trovas como em documentos oficiais, incluindo os testamentos e doações. Porém, o Testamento de Dom Afonso II, de 27/06/1214, é considerado o primeiro documento oficial escrito em língua portuguesa. Entre outros textos da época, deve ser citado o "Livro Velho das Linhagens de Portugal", "Algumas Cantigas de Amor ao Rei Dom Dinis" (entre 1290 e 1310) e o “Livro de Joseph ab Arimateia”.

A língua portuguesa foi estruturada e divulgada a partir do reinado de Dom Dinis (1261 – 1325), mas somente ao longo do Século XVI teve condições necessárias para ser vulgarizada e difundida através das conquistas marítimas de Portugal. No Século XV os portugueses publicaram o primeiro livro impresso no idioma pátrio: o "Tratado de Confissom", em 1489. A reforma do ensino do Português foi, contudo, iniciada pelo Marquês de Pombal, apoiado por Luís António Verney, baseada na gramática, na ortografia e na lexicografia, tendo como fundamento o “Verdadeiro Método de Estudar Para Ser Útil à República e à Igreja; Proporcionado ao Estilo de Necessidades de Portugal”, publicado entre 1746 e 1747, em quatro volumes.

Surgiram, em seguida, os instrumentos para sua consolidação como um idioma: o "Dicionário de Verbos Latim-Português" e a "Grammatices Rudimenta Joanis de Barros", que embora incompleto, tratava do ensino de verbos, que o autor, João de Barros, dedicou à infanta Da. Maria, filha de Dom João III. Em 1767, apareceu o “Compendio de Orthographia, Com Sufficientes Catálogos e Novas Regras da Língua Portuguesa”, de Luís de Monte Carmelo. O padre Rafael Bluteau, filólogo reconhecido, foi o autor do “Vocabulário Portuguez e Latino”, em dez volumes. Em 1768 foi fundada a Real Mesa Censória em Lisboa, que aprovava a publicação de livros e outros impressos. A partir de Século XIX foi reconhecida a importância de Fernando Pessoa (1888-1935) e de Teófilo Braga (1843-1924) na valorização da língua portuguesa. A unificação do Português, hoje falado em quatro continentes, é uma missão do Instituto Camões.

A faixa geográfica de maior influencia da língua está localizada entre o Equador e o Trópico de Capricórnio. O Brasil é o maior país onde se fala o Português, como língua oficial e única. O Português é falado por cerca de 210 milhões de pessoas, sendo a quinta língua mais falada no mundo e a terceira entre as ocidentais, após o inglês e o castelhano. Também é o idioma oficial de Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste. Em Macau (China) e Goa (Índia), colonizados por Portugal, uma acentuada parte da população ainda fala o Português. O Galego, a língua de Galiza (na Espanha), tem a mesma origem. O Português "é a língua mais sonora e musical", conforme o grande escritor espanhol Miguel de Cervantes. O Português falado no Brasil, nas palavras do grande escritor Eça de Queiroz, é “adocicado”.

Língua Portuguesa

De Olavo Braz Martins dos Guimarães Bilac

Última flor do Lácio, inculta e bela,

És, a um tempo, esplendor e sepultura;

Ouro nativo, que na ganga impura

A bruta mina entre os cascalhos vela...


Amo-te assim, desconhecida e obscura,

Tuba de alto clangor, lira singela,

Que tens o trom e o silvo da procela

E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma

De virgens selvas e de oceano largo!

Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: "meu filho!"

E em que Camões chorou, no exílio amargo,

O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

Diversas palavras do Português Arcaico ainda estão na Linguagem Cuiabana, como acudir, xô, apousentar, viçoso, citadas em dicionário, mas com maior uso no Vale do Rio Cuiabá. O Latim Popular, falado e não escrito, a língua usada pelos invasores romanos na Península Ibérica, absorveu muitas palavras dos invasores germanos (perrenque, caneco) e dos invasores árabes (alfazema, alqueire) para dar origem ao Português, ao Espanhol, ao Francês, ao Italiano, ao Provençal e ao Romeno, algumas delas mantendo a fonética da época. É o caso de "tauba", que não existe em qualquer dicionário de Português e tem o seu uso desaconselhado pelas normas da língua, pois é uma deturpação por metátese (troca da posição de fonemas ou sílabas de um vocábulo) da palavra tábua.
O Latim Popular surgiu por volta do Século IV a.C na região do Lácio (Latium), na costa ocidental da Itália, e dele vieram várias línguas: o Português, o Espanhol, o Italiano, o Francês e o Romeno. Foi o alicerce do Romanço ou Romance, que deu origem à fonética do Português Arcaico, talvez escrito em 1214, com o texto do "Testamento de D. Affonso II". O Português Moderno teve seu início no Século XVI. O Renascimento chegou a Portugal entre 1527 e 1580, durante o período conhecido como Classicismo, com o poeta Sá de Miranda, que estudou por vários anos na Itália e trouxe para Lisboa o verso decassílabo. Novas técnicas poéticas foram introduzidas na língua portuguesa nesse período por Luís de Camões, que além de poemas líricos produziu o épico "Os Lusíadas", narrando em versos a história do povo português e de suas conquistas, a exemplo de Homero e Virgílio, exaltando a descoberta do caminho marítimo rumo às Índias por Vasco da Gama, entre 1497 e 1499.
A História Lingüística no Brasil é recente. Surgiu durante o Século XX, com os livros "O Linguajar Carioca" e "O Dialeto Caipira" de Antenor Nascentes e Amadeu Amaral,. A professora Rosa Virgínia Mattos e Silva, da Universidade Federal da Bahia, transmitiu vários subsídios na conferência intitulada "A Língua Portuguesa em Perspectiva Histórica", em Salvador a 01/05/1999, quando destacou aspectos da Filologia (estudo do texto escrito) e da Dialetologia (estudo sobre os falares rurais). Ela fixou o princípio histórico do Português como língua oficial: "Sabe-se que, na última década do Século XIII, o rei D. Dinis legaliza a língua portuguesa como a língua oficial do reino de Portugal, seguindo também nisso o modelo de seu avô, Afonso X, de Leão e Castela, que no seu reinado iniciado em 1252, instituiu o vernáculo castelhano como língua oficial de seu reino. Sabe-se também que, apesar de o Português só ter sido oficializado no tempo de D. Dinis, a partir de 1255, na chancelaria do Rei Afonso III de Portugal, a par do Latim, já se usava o Português nos diplomas oficiais". O Português Clássico tem início com "Os Lusíadas" e se encerra no período do Português Arcáico, de 1350 a 1572 ou de 1536 a 1540, "datas do aparecimento das primeiras reflexões metalingüísticas sobre o Português e do início da sua normatização explícita".
Falando sobre "Os Desafios da Lusofonia. O Português, Língua de Comunicação Internacional", na Embaixada do Brasil em Paris, em 04/05/2000, o professor doutor Michel Pérez, do Ministério da Educação Nacional da França, afirmou: "A Língua Portuguesa é, nesse ano de 2000 – ou seja, precisamente quinhentos anos após o que se convencionou chamar a descoberta do Brasil – uma das três grandes línguas internacionais de comunicação: entende-se, por tal, "língua falada em vários continentes e que serve de veículo para os intercâmbios internacionais".
"O Português é, na realidade, uma grande língua de comunicação internacional: língua veicular, língua de intercâmbios culturais e comerciais, mas também língua de trabalho de organizações internacionais. Língua de expressão oral. Às vezes, de expressão escrita, ou simplesmente língua oficial, sabe-se que o Português é um fator de unidade nacional em vastos países de África, da América ou entre os diferentes componentes de um arquipélago geográfico e humano no mundo". "O lingüista Louis-Jean Calvet classifica, com efeito, o Português entre as línguas "supercentrais" (conta-se, entre essas, uma pequena dezena, que inclui o Chinês, o Árabe e o Francês, o Inglês sendo a única língua "hipercentral").
Prosseguindo: "Convém, com efeito, registrar que, diferentemente do Francês, o Português - como Espanhol e Inglês – tem mais falantes fora de Portugal do que dentro de suas fronteiras, o que faz do Português língua de grande dispersão geográfica, destinada a crescer. Além do mais, sabemos que o Português e o Espanhol são as duas únicas línguas internacionais que crescem sem cessar na comunicação mundial, enquanto todas as outras diminuem".
A primeira biblioteca de Cuiabá é do Século XVIII e pertencia ao primeiro cronista cuiabano, Joseph Barboza de Sá, o autor de "Relação das Povoações do Cuiabá e Mato Grosso, de Seus Princípios até os Presentes Tempos", base da História de Mato Grosso. Desde então, foram assinados três acordos de reforma ortográfica na Língua Portuguesa: o de 1943, o de 1971 e o de 1995, que deverá entrar em vigor em 2008.
As mais longas palavras existentes na língua portuguesa são:
o adjetivo pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconiótico, relativo à doença pulmonar chamada pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconiose; e o advérbio pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconioticamente.

III - DA EUROPA E DO BRASIL
O Português falado no Brasil tem várias características, começando pela palavra brasileiro, de Pau-Brasil (Caesalpinea echinata), árvore nacional que ainda existe do Ceará ao Rio de Janeiro, e com raridade no Estado de São Paulo. Se as regras gramaticais fossem obedecidas, “brasileiro” (como eram chamados os traficantes de Pau-Brasil) seria substituído por “brasiliense”. Brasileiro era aquele português que vinha para o Brasil, ficava rico e depois voltava a Portugal. O português nato era chamado “reinol” e os seus filhos “mazombos”. Os mais ricos mandavam seus filhos estudar em Portugal, mas eles não esqueciam o Brasil, a sua terra natal. Os mazombos, que eram educados em Coimbra e Lisboa, retornavam ao Brasil e se diziam brasileiro, com sua língua nacional.
A convite de Dom Pedro II, esteve no Rio de Janeiro o escritor português António Feliciano de Castilho, um purista da língua. Trouxe alguns exemplares do seu livro "Método Castilho de Leitura Repentina", visando disciplinar a Língua Portuguesa do Brasil, por ele considerada um dialeto. Na Literatura Brasileira já despontava o indianismo de José de Alencar, autor de "Iracema", "Guarani" e outros. Sempre rebelde ao monarca brasileiro, o escritor cearense entregou a Dom Pedro II e a António Feliciano de Castilho, em edição de luxo, exemplares de "As Minas de Prata", recém lançado, com sérias críticas à nobreza decadente de Lisboa.
Para uniformizar e difundir o idioma, foi criada em 17/07/1996 a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, com sede em Lisboa. Desde 1953, Brasil e Portugal fixaram a comunidade luso-brasileira como figura de Direito Público. Os países de origem portuguesa na África foram incorporados à comunidade. Em novembro de 1989, foi criado o Instituto Internacional da Língua Portuguesa, Instituto Camões a partir de 15/07/1992, homenageando Luís Vaz de Camões, "poeta épico, satírico, bucólico e comediógrafo português", que nasceu “presumivelmente” em Lisboa, a 04/02/1524. O instituto justifica: “Camões pode bem ser considerado um símbolo da diáspora portuguesa”.
Descendente por varonia do poeta galego Vasco Oures de Camões, e um grande galanteador, ele se apaixonou por Catharina de Atayde, a quem dedicou o soneto anagramático "Natércia". Jovem, partiu com as tropas portuguesas para a África e a Ásia, ficando cego da vista direita na Batalha de Mazagão. “Os Lusíadas”, que foi publicado em 1572, relatava a descoberta do caminho marítimo para as Índias por Vasco da Gama, entre 1497 e 1499. Retornando a Lisboa, após quinze anos de ausência, dedicou o poema ao jovem monarca Dom Sebastião, que autorizou a publicação do livro em 1572, e agraciou Camões com uma tença real no valor de quinze mil réis anuais. Luís de Camões morreu em 10/06/1580, “na miséria".
A língua portuguesa garantiu a unidade territorial do Brasil, com seus 8.547.403,5 quilômetros quadrados. Tendo apenas 92.150 quilômetros quadrados (incluindo os arquipélagos dos Açores e da Madeira), Portugal conquistou mares "nunca dantes navegados" e mudou a História da Humanidade. O consagrado poeta português Fernando António Nogueira Pessoa (1888-1935), educado em Durban (África do Sul), falando o inglês, definiu: "A minha Pátria é a Língua Portuguesa".
Sobre o Português Europeu, Rachel de Queiroz escreveu "As Origens do Nosso Falar" em "O Estado de S. Paulo" (04/12/1999), recordando uma viagem a Lisboa em 1950, com outros brasileiros. Entre eles estava o jornalista Rubem Braga, que ao falar "um brasileiríssimo explícito" provocou uma jovem portuguesa do grupo. Ela reagiu: "Em Portugal não dizemos assim". O Brasil sempre se reconheceu como país lusófono (do Latim "Lusitanu" - luso, habitante de Portugal, a Lusitânia; e do Grego "Phone", "Fono" - quem tem o Português como língua materna).
Citando as conquistas marítimas de Portugal no final do Século XV, quando tinha mais de um milhão de habitantes, o jornalista Rubem Braga lembrou que "a fina flor dos fidalgos, dos letrados, do poderoso clero, partiu tudo para o Brasil, na fácil disputa à "indiada", ainda na Era da Pedra Lascada, que se apavorava ante o estrondo dos seus mosquetes boca-de-sino. E enquanto o Brasil crescia, Portugal se esvaziava". "A sua fina flor continuava emigrando em massa, não mais para aventurar nos mares, mas para fixar-se na terra". "O Brasil era o grande pólo e, como para cá vinham os que melhor escreviam, os que melhor falavam - a própria inteligência -, a sangria dos valores cada vez mais amenizava a população que sobrara na terra, onde se carpia um saldo de viúvas e velhos (foi, então, que inventaram a palavra saudade, ou soidade)”.
"A última pá de terra foi a invasão napoleônica, a mudança total da Corte, com sua biblioteca, seus tesouros, seu museu, que não mais voltaram para lá". "Portugal perdeu até a língua, a original, a de Camões e dos outros clássicos. Ficou falando um dialeto de camponeses e pescadores, que é isso que vocês falam agora! Quer uma prova - desafiou? Definitiva? Recite "Os Lusíadas" ao ritmo do atual falar português, que fica todo de pé quebrado! Camões metrificou o poema no ritmo do falar de então, que veio a ser o nosso". A jovem portuguesa se retirou, irritada, enquanto Rubem Braga declamava um soneto de Camões "em perfeita cadência capixaba, provando a si mesmo que tinha razão".
O filólogo José Arthur Gianotti, no livro "Origens da Universidade: A Singularidade do Caso Português" analisou se Portugal tinha condições necessárias para Dom Diniz fundar uma universidade no Século XIII, em 1290, transferida para Coimbra em 1537. Contudo, identificou nela o renascimento urbano com o declínio da sociedade agrária e feudal no Século XII. As universidades européias existiam há dois séculos. Longe da escola conventual da Idade Média, os jovens portugueses ricos estudavam na França, como o Rei Afonso III, criado em Paris, ou na Itália, como o Papa João XXI, o português Pedro Hispano. Disse que “Portugal partiu para a descoberta geográfica do mundo sem antes ter completado a descoberta cultural da Europa", a exemplo da literatura francesa. O Português Europeu teve a influência do Espanhol, com reflexos no Português falado no Brasil, após 60 anos de domínio espanhol (1580-1640).
A professora Rosa Virgínia Mattos e Silva diz em "História da Língua Portuguesa no Brasil": "O Português Brasileiro descende do Europeu. No Brasil, ele tomou sua forma na complexa interação entre: - a língua do colonizador (e, portanto, do poder e do prestígio); - as numerosas línguas indígenas brasileiras; - as também numerosas línguas africanas chegadas pelo tráfico negreiro (oficial entre 1549 e 1830, não oficial antes e depois desses limites); - e finalmente as línguas dos que emigraram para o Brasil da Europa e da Ásia, sobretudo a partir de meados do século XIX. Dessa potencial Babel lingüística, foi se definindo, ao longo de quinhentos anos – pouco tempo para a história de uma língua – o formato brasileiro contemporâneo da língua portuguesa".
Ela tratou, também, dos aspectos fônicos: "Quando algum estrangeiro ouve um brasileiro e um português, ou quando um brasileiro ouve um português (ou vice-versa), a primeira impressão que se instala é a da diferença do sotaque, que caracteriza a pronúncia diferenciadora do brasileiro em relação ao português. Esse sotaque/pronúncia recobre as distinções fônicas, tanto supra-segmentais ou prosódicas, interpretadas ainda imprecisamente pelos lingüistas, como diferenças fônicas, segmentáveis (as realizações fonéticas próprias ao sistema vocálico e consonântico do Português Brasileiro e do Europeu)". Ela explica: "O que se pode chamar de reduções vocálicas no Português Europeu e ausente no Brasileiro dá ao ouvinte estrangeiro a impressão auditiva de o Português da Europa ser mais consonântico e o brasileiro mais vocálico”.
A "Linguagem Cuiabana" é um registro idiomático do Português falado na Europa do Século XVI, preservando valores fonéticos, começando com "Os Lusíadas", de Luiz Vaz de Camões, cuja leitura proporciona diversas surpresas. Como exemplo, foram recolhidas algumas palavras, mostrando que a "Linguagem Cuiabana", não é e nunca foi, um vício de linguagem, mas exemplo vivo da nossa história cultural.
Nos dez cantos, as palavras são identificadas pela frase do verso correspondente, caso os leitores prefiram leitura por inteiro. Algumas são citadas pela semelhança fonética e outras pelo uso atual. Resumindo: quase 500 anos de História não apagaram o Português Culto do Século XVI em Cuiabá.

Os três primeiros versos do "Canto I" do épico “Os Lusíadas”, de Luiz Vaz de Camões, dizem melhor:
"As Armas e os Barões assinalados,
Que da Ocidental praia Lusitana
Por mares nunca de antes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;

E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando,
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando,
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.

Cessem do sábio Grego e do Troiano
As navegações grandes que fizeram;
Cale-se de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram.
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta".

Canto I: Que não tenham enveja às de Hipocrene. (4); Vós, tenro e novo ramo florecente; De ũa árvore, de Cristo mais amada; (7); E quando dece o deixa derradeiro;(8); De prémio vil, mas alto e quási eterno; (10); Dos dous avós as almas cá famosas; (17); Tantos climas e céus exprimentados, (29); Alevantando um pouco, mui seguro, (37); Porque enfim vem de estâmago danado; Pera os determinados apousentos. (41); Co temor grande em pexes converteu. (42); Do licor que Lieu prantado havia (49); Dando cargo à Irmã que alumiasse (56); Começa a embandeirar-se toda a armada (59); Olhando a cor, o trajo e a forte armada; (62); Partazanas agudas, chuças bravas. (67); Eu decerei à Terra e o indignado (76); Isto dizendo, irado e quási insano, (77); Um de escudo embraçado e de azagaia, (86); Bramando, duro corre e os olhos cerra,/Derriba, fere e mata e põe por terra. (88); Ferido, o ar retumba e assovia. (89); Mas debaxo o veneno vem coberto, (105).

Canto II: Pergunta-lhe despois se estão na terra (6); E nesta treïção determinavam (17); Pera estorvar que a armada não chegasse (19); No rudo marinheiro que trabalha; (25); Que quem no afaga o choro lhe acrecenta, (43); Dizendo: – «fuge, fuge, Lusitano, (61); Na cinta a rica adaga, bem lavrada; (95).

Canto III: Prontos estavam todos escuitando; Alevantando o rosto, assi dizia: (3); Mas louvar os meus próprios, arreceio (4); Que qualquer delas cuida que é milhor. (18); O esprito deu a Quem lho tinha dado. (28); O fim de seu desejo, pelejando. (68).

Canto IV: «Alteradas então do Reino as gentes (4); A guerra com que a pátria se sustinha; (22); E lá bem junto donde nace o dia (69); Em que crece o desejo do valor (82); Da quieta e da simpres inocência (98).

Canto V: Por tomarmos da terra mantimento. (8); A terra onde o refresco doce achámos. (9); Relâmpados que o ar em fogo acendem. (16); Palavra sua algũa lhe alcançaram (64); Aquele ilhéu deixámos onde veio (65); No povo, como nós outros cási mudo, (69); «Mui grandemente aqui nos alegrámos (78); Às Musas agardeça o nosso Gama (99).

Canto VI: De Minerva pacífica ouliveira. (13); Como lhe bem parece, o baxo mundo, (33); Os áureos freios, com feroz sembrante; (61); Abaxam lanças, fere a terra fogo; (63); Os pés e mãos parece que lhe ataram (88); A mercê grande a Deus agardeceu. (93).

Canto VII: De samear cizânias repugnantes. (10); Onde o Profeta jaz que a Lei pubrica. (34); «A um Cochim e a outro Cananor, (35); A Lei não mesturar a casta antiga; (37); Com cerimónias mil se alimpa e apura. (38); Tingindo, a que deixou, de escura noda, (60).

Canto VIII: Quando a passar por baxo foi forçado (15); Com que nos poucos seus o esforço crece. (23); E grande esforço faz enveja à gente. (26); Que de seus ódios inda se não dece. (47); E, sendo da ouciosa mão movido, 87).

Canto IX: De todo o Roxo Mar mais florecia, (3); Mas põe em vida os inda não nascidos. (32); É mais culpa a da mãe que a do minino. (35); No rosto traz, decia diligente. (36).


Canto X: Abaxando, fez ronco e entristecido,/Cantando em baxa voz, envolta em choro,/O grande esforço mal agardecido. (22); É fumo, ferro, flamas e alaridos. (36); Mais que liões famélicos e touros, (43); Lá no grémio da Aurora, onde naceste (44); Tranqueiras, baluartes, lanças, setas: (57); Que fogo e frechas mil terão coberta. (63); Fernando, um deles, ramo da alta pranta, ... (70);.


IV – UM HISTÓRICO DA LÍNGUA
O Português é originário do Galego-Português, no Norte de Portugal, entre os rios Minho e Douro. Se fosse criada uma hipoteca "Galiza Portuguesa", nela ficariam sem dúvida as províncias de Douro, Minho e Trás-os-Montes, uma região próxima da Galiza Espanhola, onde o Galego busca sua sobrevivência usando a tradição e reluta em abandonar as suas históricas raízes. Com essa união, seria possível o surgimento da imaginária Portugaliza desde Ferrol até Faro.

A propósito, o jornal "Açoriano Oriental" publicou a pesquisa "Projeto "Galiza-Uma Nação, A Mesma Cultura e a Mesma Língua", onde diz: "O Galego e o Português pertencem a um mesmo sistema lingüístico originário da Galiza, contando durante séculos com uma norma escrita comum, elaborada na Corte e nas escolas eclesiásticas a partir dos séculos XII e XIII, usada na expressão literária e, também, nos registros de documentos e na administração tanto na Galiza como em Portugal desde que entre os séculos XIII e XIV o romance substituiu o Latim”.

Mais adiante, com o subtítulo "Galego: Uma Língua com História", diz o jornal: "De acordo com a “Grande Enciclopédia Larousse”, o Galego é uma língua românica falada na Galiza por cerca de três milhões de falantes. O seu domínio lingüístico ultrapassa os limites da Galiza, estendendo-se às regiões espanholas de Leão e Astúrias e ao Norte de Portugal. Até ao séc. XVI o Galego formava um complexo lingüística com a antiga fala portuguesa do Norte do Douro (o galáico-português), cujo desenvolvimento histórico deu origem ao Português moderno”. Baseando-se nisto muitos reconhecem a língua portuguesa como sendo galego-portuguesa".

O "Açoriano Oriental" acrescentou: "Os traços gerais do Galego são os mesmos do Português, do qual se distingue principalmente na pronúncia e na ortografia”. E acrescenta: "A partir do Século XI, o galego, por influência castelhana, adquiriu as suas características próprias no reinado de Afonso X, o Sábio,assumindo o seu espaço como língua da poesia (o próprio rei de Castela compôs mais de 400 cantigas em galego), enquanto o castelhano era reservado para a narrativa épica e histórica - isso ocorreu no séc. XIV. A partir daí, o Galego perdeu terreno para o Castelhano, que veio a constituir o espanhol comum. Com a decadência política da Galícia, os cancioneiros caíram no esquecimento e o Galego foi relegado à situação de língua rude e inculta".

A Constituição espanhola de 1978 definiu o Castelhano e o Espanhol como língua oficial, mas o Galego continua na Galiza. Embora 70% da população da sua fale o Galego, há uma preocupação quanto ao futuro da língua, pois os jovens começam a se interessar pelo Espanhol. Comprovando sua tradição, o livro "Breve História de Galiza", disse: "Galiza é un país antigo e novo, en constante mutación, pero que guarda com amor certas características que o diferencian de todos os demais. Tem unha historia milenaria , chea de sobresaltos, de luces e de sombras, de logros e de fracasos. A historia é como un río; nada máis fermoso que percorrer o curso da auga do vivir de Galiza”. É semelhante à língua portuguesa.

O Galego e o Português têm origem comum: o sistema lingüístico usado durante séculos na Galiza, com a mesma norma escrita elaborada na Corte Portuguesa a partir dos séculos XII e XIII, com o apoio das escolas eclesiásticas, e usada como expressão literária e oficial, incluindo os registros de documentos oficiais, tanto na Galiza como em Portugal, quando o românico substituiu o Latim, entre os séculos XIII e XIV. O Galego foi falado nos reinos centro-ocidentais da Península Ibérica, com hegemonia cultural em Santiago de Compostela, até o final do Século XV, quando o galáico-português perdeu seu uso praticamente oficial na atual Galiza, o mesmo ocorrendo em Portugal.

Como ilustração, seguem palavras citadas no Portal Galego da Língua com o título "Isso não é Galego: É’ Português": aborrecido, aguaceiro, alfaia, arraial, banána, bau, cacho, enveja, esvair, de momento, fruita, fungar, gabar, inchar, lidar, prear, peitar, remela, ruga, sumir. São palavras do Português que continuam em uso na Galiza. No "Dicionário de Fraseologia", o Portal Galego da Língua acrescentou os seguintes exemplos: a dedo, a estas horas, abrir a boca, água fria, cara a cara, caso perdido, de momento, com reservas, golpe de vento, por azar, por fortuna, palavras e frases do Galego preservadas na “Linguagem Cuiabana”.

O radical Gal está em Portugal e em Galiza. É uma derivação etimológica latina do radical indo-europeu Cale (Calem segundo algumas fontes), a origem da palavra Galiza (Calécia, Gallaecia). Essa raiz está em Calais, Gales, Galatia, Gaia,Galiza, Portugal. Os povos proto-históricos da Europa Atlântica partilhavam uma língua comum indo-européia. Cale (latinizada Gallaecia) teria sua origem em Cal-leach, a deusa-mãe dos celtas, pois era costume dos romanos da época nomear os povos conquistados com a denominação dos seus deuses.

O nome da Galiza foi dado pelos romanos na reforma de Diocleciano, 284-288 d.C. A mais antiga referência foi a feita por Salústio (Século I a.C), sobre a cidade da Calécia, “’cívitas in Gallaecia”, situada ao Norte do Douro, compreendendo todo o Noroeste da Península Ibérica. A partir do Século V d.C. a palavra Cale deixou de ser usada, surgindo as citações de Porto de Cale, Portu Cale romano, o local onde nasceu Portugal, como séculos antes o Cale de Portu Cale (na Ribeira do Porto existiu um cais natural), dera nome à Galiza. A Geografia e a História uniram portugueses e espanhóis na Península Ibérica: o Mirandês espanhol é falado em Portugal e Galego na Espanha. O Trasmontano, o Galego e o Mirandês deram origem ao Português colonial falado no Século XV.

O Português de Lisboa é considerado padrão, mas o Português do Porto mantém o “om” em vez do "ão" (coraçom - coração), preservado na “Linguagem Cuiabana”. Além do Porto, o Galego é identificado no Português falado em Braga, Guimarães e Norte de Portugal. O Galego original está no Português ainda falado na região de Trás-os-Montes, com pouca diferença. A velha “Gallaecia” reduziu seu território com a independência do Condado Portucalense e progressivamente pouco restou do Reino da Galiza, que desapareceu no reinado de Felipe II. O Galego continua vivo no Norte da Espanha e pretende ser um "idioma independente".

A "Linguagem Cuiabana" também teve influência do Mirandês (mimoso, mocho), que foi reconhecido como a segunda língua oficial de Portugal. O seu processo de normatização, como "idioma independente", foi iniciado em 1995. Embora tenha secular origem espanhola, o Mirandês (dialeto asturo-leonês falado no Concelho de Miranda do Douro, no Nordeste de Portugal), está na “Linguagem Cuiabana”. Da letra "M" do Glossário Mirandês: mimoso (bonito), modorra (sonolência), madurar (amadurecer), matreiro (ladino), mejar (urinar), mear (dividir ao meio), medrar (crescer), moucho (banco de sentar), manco (quem anda com dificuldade), mosca morta (quem é apático), muciço (maciço), meiquilo (meio quilo), mediano (tamanho médio), muldura (moldura), e minguado (pouco). Também vieram do Mirandês: arrocho (aperto), cria (genérico sobre gado bovino), entojar (causar nojo, semelhante ao Português Culto), nicho (oratório), esterco (estrume), inágua (anágua, peça íntima feminina) e listo, que virou liso (esperto, astuto).

O Mirandês tem ampla base geográfica (484 quilômetros quadrados), no Nordeste de Portugal. Surgiu do Latim Vulgar, variação asturo-leonês, com influência do Trasmontano (do Português Vulgar), principalmente a partir do Século XVI, que o substituiu em Miranda do Douro. Foi conservado durante vários séculos, como língua de transmissão oral, de geração em geração, mantendo uma completa e rica estrutura gramatical (fonética, morfologia e sintaxe). Seu centro administrativo, Miranda do Douro, não era relacionada entre as localidades de fala mirandesa. A língua nativa chegou a ser substituída pelo Português - e até pelo Espanhol.

Miranda do Douro é uma cidade importantíssima desde os tempos dos romanos. Foi ocupada pelos Sarracenos nas primeiras décadas do Século VIII e eles lhe deram o nome de Mir-Hândul. A região de Miranda do Douro foi colonizada nos primórdios da monarquia portuguesa, de Picote à fronteira de Bragança, por frades pertencentes aos conventos leoneses de Santa Maria de Moreruela e de San Martin de Castañeda, que permaneceram ali até o Século XV.

O Mirandês foi pesquisada pelo filólogo português José Leite de Vasconcelos, que editou poesias suas e de Camões no livro "Flores Mirandêsas". A partir de 1882 ele recolheu "contos, histórias, lendas, fábulas, provérbios, adivinhas, cantigas d'amor, de humor, de devoção, etc." nas várias aldeias de Miranda para escrever o ensaio "O Dialecto Mirandês". Ele definiu o Mirandês como sendo “a língua do campo, do trabalho, do lar e do amor entre os mirandenses", um legado de oito séculos de história que uniu os mirandenses, sob os mesmos valores culturais, no Nordeste de Portugal.

O isolamento geográfico de Algarve preservou muitos termos vindos do Português Arcaico: alomear (iluminar), degotado (decotado), ôrives (ourives), más (mais), sês (seis), ôtro (outro); abob'ra (abóbora), apost'lo (apóstolo), rot'la (rótula); relampo (relâmpago), estâmo (estômago); cemitero (cemitério), noda (nódoa), influença (influência), poliça (polícia), relojo (relógio), maliça (malícia); miôlos, jôgos: ovos; sobiar (assobiar), presentar (apresentar); avoar, alevantar; amanhão, temporão; bodum (fedor); enxuto (enxugado), rôto (rompido), descalço (descalçado).

V - A CUIABÁ PORTUGUESA
O Centro Geodésico da América do Sul está localizado na Praça Moreira Cabral, em frente ao Palácio Pascoal Moreira Cabral, onde funciona a Câmara Municipal de Cuiabá. Teve outras denominações: Largo da Forca, Praça do Alegre e Campo D'Ourique. Esta última era uma homenagem à Vila de Ourique, em Portugal, e se refere ao campo onde ocorreu a decisiva batalha entre as tropas comandadas por Dom Afonso Henrique, em julho de 1139, contra invasores mouros. O Largo da Forca vem da administração portuguesa. Nesse local também foram realizadas as últimas Touradas Cuiabanas, no final de 1920. Eram semelhantes às de Portugal, em que o touro não morre.

A Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá foi importante no Brasil Colônia, com tradicionais nomes portugueses: Beco do Candieiro, Largo da Matriz, Pelourinho, Senado da Câmara, Rua de Cima, Rua do Meio, Rua de Baixo e outros. Também foram homenageadas cidades e vilas de Portugal: São Gonçalo do Amarante, Azambuja, Balsa, Barcelos, Guimarães, Porto e Vila Real. O acento agudo de António manteve a grafia portuguesa original. Ainda hoje surgem diversos nomes portugueses no cotidiano de Cuiabá: Bairro Boa Esperança, Rodovia Cuiabá - Santarém, etc. São vínculos permanentes que o tempo não consegue apagar.

Em sua dissertação na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, para Mestre em Artes, o professor Júlio De Lamônica Freire assim definiu a Capital mato-grossense: "Cuiabá é uma cidade do Século XVIII, com um desenho barroco de ruas tortuosas e estreitas, topografia movimentada, becos, largos e praças". Em 21/11/1727, o capitão João Antônio Cabral Camello relatou ao padre Diogo Soares em "Notícias Práticas das Minas do Cuyabá e Goyases": "A Vila está situada na mesma margem direita, e banhada por um córrego acima entre morros: tem só oito casas de telha, entre as quais é a melhor a que foi do General Rodrigues Cezar: as mais são ainda de capim, mas por serem assim se não vendiam quando cheguei, por mais pequenas que fossem, por menos de 400 ou 500 oitavas cada uma, e as que tinham mais alguns cômodos chegava a 700".

Descrevendo a região, prosseguiu: "Fora da vila há três únicos arraiais, mas todos com poucos moradores: o primeiro é o do Ribeirão (o atual Ribeirão do Lipa); está pouco mais de meia légua distante da vila; para o sertão, adiante meia légua, está o segundo, que chamam da Conceição (é a Passagem da Conceição), com uma capela da Senhora, e seu capelão; adiante duas léguas, fica o terceiro, chamado o do Jacey; em todos, e nas vizinhanças, se tem achado muitas e boas manchas de ouro, como também nas da vila; mas duraram pouco tempo; nestas se achavam muitas folhetas e quase todo o seu ouro era grosso. Nas do Queixipó (Coxipó), que distam do Jacey três ou quatro léguas, assistem ainda hoje alguns mineiros com lavras, e lhe chamam de Forquilha".

Com o título de Vila Real, um privilégio que raramente a Corte de Lisboa concedia, Cuiabá foi o primeiro arraial português criado a Oeste do Tratado de Tordesilhas. Embora alguns historiadores paulistas discordem, Cuiabá foi Capital da Capitania de São Paulo, de 16/11/1726 até 20/03/1727, quando a Câmara da Cidade de São Paulo deu posse, por ordem de Dom João V, ao novo governador António da Silva Caldeira Pimentel, substituindo o capitão-general Rodrigo Cezar de Menezes, que estava nas Minas do Cuiabá para fundar a Vila Real do Senhor Bom Jesus e demorava a retornar.

Cuiabá surgiu de um núcleo de mineração, com ouro à flor da terra, conhecido por Lavras do Sutil, localizado nas margens do Córrego da Prainha, em 08/04/1719. O povoamento teve aspectos urbanos semelhantes aos de São Paulo, Ouro Preto, Salvador e Olinda, sempre respeitando a topografia do local e próximo aos rios. A Vila Real do Senhor Bom Jesus foi instalada em 01/01/1727, numa solenidade presidida por Dom Rodrigo Cezar de Menezes, o capitão-general de São Paulo, cumprindo ordens de Lisboa, que reconheceu Cuiabá como uma expressão maior da geopolítica portuguesa nos seus limites da América do Sul de então.

O capitão-general Rodrigo Cezar de Menezes deveria ter embarcado em junho de 1725, como afirmou em correspondência ao guarda-mor Pascoal Moreira Cabral, porém isto ocorreu em 16/07/1726. Acompanhado de uma expedição formada por 300 canoas e cerca de 3.000 pessoas, ele chegou a Cuiabá em 16/11/1726, após quatro meses de viagem, para instalar a Vila Real do Senhor Bom Jesus. A nova vila real tinha apenas "oito ou nove casas de telha", conforme o primeiro cronista Joseph Barboza de Sá. Sem saber da sua substituição, Dom Rodrigo Cezar de Menezes regressou a São Paulo em 04/06/1728.

Na sua jornada por via fluvial, o único meio de transporte na época, o governante paulista embarcou em Araritaguaba (Sorocaba), a 160 quilômetros da Vila de São Paulo. Após os preparativos, desceu os rios Tietê e Paraná, subiu o Rio Pardo, percorreu a pé "as duas léguas do Planalto de Camapuã", desceu os rios Coxim e Taquari e, por fim, subiu os rios Paraguai, São Lourenço e Cuiabá. Era uma cansativa viagem, mas no melhor roteiro através dos rios entre as duas vilas, pois nos trechos a pé era necessário carregar as canoas nos ombros, uma tarefa nada agradável, principalmente pelas grandes distâncias.

Em Cuiabá, a mais importante autoridade paulista (Cuiabá era parte integrante da Capitania de São Paulo) não encontrou o guarda-mor Pascoal Moreira Cabral, o primeiro administrador português, que faleceu em 1724, pobre e esquecido, aos 70 anos, nos arredores do arraial que fundou em 08/04/1719. No seu livro "Viagem ao Redor do Brasil", o general João Severiano da Fonseca, o Patrono do Serviço de Saúde do Exército, descreve as dificuldades do Arraial do Cuiabá em 1724: "Às extorsões e iniqüidades das autoridades, juntaram-se os ataques e depredações dos selvagens, os senhores da terra, em represália, que não se pode acoimar de injusta, da guerra de extermínio que sofriam".

Prosseguindo: "Além de pouco cultivo e nenhum cuidado nas roças, as chuvas e inundações as destruíam; o pouco que se poderia utilizar, era presa dos animais daninhos, principalmente ratos, que apareceram e desenvolveram-se como uma verdadeira praga". (...) "Um casal de gatos, que ali chegou, foi pago por uma libra de ouro, e os filhos, que produziram, a vinte e trinta oitavas cada um! Sal não havia, nem para batizados; uma vara de algodão vendia-se por doze oitavas. Enquanto que Pascoal cobrara os quintos reais na razão de duas e meia oitavas por pessoa de trabalho, o guarda-mor Jacinto começou a cobrá-los a seis por habitante, qualquer que fosse sua condição, sexo, idade, natureza e aptidão para o trabalho".

Conforme o Tratado de Tordesilhas (07/06/1494), Portugal fez em 1532 a primeira divisão política do Brasil, demarcando 15 lotes para doze donatários, por léguas imprecisas indo da costa para o interior, até uma linha imaginária, de Norte a Sul, a 370 léguas ao poente da Ilha de Santo Antão, a mais ocidental do Arquipélago de Cabo Verde. Das Capitanias, apenas Pernambuco, Itamaracá, São Vicente e Porto Seguro corresponderam aos objetivos de D. João III, filho de D. Manoel. Em 1549, com o fracasso das capitanias hereditárias, o governo de Lisboa assumiu o controle colonial do Brasil e nomeou um governador-geral, Thomé de Souza, em Salvador, adotando as capitanias gerais.

Restaurada a Casa de Bragança em 1640, os governadores-gerais do Brasil foram designados vice-reis, residentes em Salvador até 1762, quando o Marquês de Pombal, diante das constantes hostilidades na Europa, decidiu mudá-los para o Rio de Janeiro. As capitanias gerais iam surgindo ao longo desses anos, definindo uma nova divisão política do Brasil: Paraguaçu (1557), Paraíba (1592), Rio Grande do Norte (1603), Ceará (1612), Pará (1615), Santa Catarina (1654), Marajó (1665), São Paulo (1709), Minas Gerais (1720), Mato Grosso e Goiás (1748), Piauí (1750), São José do Rio Negro, depois Amazonas (1757), Rio Grande do Sul (1807), Espírito Santo (1810), Alagoas (1817), Sergipe (1820).

Pelo Tratado de Tordesilhas, somente um terço do território da América do Sul pertencia a Portugal. Para romper esse tratado, as Bandeiras paulistas avançaram rumo a Cuiabá em 1718, motivando o Tratado de Madri, de 13/01/1750, definindo novas fronteiras entre Portugal e Espanha, mas este outro tratado também foi anulado por antecipação com a criação da Capitania Geral e Independente de Mato Grosso, no final do reinado de Dom João V, em 09/05/1748 (instalada em 17/01/1751, na Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá).

As Bandeiras paulistas desafiaram as convenções internacionais e chegaram ao centro da América do Sul com as monções de 1718/1719. Fundaram um arraial e instalaram a Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá. Estava consolidado, então, o direito de posse de Portugal, no mais importante confronto entre as duas grandes potencias do mundo no ciclo das conquistas marítimas.

O "Auto de Fundação da Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá", publicado nos "Anaes da Província de Goiás", de J. M.P. Alencastro, bem como nos tomos 27-29 da "Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro", tem o seguinte texto, com grafia de alguns nomes corrigida conforme a "Nobiliarquia Paulistana Histórica e Genealógica", de Pedro Taques de Almeida Pais Leme, no volume II da "Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo":

"Ao primeiro dia do mês de janeiro de 1727, nesta Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá, sendo mandado por S. M., que Deus Guarde, a criá-la de novo o Exmo. Sr. Rodrigo Cezar de Menezes, Governador e Capitão-General desta Capitania, e que o acompanhasse para o necessário o Dr. António Álvares Lanhas Peixoto, Ouvidor-Geral da Comarca de Paranaguá, sendo por eles eleitos as Justiças, Juiz Ordinário Rodrigo Bicudo Chassim, o Tesoureiro Coronel João de Queiroz Mascarenhas Sarmento, e Vereadores Marcos Soares de Faria, Francisco Xavier de Mattos, João de Oliveira Garcia, e Procurador do Conselho Paulo de Anhayá Leme, servindo de Secretário da Comarca Luiz Teixeira de Almeida, Almotacé o Brigadeiro António de Almeida Lara, e o Capitão-Mor António José de Mello, levando o Estandarte da Vila Mathias Soares de Faria, foi mandado pelo dito Sr. Governador e Capitão-General que com o dito Dr. Ouvidor, todos juntos com a nobreza e o povo, fossem à praça levantar o Pelourinho desta Vila, a que em nome de El-Rei deu o nome de Vila Real do Bom Jesus, e declarou que sejam as Armas, de que usasse, um escudo dentro com campo verde e nele um morro ou monte todo salpicado com folhetos e granetos de ouro; e, por timbre, em cima do escudo, uma fênix; e nomeou para levantar o Pelourinho o Capitão-Mor Regente Fernando Dias Falcão; e todos sobreditos com o dito Dr.Ouvidor, nobreza e povo foram à praça desta Vila, onde o dito Fernando Dias Falcão levantou o Pelourinho, do que para constar a todo o tempo fiz este termo, que assinou o dito Sr. General com todos os sobreditos. E eu, Gervásio Leite Rebello, secretário deste governo, que o escrevi, dia e era ut supra,etc.

Seguem as assinaturas de: Rodrigo Cezar de Menezes, António Álvares Lanhas Peixoto, Rodrigo Bicudo Chassim, Marcos Soares de Faria, Francisco Xavier de Mattos, João de Queiroz Magalhães Sarmento, João de Oliveira Garcia, Luiz Ferreira de Almeida, António José de Mello, Paulo de Anhayá Leme, António de Almeida Lara, Mathias Soares de Faria, Fernando Dias Falcão, João Pereira da Cruz, Manoel Dias de Barros, Luiz de Vasconcelos Pessoa, Manoel Vicente Nunes e Salvador Martins Bonilha".

A vinda de Dom Rodrigo Cezar de Menezes a Cuiabá para elevar o arraial à vila real, em 01/01/1727, trouxe conseqüências, conforme o relato do general João Severiano da Fonseca: "Grande parte dos moradores preferiu abandonar a vila, uns buscando Goiás e S. Paulo, outros novas direções, onde grande número deles assinalou os caminhos com as cruzes das suas sepulturas. Alguns deles, mais pertinazes, e guardando em si, ainda vívido, o sangue e o espírito afoito dos sertanistas, botaram-se para o Ocidente, para os ínvios sertões dos Bororos e Aravirás, e os dos Parecís, a buscar novos descobertos, ou senão a aprisionar os míseros índios, que viriam vender nos povoados. Só no ano de 1728, mais de mil pessoas abandonaram Cuiabá em busca de Goiás".

Confirmando que Cuiabá foi sede do governo paulista, entre diversos registros poderia ser citado o seguinte, encontrado nos Documentos Interessantes para a História e Costumes de São Paulo, no volume XII: "Documento N. 2 - Reg.º (Regulamento) de hú Regim.to (Regimento) que se deu a Ant.º (António) Borralho de Almeida, que vay do Rio dos Porrudos (São Lourenço). "R.º (Rodrigo)Cezar de Menezes, etc. - Porq.to (porquanto) entendo se fas preciso ao serviço de S. Majestade que, D.s (Deus) o g.e (guarde), ao aumento da sua real fazenda, e a utilidade do bem comum, mandar bandeiras com cabos capazes de experiência, a fazer descobrimentos de ouro nas campanhas deste certão (sertão), e ter notícia que nas cabeceiras do Rio dos Porrudos (Rio São Lourenço), e suas vezinhanças há paragens que prometem encontrarem-se haveres que possão (possam) ter conta, Ellegi elegi) para Cabo da dita bandeira ao Capp.m (capitão) Ant.o Borralho de Almeida, por saber que é muito inteligente, valoroso, e capaz de qualquer empresa de que o encarregar, sendo por certo que de tudo dará inteira satisfação, e para se reger observará os Cap.os (capítulos) seguintes".

"Porá todo o cuidado em que se não faça outra algua (alguma) diligência, primr.o (primeiro) que descobrir-se ouro, ou outro qualquer metal, examinando com todo o vagar os ribeiros. Terá particular cuidado se descobrir pedras de cores azul, vermelha, verde, amarela, ou branca transparente, remeter-las para ver se são preciozas, deixando sempre húa diviza na parte que as descobrir, para a todo o tempo se saber a donde as há. Procurará ver se pode reduzir o gentio bárbaro, a que se meta de pás mandando-lhe ponteiros, prometendo-lhe que serão aldeados, e bem tratados dos seus adeministradores, e no caso que desprezem a d.a (dita) offerta, e hajão (hajam) de embaraçar a diligência a que vay (vai), e se ponhão (ponham) em resistência, lhes fará guerra e ficarão prizioneiros, trazendo-os seguros à minha prezença para serem repartidos na forma da ordem de S. Magestade, não consentindo aos seus soldados fação (façam) violencias, nem pertubações que prejudiquem a união que tanto hé necessária em semelhantes emprezas, e o que o contrário fizer, e não obedecer ao d.o (dito) cabo, o poderá castigar, e quando se recolher dar me parte para que, a vista das suas culpas, se use aquela demonstração que merecer".

"Cuidará muito de fazer fogos por várias partes para ver se lhe corresponde, com os mesmos signaes, os Cabos das tropas do Certão dos Guayazes, e o mesmo gentio lhe poderá dar individual notícia se por aquelas alturas aparecem brancos, e no caso que tenha o encoentro (encontro) de algúa (alguma) pessoa da dita tropa daquele Certão (sertão), o encaminhará para vir a minha prezença com a brevidade possível. E porq.to (porquanto) poderá sobrevir algum particular importante, que não seja possível pela distância darme parte, pode o dito cabo obrar (fazer) o que lhe parecer mais conveniente, que tudo fio da sua pessoa, capacidade, valor e experiência. Do serviço que fizer será atendido, e premiado com aquellas honras, e m.ces (mercês) que a grandeza de S. Magestade costuma distribuir com os beneméritos. Dado nesta Villa Real do Senhor Bom Jesus, aos 29 de Abril de 1727 - O Secretário Gervásio Leyte Rebello o fez. - R.º (Rodrigo) Cezar de Menezes".

As Minas do Cuiabá não eram apenas as existentes no atual Município de Cuiabá. Quando foi informado que os irmãos Leme (João Leme da Silva, Lourenço Leme da Silva e Pedro Leme da Silva) hostilizavam a sua liderança, com o apoio velado de Fernando Dias Falcão, homem rico que sonhava em ser o capitão-mor das Minas do Cuiabá e um dos mais prósperos mineiros da Capitania de São Paulo, Pascoal Moreira Cabral enviou uma correspondência a Dom João V, em 15/07/1722, das "Minas do Cuxipó", relatando seus serviços e solicitando, por se achar destituído de fundos, com mulher e três filhos, a sua confirmação como guarda-mor das minas de ouro do Cuiabá e de capitão-mor regente dos sertões em que ele servia há seis anos (disse que chegou à região em 1716). Ele se referia às "Minas do Coxipó” existentes no Arraial de Forquilha, por ele instalado na parte alta do atual Rio Coxipó, no seu encontro com o Rio Motuca (Daí o nome Forquilha).

O Arraial do Senhor Bom Jesus do Cuiabá surgiu com a descoberta das históricas Lavras do Sutil, em outubro de 1722. Em "Relação das Povoações do Cuiabá e Mato Grosso de Seus Princípios Thé os Prezentes Tempos", o primeiro cronista Joseph Barboza de Sá transcreveu o documento da fundação do arraial: "Aos oito dias do mês de abril da era de mil setecentos e dezenove anos neste Arraial do Cuiabá fez junta o capitão-mor Pascoal Moreira Cabral com os seus companheiros e ele requereu a eles este termo de certidão para notícia do descobrimento novo que achamos no Ribeirão do Coxipó, sob invocação de Nossa Senhora da Penha de França"... A Capela de Nossa Senhora da Penha de França, depois de várias reformas ao longo dos séculos, continua na região do antigo Arraial de Forquilha.

Ainda citando o cronista Joseph Barboza de Sá: "No mês de outubro deste ano (1722) fez Miguel Sutil natural de Sorocaba viagem para uma roça que tinha principiado na borda do Cuiabá, lugar que depois foi sítio de Manoel dos Santos Ferreira; chegando, plantou o seu roçado e mandou dois carijós buscar mel. Com seus machados e cabaços chegaram ao rancho alta noite sem mel. Pelejando o amo com eles por gastarem o dia sem montaria, respondeu o mais ladino: Vos viestes a buscar ouro ou mel, e perguntando-lhe o amo onde estava o ouro meteu a mão no seio de um jaleco de baeta que tinha vestido e, cingindo com uma cinta, tirou um embrulho de folhas e entregou ao amo que abrindo o achou em vinte e três granetos de ouro que pesaram cento e vinte oitavas, dizendo o carijó que achara muito daquilo".

Mais adiante: "No seguinte dia botaram-se para o Arraial do Coxipó (Forquilha) e fizeram público o descoberto ao que se seguiu despejarem todos a se mudarem para este sítio, a que chamaram de Lavras do Sutil, onde foram formando arraial e desfrutando a lavra que foi a mancha de ouro mais copiosa que se tem achado em todo o Brasil, isto é, do alto onde está o tanque (o tanque do Arnesto ou Ernesto, que existiu na lateral direita da Igreja do Rosário) pela quebrada abaixo até o córrego que serão quatrocentas braças pouco mais ou menos e cousa de cento e cinqüenta braças para cada lado".

"Avaliou-se tirar-se desse lugar dentro de um mês melhor de quatrocentas arrobas de ouro sem que os socavões aprofundassem mais de até quatro palmos. Neste mesmo ano levantou o capitão-mor Jacinto Barboza Lopes igreja à sua custa coberta de palha que logo serviu de freguesia no mesmo lugar em que se acha a que de presente existe dando-lhe o título de Igreja do Senhor Bom Jesus do Cuiabá (foram muitas as homenagens ao Senhor Bom Jesus durante o Brasil colonial), onde disse a primeira missa o seu irmão, o padre frei Pacífico dos Anjos, religioso franciscano".

Ressalta o parecer do Conselho Ultramarino, de 29/01/1748, sobre a criação das Capitanias de Mato Grosso e de Goiás em maio: "No Distrito do Cuiabá ainda reconhece o Conselho maior a necessidade de governador distinto e inteligente, e assim porque a extensão dele ainda exceda a dos Goiás, e a distância é muito maior, gastando-se de S. Paulo à Vila do Cuiabá seis meses de trabalhosissíma navegação e dali ao Mato Grosso (na região do Rio Guaporé, onde foi instalada a segunda vila, em 15/03/1752: Vila Bela) outro mês como pela circunstância de confinar este Mato Grosso com o governo espanhol de Santa Cruz de La Sierra, e com as aldeias dos jesuítas castelhanos dos Mochos e Chiquitos, donde nasce, e sobrevindo, como já sucedeu, e sucederá freqüentemente, contendas por causa dos confins e da comunicação, é muito conveniente que ali haja governador capaz de responder e obrar com acerto em semelhantes casos para evitar desconfianças da Corte de Madri, sem perder o direito de nossos descobrimentos".

Mantendo as características de uma cidade portuguesa, Cuiabá soube exaltar sua memória histórica e seus valores culturais. As tradicionais famílias cuiabanas que assumiram a missão de manter, com orgulho, essas raízes portuguesas, nem notaram que estavam promovendo a histórica convivência cultural de duas épocas distintas. Semelhante às antigas laranjeiras cuiabanas (beneficiadas pelas fontes de água natural que existiam nos quintais), as suas tradições e os seus costumes reflorescem, rompendo quase três séculos, revivendo a civilização portuguesa que aqui foi implantada no início do Século XVIII com as benesses de Lisboa.

A "Linguagem Cuiabana" é uma herança portuguesa que continua viva, somando o Português camoniano com o topônimo indígena e o dengo africano, além do Espanhol, indo da elite ao ribeirinho. O cuiabano teve a “fortuna” (a felicidade) de preservar palavras que são desconhecidas em outras regiões. É o falar exclusivo dos cuiabanos, “atochado” (apertado) entre épocas secularmente distintas, nessa "lonjura" (distância) das matas, mas uma verdadeira "mão de estuque" (expressão definitiva de vitória). Existem dois tipos de Português, o Culto, no “assistir” (como residência temporária) e o Vulgar, enriquecido com o Cuiabanizado “novidadeiro” (que tudo quer saber).

A herança cultural portuguesa permaneceu em Cuiabá. O isolamento geográfico serviu para a preservação da sua identidade sublimada nas raízes portuguesas. A arte barroca está ainda nos velhos sobrados, onde a taipa socada antecipou-se ao cimento. Os seus objetos valiosos, incluindo prata e ouro, já foram adquiridos por especuladores, mas o passado resiste nas residências das famílias tradicionais e nos museus de Cuiabá. No início do Século XIX, existiam cerca de 80 pianos em Cuiabá e os clássicos musicais europeus eram os preferidos da sua elite.

O Rocio de Cuiabá foi autorizado pela Provisão de 22/05/1733 e demarcado em 1739. Tinha os seguintes limites: “O Rio Coxipó-Mirim, desde a sua barra no Rio Cuiabá até a roça de Domingos Gonçalves; deste ponto, em linha reta, até ao arraial de Nossa Senhora da Conceição das Lavras; daqui até ao Ribeirão de Frei Braz; por este ribeirão abaixo até a sua barra no Rio Cuiabá; e por este abaixo até a foz do Rio Coxipó-Mirim”. Dom Antônio Rolim de Moura, que foi primeiro capitão-general da Capitania de Mato Grosso, considerou excessiva a área de três léguas e doou várias sesmarias ao seu redor. Cuiabá foi o maior Município do Brasil, mas o seu progresso não conseguiu romper o forte vínculo deixado pelos portugueses.

A palavra Cuiabá é citada em todo o Brasil e desperta grande interesse quanto as suas origens. Após cuidadosa pesquisa, conclui que tem origem no tupi-guarani: gua-y-abá, o "Vale dos Índios das Águas", ou “Vale dos Índios Canoeiros”, numa evidente identificação com Pantanal Mato-grossense, que era o “Mar dos Xaraés”, dos espanhóis. Os bandeirantes paulistas, que falavam o tupi-guarani, chamavam a região “do Cuiabá”. Antes de ter o nome de Cuiabá, o rio tinha uma designação originária do tupi-guarani: Ibiraty (onde a madeira rola nas águas). A região do Cuiabá era assim conhecida antes da chegada das primeiras Monções, no início do Século XVIII.

A diferença de altitude entre Cuiabá e Corumbá é de aproximadamente 40 metros, formando um imenso vale. Por isto, a associação do nome original ao seu mais importante centro populacional. A Cidade de Cuiabá, elevada em 17/09/1818 e declarada sede do governo colonial, pela segunda vez, por um alvará de 1820, foi confirmada pela Lei Provincial nº 19, de 28/08/1835, como Capital da Província de Mato Grosso. Os primeiros documentos oficiais identificam Cuiabá como “Vila Real do Senhor Bom Jesus”. Cuiabá era a região, o Distrito, antes da Capitania.

Com o Alvará de 09/05/1748, Dom João V criou os governos das minas de Cuiabá e Goiás, vinculando as Comarcas de São Paulo e Paranaguá à Capitania do Rio de Janeiro, e determinou ao governador paulista Luiz de Mascarenhas a se recolher "para o Reino na primeira frota". Não havia um limite territorial definido para essas duas novas Capitanias: "... e os confins do Governo de Mato Grosso e Cuiabá hão de ser para a parte de São Paulo pelo dito Rio Grande (Rio Paraná) e pelo que respeita à sua confrontação com os Governos de Goiás e Maranhão, vista a pouca notícia que ainda há daqueles sertões, tenho determinado se ordene a cada um dos novos governadores, e também ao do Maranhão, informem por onde poderá determinar-se mais cômoda e naturalmente a divisão".

O parecer do Conselho Ultramarino de 29/01/1748, que aprovou a criação das Capitanias de Mato Grosso e de Goiás, fixava: “No Distrito do Cuiabá ainda reconhece o Conselho maior necessidade de governador distinto e inteligente, e assim porque a extensão dele ainda exceda a dos Goiás, e a distância é muito maior, (...) é muito conveniente que ali haja um governador capaz de responder e obrar com acerto em semelhantes casos para evitar desconfianças da Corte de Madri, sem perder o direito de nossos descobrimentos".

O primeiro governante da Capitania de Mato Grosso, Dom Antônio Rolim de Moura, foi nomeado pela Carta Régia de 22/09/1748. Ele chegou a Cuiabá (única vila real existente) em 12/01/1751, sendo empossado logo "no domingo seguinte" (17/01/1751), instalando solenemente a Capitania. Vila Bela nem sequer tinha sua localização ainda definida. A Capitania Geral de Mato Grosso contava com 22.000 habitantes, que estavam assim distribuídos: 12.000 escravos, 5.000 mulheres e 5.000 homens, incluindo velhos, jovens e crianças. Deles, apenas 2.000 podiam lutar. Desses habitantes, 15.000 residiam em Cuiabá.

Em 27/06/1751, em Cuiabá, Dom Antônio Rolim de Moura autorizou a ida direta das monções para a região de São Francisco Xavier, onde estavam as minas do Guaporé, encurtando o tempo da viagem para somente cinco meses. Autorizou a navegação pelo Rio Madeira e recomendou o povoamento de Mato Grosso com colonos vindos das ilhas dos Açores e da Madeira (mas foi mantido o fluxo migratório do Norte de Portugal). Buscou, também, novo caminho para a região do Rio Guaporé, sem interromper as viagens no período das águas. Após governar por quase dez meses na Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá, viajou para a região do Rio Guaporé em 03/11/1751, para escolher o local e instalar Vila Bela em 19/03/1752, a futura sede do governo da Capitania.


VI – A COLONIAL CUIABÁ CULTA
O descobridor de Cuiabá é o bandeirante António Pires de Campos (filho), que em 1718 chegou ao Arraial de São Gonçalo (Bairro de São Gonçalo Beira Rio), mas o seu fundador é o bandeirante Pascoal Moreira Cabral, em 08/04/1719, no Arraial de Forquilha, no atual Distrito do Coxipó do Ouro. O descobridor das Minas do Cuiabá foi outro bandeirante, Miguel Sutil, em 1722, no "Tanque do Arnesto", ao lado da Igreja do Rosário, onde existe a Capela de São Benedito, iniciando o atual perímetro urbano de Cuiabá.

Para o cronista Joaquim da Costa Siqueira, o fundador do Arraial do Senhor Bom Jesus, Pascoal Moreira Cabral, era "um paulista dos bons, homem chão, sem letras, pouco polido, de agudo entendimento, sem maldade, sincero, caritativo por extremo, servia e remediava a todos com o que tinha e no que podia, esperto na milícia dos sertões e no exercício de minerar pelo ter já exercitado nas Minas Gerais valoroso e constante trabalho, faleceu nesta vila e jaz sepultado na igreja matriz dela e deixou um filho do mesmo nome, que depois da morte do pai veio a estas minas e voltou para povoado".

A Capitania de Mato Grosso, criada em 09/05/1748 por Dom João V, e instalada em 17/01/1751, teve nove capitães-generais: António Rolim de Moura, o Conde de Azambuja, de 17/01/1751 a 01/01/1765; João Pedro da Câmara, de 01/01/1765 a 03/01/1769; Luiz Pinto de Souza Coutinho, o Visconde de Balsemão, de 03/01/1769 a 13/12/1772; Luiz de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, de 13/12/1772 a 20/11/1789; João de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, de 20/11/1789 a 28/02/1796, quando faleceu; Caetano Pinto de Miranda Montenegro, o Marquês de Praia Grande, de 06/11/1796 a 15/08/1803; Manoel Carlos de Abreu Menezes, de 28/07/1804 a 08/11/1805, quando faleceu; João Carlos Augusto D'Oeynhausen Grewenbourg, o Marquês de Aracati, de 18/11/1807 a 06/01/1819; e, finalmente, Francisco de Paula Magessi Tavares de Carvalho, o Barão de Vila Bela, de 06/01/1819a 20/08/1821, que foi deposto.

O primeiro capitão-general, Dom António Rolim de Moura, era fidalgo de prestígio na Corte de Lisboa, onde nasceu em 12/03/1709. Nomeado pela Carta Régia de 22/09/1748, chegou a Cuiabá em 12/01/1751 e foi empossado em 17/01/1751, "no domingo seguinte", instalando solenemente a nova Capitania. Com ele veio o melhor do Português Culto então falado na Corte. Após os primeiros atos oficiais em Cuiabá, Dom António Rolim de Moura seguiu para a região do Rio Guaporé em 03/11/1751, com o Dr. Theotonio da Silva Gusmão, o primeiro juiz-de-Fora da Capitania de Mato Grosso, além do jesuíta Agostinho Lourenço, para fundar Vila Bela da Santíssima Trindade, a nova sede do governo, em 19/03/1752.

Após navegar por onze rios, durante mais de cinco meses, sua comitiva chegou ao Rio Cuiabá. Na manhã de 11/01/1751, na ermida em honra de Santo Antônio, Município de Santo Antonio de Leverger, foi celebrada uma missa, acompanhada de três descargas de mosquete e 21 das peças de artilharia que estavam nas canoas, em homenagem a Santo Antônio. Na oportunidade, chegou ao local uma comitiva de todos os membros da Câmara e oficiais de Justiça de Cuiabá. Com todas as pompas, ele foi recepcionado em Cuiabá na manhã de 12/01/1751. Duas peças de artilharia, no porto de Cuiabá, deram salvas de boas vindas à comitiva no momento em que as embarcações ultrapassaram a curva do rio. Ao saltar em terra, Dom António Rolim de Moura foi saudado pelos dragões com três descargas de mosquetes e por 21 tiros de canhão. A sua posse como capitão-general de Mato Grosso ocorreu em Cuiabá na manhã de 17/01/1751.

Na "Relação" feita sobre essa viagem, Dom António Rolim de Moura diz: "No porto tinham todos os seus cavalos, e estava também um preparado para mim, por ser a distância até à vila de meia légua, e me acompanharam todos até à minha porta; aos padres convidei a cearem comigo; ali estiveram formadas as ordenanças da terra de uniforme, as quais mandei retirar, e antes deram três descargas". Logo após a sua posse, ele executou as "Instruções Dadas pela Rainha ao Governador da Capitania de Mato Grosso, Dom António Rolim de Moura", de Da. Maria Ana de Áustria, esposa de Dom João V, de 19/01/1749. Compreende 32 recomendações da Corte Portuguesa para serem cumpridas na nova Capitania.

Da. Maria Ana de Áustria assinou em 25/09/1748 a carta-patente de governador e capitão-general de Dom António Rolim de Moura, empossado em 25/09/1748, mas a solenidade de "preito e homenagem" ao governador da nova Capitania ocorreu em 18/01/1749, quase quatro meses depois, "em os Paços da Ribeira, onde ora assiste o Muito Alto e Muito Poderoso Rei D. João V"... Ainda jovem capitão de Infantaria, Dom António Rolim de Moura ocupou o cargo de Veador da Casa da Rainha Da. Maria Ana de Áustria, nomeado por Dom João V em 09/06/1744.

Em 18/11/1763, Dom António Rolim de Moura soube que a Corte lhe concedera o título de Conde de Azambuja e promovido ao posto de marechal-de-campo, sendo designado para as funções de capitão-general da Bahia. Soube, ainda, que seria sucedido pelo sobrinho João Pedro da Câmara, empossado a 01/01/1765. Ficou em Vila Bela durante 45 dias, embarcando a 15/02/1765 para a Bahia, pelos rios amazônicos, com escala em Belém. Ele estava "surdo, com obstruções, vertigens e papadas, e sobre todos estes achaques, sumamente pobre e empenhado", de acordo com uma carta do capitão-general João Pedro da Câmara a Dom Luís da Cunha. Além disto, sofria de bócio e de malária, que se repetiam nas conjunções da Lua, quando ele usava quina, com bons resultados.

Em 14/08/1767, Dom António Rolim de Moura foi nomeado para o cargo de vice-rei e capitão-general de Mar e Terra do Estado do Brasil (o décimo), e empossado a 17/11/1767, na Catedral de São Sebastião, no Rio de Janeiro. Permaneceu na administração do Brasil colonial até 04/11/1769. Retornando a Portugal, ele foi nomeado presidente do Conselho da Fazenda de Sua Majestade. Em 23/04/1779 assumiu as funções de Governador das Armas da Corte e Estremadura. Em 16/01/1780 foi eleito sócio da Academia das Ciências de Lisboa, na Classe de Ciências de Cálculo, mas pediu para ser dispensado do Comando das Tropas da Corte por estar doente. Solteiro e sem herdeiros, ele morreu em 08/12/1782.

O maior estadista de Mato Grosso no período colonial foi o capitão-general Luís d’Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres. Governou a Capitania Geral de Mato Grosso por 16 anos, onze meses e sete dias, de 13/12/1772 a 20/11/1789. Fidalgo e membro de importantes ramos familiares (Albuquerque, Melo e Castro), nasceu na Vila de Ladário, Viseu, em 21/10/1739. O seu nome foi indicado por Dom José I, o Reformador, ao ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal. Com 31 anos, era reconhecido por seus méritos como capitão engenheiro responsável por obras do Exército em Portugal. A decisão foi tomada em maio e em 03/07/1771 Dom José I assinou a sua carta-patente. Tudo ocorreu tão rápido que Dom Luís d’Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres comunicou ao pai que não queria o cargo. Dom Francisco de Albuquerque de Castro lembrou então que ninguém podia discutir uma ordem do rei e diante da insistência do filho viu-se obrigado a puni-lo com golpes de bastão no peito, no rigor da disciplina paterna na época.

Em 12/10/1771, nove dias antes de completar 32 anos, o jovem militar embarcou no "aviso" que o levaria do Rio Tejo para o Oceano Atlântico iniciando sua viagem ao Rio de Janeiro, para chegar até à distante Vila Bela da Santíssima Trindade, percorrendo ainda o pioneiro caminho de terra por Goiás, com 569 léguas, em 116 dias, somando-se mais 83 para descanso. Confirmada a viabilidade do caminho de terra, chegou a Cuiabá em 04/10/1772, às 17:00 horas, hospedando-se na melhor casa da vila real, no antigo Largo da Mandioca, a atual Praça Conde de Azambuja, na esquina das ruas Pedro Celestino e Governador Rondon, que ficou conhecida por Palácio dos Capitães-Generais. Tendo descansado 32 dias em Cuiabá, ele seguiu viagem para Vila Bela, ali chegando 24 dias depois.

Fundou as cidades de Ladário e Corumbá, em Mato Grosso do Sul, e Poconé e Cáceres, em Mato Grosso. Definiu o território da Capitania desde a margem direita do Rio Paraguai até a margem esquerda do Rio Araguaia; construiu os fortes de Coimbra, ao Sul, e Príncipe da Beira, ao Norte; e sonhou interligar as bacias do Rio da Prata e do Amazonas, através dos rios Alegre e Aguapeí, por um canal. Foi sucedido pelo irmão, Dom João d’Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, que tomou posse em 20/11/1789 e governou durante seis anos, três meses e oito dias, mas foi o primeiro capitão-general de Mato Grosso a morrer no exercício do cargo, vítima de malária, em 29/02/1796.

Sobre o maior estadista da Capitania de Mato Grosso, o sociólogo Gilberto Freyre escreveu o livro "Contribuição Para Uma Sociologia da Biografia" - O exemplo de Luis d’Albuquerque, Governador de Mato Grosso no fim do Século XVIII, publicado pela Fundação Cultural de Mato Grosso em 1978 para comemorar o bi-centenário de Corumbá e Cáceres. Após defini-lo como "expressão de homem luso-tropical", "tipicamente um pombalino no seu estilo ou modo de ser homem de governo orientado pelo saber científico...", Gilberto Freyre ressaltou os aspectos positivos do grande governante mato-grossense: fidalgo, bom e sábio homem de governo.



Acrescentou: "Dom Luís foi, dentre os homens de governo desse século XVIII, um que restabeleceu a aliança da ciência com a administração pública; com a ação colonizadora de Portugal nos trópicos. Daí poder ser comparado, sem excesso de retórica, com o próprio Conde Maurício de Nassau; fidalgo alemão do Século XVII que no governo, durante oito anos, do Brasil holandês, foi no que primou de modo admirável: juntar a ciência à administração de terras e gentes tropicais. Em acrescentar à boa administração exemplos aos governados, de boas maneiras; de carinho pelas belas artes; de atenção às graças da vida".

"Ele não foi, no governo da Capitania que lhe foi confiada, um mero fidalgo a quem a Metrópole quisesse dar atribuições de um quase Vice-Rei. Nem um simples burocrata. Nem apenas um administrador". Depois de considerá-lo um exemplo de homem luso-tropical, destacou no seu perfil: "Um mais que português que não deixa de ser, nas suas raízes, português; porém que não se teria realizado como simples português europeu a quem faltasse a vivência, a experiência tropical; a convivência com populações ou gentes tropicais; a identificação com dimensões de espaço e de tempo que o português, saído de país pequeno - quase um claustro - só adquiriria em extensões tropicais que viria a percorrer no Oriente, na África, na América, projetando-se nessas extensões e vivendo nelas com um sentido de espaço e tempo diferente do europeu. Dom Luís foi como viveu em Mato Grosso: como que libertando-se, de algum modo, do claustro que fora sua fidalga mansão de Ínsua e o técnico educado sob a influência da renovação do ensino em Portugal empreendida por Pombal".

Em 1790, voltou a Lisboa "alquebrado e doente". Aos 53 anos, faleceu solteiro e sem descendentes, após ter assumido, em 19/01/1792, as funções de conselheiro de capa e espada do Conselho Ultramarino. O capitão-general António Rolim de Moura (de 17/01/1751 a 01/01/1765) tomou posse e instalou a Capitania de Mato Grosso em Cuiabá e fundou Vila Bela da Santíssima Trindade em 19/03/1752. Os seus sucessores João Pedro da Câmara (de 01/01/1765 a 03/01/1769) e Luiz Pinto de Souza Coutinho (de 03/01/1769 a 13/12/1772) optaram pela região do Rio Guaporé, onde chegavam pelos rios amazônicos.

O capitão-general Luís d’Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres (de 13/12/1772 a 20/11/1789) foi o primeiro governante colonial a reconhecer a importância de Cuiabá, vindo por terra desde o Rio de Janeiro. Dos nove capitães-generais de Mato Grosso, três se destacaram em diferentes áreas administrativas. O capitão-general, Dom Antônio Rolim de Moura instalou a Capitania de Mato Grosso em Cuiabá, fundou Vila Bela da Santíssima Trindade para ser a nova sede do governo e garantiu as fronteiras na região do Rio Guaporé. O capitão-general Dom Luís d’Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, o maior estadista do período colonial, ampliou e definiu os limites da Capitania.

Dom João Carlos Augusto d'Oeynhausen e Grewenbourg, oitavo capitão-general, previu o fim do ciclo da mineração, implantou o ciclo da agro-pecuária e realizou várias obras de importância no setor urbano de Cuiabá, que era a maior cidade da Capitania. Entre essas obras se destacam o Hospital dos Lázaros, já desativado, e a Santa Casa de Misericórdia, que continua prestando valiosos serviços a Mato Grosso. Escolheu Cuiabá temendo a insalubridade de Vila Bela que motivara a morte dos capitães-generais João d’Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres (28/02/1796) e Manoel Carlos de Abreu Menezes (08/11/1805), e outros funcionários do governo colonial. Foi capitão-general de quatro Capitanias: Pará, Ceará, Mato Grosso e São Paulo. Com pouco tempo na Capitania do Pará, substituiu o primeiro capitão-general do Ceará, o chefe-de-Esquadra Bernardo Manoel Vasconcelos, que faleceu no exercício do cargo. Governou a Capitania do Ceará de 13/11/1803 a 13/02/1807.

Nomeado capitão-general de Mato Grosso por Carta Régia de 24/06/1806, e com ordens de assumir imediatamente, para substituir o capitão-general Manoel Carlos de Abreu e Menezes, que faleceu vítima de malária em Vila Bela, saiu do Ceará em 13/02/1807 e em 07/10/1807 já estava em Cuiabá. Embora tenha assumido em Vila Bela, a sede oficial do governo, ele voltou em 18/11/1807 para Cuiabá de onde governou a Capitania até 06/01/1819, quando foi nomeado para o cargo de capitão-general de São Paulo. Com a Independência do Brasil ele foi duas vezes ministro de Estado. Marechal-de-campo do Exército, nomeado Marquês de Aracati e senador vitalício pela Província do Ceará, no Primeiro Reinado. Renunciou ao cargo para acompanhar o amigo pessoal Dom Pedro I após a abdicação e morreu em Moçambique a 28/03/1838, no exercício do cargo de governador. Ao capitão-general João Carlos Augusto d’Oeynhausen e Grewenbourg devem ser creditados também os primeiros instantes que definiram a "Linguagem Cuiabana", pois sua capacidade de se comunicar facilitou o convívio do Português Vulgar com o Português Culto em Cuiabá.

A primeira biblioteca de Cuiabá pertenceu ao primeiro cronista Joseph Barboza de Sá, que escreveu a "Relaçaó das Povoaçoens do Cuyabá e Mato Grosso de Seos Principios Thé os Prezentes Tempos", concluída em 18/08/1775, um pouco antes da sua morte, ocorrida a 30/05/1776, em Cuiabá. Ele possuía 123 livros, em três estantes, arrematados em haste pública de 01/12/1776 pelo cronista Joaquim da Costa Siqueira. O licenciado Joseph Barboza de Sá, português de nascimento, deixou quatro filhos: José, o mais velho deles, morou na região do Rio Acima e morreu em 1815 deixando viúva e quatro filhos: Antonio, Ana, Joaquim e Francisco. O segundo foi Joaquim, identificado, aos 47 anos, pelo desembargador José de Mesquita nos registros de 1823. Escreveu, também, "Dados Geográficos, Cronológicos, Políticos e Naturais".

O segundo cronista de Cuiabá foi o capitão-de-Cavalaria e vereador Joaquim da Costa Siqueira, autor das "Crônicas do Cuiabá", que nasceu em São Paulo, sendo a sua mãe pertencente à tradicional família Maciel. Seus registros históricos foram publicados na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, volume XIII, em 1872, sob o título "Compendio Histórico Cronológico das Notícias do Cuiabá, Repartição da Capitania de Mato Grosso". Faleceu em Cuiabá, aos 82 anos, às 21:00 horas de 04/12/1821. Do período colonial, outros dois merecem ser citados: Felipe José Nogueira Coelho, provedor da Fazenda Real e Intendência do Ouro, com “Memórias Cronológicas da Capitania de Mato Grosso”, e o padre João A. Cabral Camelo, com “Notícias Práticas das Minas do Cuiabá”.

Os portugueses trouxeram para a Vila Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá três tradições culturais: a Tourada, semelhante às corridas de touro ainda realizadas em Portugal, e que permaneceram até o início do Século XX; a Cavalhada, hoje restrita a Poconé; e o Teatro, com peças de autores portugueses. Em Vila Bela da Santíssima Trindade apenas o teatro teve um maior destaque. Em Cuiabá, os festejos juninos vão até julho, mas raramente há a tradição de "lavar o santo" - com a imagem de São João sendo "lavada", sibolicamente, no Rio Cuiabá.

As primeiras Touradas Cuiabanas eram realizadas no Largo do Palácio (o Jardim Alencastro) desde 1805. O capitão-general, Francisco de Paula Magessi Tavares de Carvalho (06/01/1819 a 20/08/1821), último deles, adquiriu em 1819 o prédio do antigo Palácio Alencastro e por isto a Tourada foi transferida outro local "mais afastado", o atual Jardim Ipiranga, onde permaneceu até 1876, quando foi para o Campo D'Ourique, na depois Praça Moreira Cabral, onde hoje está a Câmara Municipal de Cuiabá, no marco do Centro Geodésico da América do Sul.

A última Tourada em Cuiabá ocorreu em 1936, por decisão do governador Mário Corrêa da Costa, para atender os que não aceitavam o "sofrimento" dos touros. No Campo D’Ourique, os cuiabanos aplaudiam as Touradas, acompanhando a tradição portuguesa. Com a sobrecasaca vermelha, montado seu cavalo ajaezado, o toureador era um símbolo da cultura portuguesa no centro da América do Sul. Além dele, o luxo era também observado entre os espectadores mais prósperos, principalmente entre as mulheres que exibiam os seus chapéus e vestidos caros.

Durante três dias, o social e o religioso uniam a população cuiabana em torno das festas do Senhor Divino, tradição portuguesa ainda preservada pelas famílias cuiabanas mais antigas, e das corridas de touros. Às vezes, as Touradas eram realizadas durante quatro tardes. A arena usada correspondia a um quadrilátero de madeira, rodeado de palanques cobertos por tecidos coloridos, ostentando as posses do proprietário. Embaixo dos camarotes, nos chamados poleiros, ficavam os menos afortunados.

Ao lado do toureador ficava um cavaleiro, o "jacuba", que lhe fornecia as lanças, oferecendo as "sortes" em seu nome, e as "cobrava" galhardamente. Os outros ajudantes do toureador ficavam a pé. Eram os "capinhas", com jaqueta e garrocha vermelhas e calça branca, com bandeiras também vermelhas para enfurecer os touros; e os "máscaras", vestidos com suas fantasias para divertir a assistência, misturando o grotesco e a coragem. Quando o touro investia contra o "capinha" na porta do curro, o toureador fazia a "sorte" enfiando a lança no pescoço do animal, que com a dor esperneava e provocava a quebra da mesma. O público ia ao delírio, gritando forte: “Apeia, eia, eia... toureador! Apeia, eia, eia...” Depois de muito “picado” e cansado ao extremo, o touro era entregue aos "máscaras", que divertiam a platéia, mas não o matava.

Revivendo a sua memória histórica o cuiabano usa ainda a lança da "sorte" dos tempos para manter viva as suas tradições por séculos, sem apagar a influência portuguesa do período colonial. A Cuiabá moderna do presente não conseguiu esquecer a Cuiabá histórica que Portugal construiu para a eternidade, no centro da América do Sul. A Fênix não é apenas uma parte integrante do seu brasão de armas, mas também o emblema de um povo que rompe séculos com seu destino histórico já determinado.

O antigo Largo do Palácio foi o primeiro local onde ocorreu uma Cavalhada em Cuiabá. Ali era um amplo largo que integrava a área urbana da primeira vila criada pela Coroa Portuguesa a Oeste do Tratado de Tordesilhas. A Cavalhada chegou no Século XVIII, antes da Tourada em 1805. Contudo, rompeu os séculos e hoje é um exemplo de tradição mato-grossense. A primeira foi em 20/07/1769, conforme está citado nas "Crônicas do Cuiabá", de Joaquim da Costa Siqueira, na recepção ao capitão-general Luis Pinto de Souza Coutinho (de 03/01/1769 a 13/12/1772). Em três dias de festas, nelas "concorreram pessoas da primeira nobreza da terra", sempre realizadas no final das Festas do Divino. Eram "torneios hípicos que outrora constituíam uma das mais populares festas muito ao sabor do povo em Mato Grosso, notadamente em Poconé e São Luís de Cáceres".

Em Mato Grosso, a Cavalhada tomou forma de representação campal da lendária guerra de Tróia, confundida com as lutas religiosas das Cruzadas caracterizadas pelas guerras de mouros e cristãos". Foi preservada em Poconé, incluindo o baile dos cavaleiros, iluminação, espetáculo pirotécnico e as apresentações de dança dos mascarados, siriri e cururu, e diversas atrações populares. Os cavaleiros e pajens voltaram com suas vestimentas e adereços, vistosos e coloridos, montados em cavalos da melhor qualidade, enfeitados de plumas e fitas, que avançam no prado para travar "lutas", trotando ao repique da "caixa" e ao tilintar dos guisos. Os dois grupos participantes são agora compostos de 12 cavaleiros cada um. Voltamos, através da Cavalhada, a um passado bem próximo que não deve ser esquecido, pois nele há algo de uma memória coletiva com a soma de costumes que valorizam o nosso povo ao longo de quase três séculos de História.

Preservando a cultura portuguesa, no Natal Cuiabano sempre existe a tradição de "correr presépios", incluindo as visitas às residências daqueles que se dedicam, por iniciativa própria, a manter essa manifestação religiosa e cultural. O presépio do "mestre Cassimiro", do Colégio dos Padres (o atual Colégio São Gonçalo), por exemplo, foi o primeiro de Cuiabá a ter eletricidade, antes desta chegar a Mato Grosso. Visitei com minha esposa e meus filhos, na Rua 15 de Novembro, nº 465, no Bairro do Porto, quase em frente à "Vila Isabel", o presépio montado por Deodato de Arruda, com apoio do amigo, e vizinho, José Teixeira. Os dois foram pioneiros no uso das figuras móveis nos presépios. Tudo parecia ter vida através da eletrônica, com o cenário lembrando ambiente ecológico igual ao do Pantanal Mato-grossense, com figurantes, água, aves e animais num grande espaço verde. Sem apoio e estímulo dos poderes públicos, esses presépios estão diminuindo, inclusive no Bairro do Porto.

Para escrever sobre o teatro em Mato Grosso, o pesquisador deve iniciar pelas festividades de 1729, quando foram apresentadas duas comédias, "por ocasião da trasladação da imagem do Bom Jesus, do sítio de Camapuã para Cuiabá", conforme o historiador Carlos Francisco de Moura no livro "O Teatro em Mato Grosso no Século XVIII". Ele acrescenta: "No arraial pioneiro, elevado a vila apenas dois anos antes, já se documentavam representações teatrais, vinte e dois anos antes da instalação da Capitania. Enquanto isso, outras vilas e cidades brasileiras, na época com perto de dois séculos de existência, teriam de esperar ainda muito tempo para possuir vida teatral".

De 1729 a 1796 foram registradas 80 peças em Cuiabá. Ainda com o historiador Carlos Francisco de Moura: "Apesar da pobreza e do isolamento, Cuiabá manteve em pleno sertão a tradição cultural urbana que data de sua fundação. O espírito do Século XVIII marcou a história da cidade. O Conde de Castelnau na quarta década do Século XIX observava que "a cidade de Cuiabá é muito maior e, sob todos os pontos de vista, muito mais adiantada em civilização do que a de Goiás". E explica: "Foram os reinóis de origem citadina que trouxeram para Mato Grosso o teatro. Não foram os brasileiros de outras regiões. Menos ainda os bandeirantes ou sertanistas de São Paulo".

Nenhuma outra Capitania deu tanta importância ao teatro como a de Mato Grosso. No Século XVIII, era comum na Vila Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá assistir comédias, óperas, entremezes (peças curtas, jocosas, burlescas) e até tragédias. O tablado era popular, geralmente numa praça pública, mas democrático, tendo o elenco composto com artistas de todas as origens sociais. As peças vinham de Lisboa, mas em 24/08/1790 foi encenado um entremez de autor local, o capitão Joaquim Lopes Poupino.

De 09/08/1790 a 11//09/1790 os habitantes da Vila Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá assistiram a 14 representações, de ótima qualidade, em comemoração ao aniversário do Ouvidor Diogo de Toledo Lara Ordonhes, considerado o primeiro crítico teatral do Brasil, pois ele seria o autor das "Críticas das Festas", com um “programa de apresentação” dessas peças e citação nominal dos atores de cada uma delas e gênero teatral. Quase todas elas eram do chamado teatro de cordel. Em sua homenagem, conforme nota publicada nas “Chronicas do Cuyabá”, como um apêndice, no volume IV, de 1898-1899 da Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, foram exibidas várias peças teatrais em Cuiabá, durante os meses de agosto e setembro de 1790. No Século XVIII, o teatro teve momentos importantes, começando em 1729, no traslado da imagem do Senhor Bom Jesus. As tradições portuguesas influenciaram a cultura cuiabana, formulando a partir de então a sua própria identidade, tanto culta como vulgar.

VII - HERANÇA PORTUGUESA
Cuiabá manteve a hegemonia política, econômica, administrativa e cultural, sendo elevada à categoria de cidade em 17/09/1818 e depois declarada sede do governo colonial por Alvará de 1820, confirmado pela Lei Provincial n° 19, de 28/08/1835, como Capital da Província. Fundada em 1719, foi também a primeira vila real da região Centro Oeste. Descoberta em 1725, Vila Boa de Goiás, foi a primeira sede do governo goiano. A fundação de Vila Bela da Santíssima Trindade, às margens do Rio Guaporé, em 1752, expandiu a nascente "Linguagem Cuiabana", através de Cáceres e do Pantanal Mato-grossense, indo até Diamantino, na ocupação e povoamento do Norte de Mato Grosso, no período colonial.

O Português Vulgar ou Antigo chegou ao Brasil no período colonial, vindo de Trás-Os-Montes . Por este motivo, essa “Linguagem Cuiabana” rompeu séculos com os fonéticos "dje" e "tche", herdados diretamente dos primeiros momentos da língua, recebendo influências locais. O Português Vulgar permanece nas antigas cidades brasileiras. Em Cuiabá, foi preservado pelo quase isolamento geográfico durante séculos. No interior de São Paulo ainda existe quem pronuncia “dgente”, “djogo”.

A “Linguagem Cuiabana” é uma herança do Português Arcaico (depois Português Vulgar), que apareceu no Norte de Portugal, começando pelo Trasmontano, falado na Província de Trás-os-Montes e na Província Alto Douro, formada pelos Distritos de Vila Real, sua Capital, e Bragança, e pelos Concelhos dos Distritos da Guarda e de Viseu: Vila Nova de Foz Coa, Armamar, São João de Pesqueira, Tabuaço e Lamego, no Norte, onde o Português era fonético, e no Algárvio (do Algarve), no Centro-interior de Portugal.

A palavra “caipira” corresponde a esse Português Vulgar, falado pelas primeiras correntes migratórias chegadas ao Brasil. Além dele, Cuiabá teve forte influência do Português Culto, pois os seus primeiros governantes, no período colonial, eram da Corte, de fidalgos a altos funcionários. Cuiabá foi fundada pelos bandeirantes paulistas, que além do Português Vulgar falavam também o Espanhol e o Tupi-Guarani. E assim a “Linguagem Cuiabana” rompeu séculos usando o expressivo "djê", enquanto os gaúchos mantêm o "tche". O Português Vulgar continua sendo falado em antigas cidades brasileiras, justificando a razão das palavras tidas como "regionais" serem faladas também no Nordeste, no Leste e no Sul do Brasil. No seu quase isolamento geográfico, Cuiabá preservou esses valores lingüísticos com um vigor mais forte, recebendo ricas influências locais.

A “Grammática Histórica da Língua Portuguesa”, elaborada por Pacheco da Silva Júnior, em 1878, foi a primeira sobre o idioma no Brasil. Do confronto gramatical que ocorreu entre Júlio Ribeiro, um dos nomes que figuram nessa “grammática”, e Augusto Freire da Silva, em quatro artigos publicados no jornal “A Província de S. Paulo”, de 27,28 e 31/12/1879 e 06/01/1880, sob o título “Breves Reflexões Sugeridas pela Leitura dos Artigos Sobre Philologia Publicados Pelo Sr. Júlio Ribeiro”, o autor delas reconheceu: “Trinta e duas são, pois, as vozes elementares essenciais da língua portuguesa”. Ele relacionou também oito “vozes livres puras” (vogais – considerando fonemas distintos o “a” de “chá” do “a” de “mesa”), cinco “vozes livres compostas” (vogais nasais) e as 19 “vozes constritas e explosivas” (as consoantes – consideradas fonemas, evidentemente que antes da letra”. As vogais acima citadas eram “a”, “e”, “i”, “o”, “u” e “y”.

O Suplemento do Centenário do jornal “O Estado de S. Paulo”, de 31/01/1976, sob o título “Cem Anos de Língua Portuguesa no Brasil – I”, diz: “Há mais dous sons distintos, banidos hoje do uso da gente culta: “djê” e “tchê”. Os caipiras desta Província pronunciam “dgente”, “djogo”. Os mesmos e também os beirões e transmontanos dizem: “tchapéo”, “tchave”. Frederico Diez pensa que “djê”, “tchê”, são formas primitivas de “jê” , “chê”, e tudo leva a crer que realmente o são”. A palavra caipira seria imprópria nesse caso, pois é o Português Vulgar, falado pelas primeiras correntes migratórias chegadas ao Brasil.

No mesmo suplemento, há um ensaio da professora Edith Pimentel Pinto intitulado “Atos do Drama Ortográfico”, também importante sobre a “Linguagem Cuiabana”. Até o Século XVI, explica a autora, não existia ortografia em Portugal: “O mesmo vocábulo aparecia grafado com variantes, devido a causas diversas, inclusive a falta de sistematização de hábitos gráficos”. Com as “Regras de Ortografia da Língua Portuguesa”, em 1576, Duarte Nunes de Leão foi o primeiro a “moldar a grafia portuguesa à feição da suposta origem dos vocábulos”. Acrescenta, quanto à etimologia, que Castilho “já pugnava pela grafia dita fonética, chegando a propor à Academia das Ciências um sistema de simplificação”, em 1852.

O primeiro passo visando a unidade ortográfica aconteceu em 30/04/1931, quando foi firmado um acordo entre a Academia Brasileira de Letras e a Academia de Ciências de Lisboa, mas longe de ser a sonhada “ortografia nacional”. Sem a parte mais controvertida da reforma portuguesa, no que se refere à acentuação, a Academia Brasileira de Letras lançou em 03/06/1931 o “Formulário Ortográfico”, de Laudelino Freire, que foi adotado nas repartições públicas e escolas de ensino conforme o Decreto nº 20.108, de 15/06/1931.

Em busca de uma solução, a Academia Brasileira de Letras lançou em 12/08/1943 o “Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa”, que foi aprovado pela Academia de Ciências de Lisboa em 19/12/1943. As duas academias divulgaram em 10/08/1945, as conclusões complementares ao Acordo de 1931, visando obter u unificação ortográfica que entraria em vigor com a Lei nº 5.765, em 18/01/1972, simplificando, abolindo-se os seguintes três itens sobre acentuação: a) o “acento circunflexo diferencial”; b) o “acento grave” ou o “circunflexo” dos vocábulos derivados mediante o sufixo mente ou os sufixos iniciados por “z”; e c) o “trema” dos “hiatos átonos”.

Na 56ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em Cuiabá, realizada de 18 a 23/07/2004, a professora Maria Inês Pagliarini Cox, da Universidade Federal de Mato Grosso, referiu-se a um "cuiabanês" que tem o rotacismo do "r", africação, retroflexão do "r", monotongação, desnalização, a redução do ditongo e outros fenômenos regionais. Explicou: “Isto quer dizer que o cuiabano "escuita", diz "vou no mamãe, Ána, bánana, sánta, irmons, um, dos, trex, ropa sujo, cricar no “word”, pranejamento, pobrema, craro, sordado, pão de grutén, petxe, tchuva, djente, odje, tchega". Disse que a diglossia não é exclusividade dos cuiabanos: “Todos nós falamos de um jeito e escrevemos de outro. A escola precisa valorizar o falar espontâneo do cuiabano, pois todos têm o direito de se expressar”.



A “Linguagem Cuiabana” não é um vício de linguagem. Corresponde ao Português do Século XVIII. São cuiabanos ilustres nomes da literatura mato-grossense como os desembargadores José Barnabé de Mesquita e António de Arruda; além dos professores Antônio de Figueiredo Cesário Neto, Filogônio de Paula Corrêa, Nilo Póvoas, Isác Póvoas, Benedito Pedro Dorilêo; os historiadores Corsíndio Monteiro da Silva, Estevão Anastácio Monteiro de Mendonça e Virgílio Corrêa Filho, entre outros, destacando os nomes dos intelectuais Dom Francisco de Aquino Corrêa e o ministro Roberto de Oliveira Campos.

Os bandeirantes paulistas chegaram a Cuiabá, no final do Século XVII, usando a linguagem da época: Tupi-guarani em casa, Espanhol nas ruas e Português nas repartições públicas. Era impossível exigir deles as normas de uma língua, pois o Português estava na fase de organização e os mais letrados preferiam ficar nos centros urbanos. Embora sendo rústico, o bandeirante Pascoal Moreira Cabral, o fundador das minas do Cuiabá, era um homem "de agudo entendimento, sincero, sem maldade alguma, e de extrema caridade", conforme disse Joseph Barboza de Sá, o primeiro cronista a escrever sobre a Capital mato-grossense. Seus valiosos registros estão na “Relação das Povoações do Cuiabá e Mato Groso de Seus Princípios Thé os Prezentes Tempos”.

Em 20/07/1782, Da. Maria I ordenou ao Tribunal do Conselho Ultramarino para os segundos vereadores das vilas portuguesas no mundo escrevessem a “relação cronológica” delas com os “fatos e sucessos mais notáveis”. Para cumprir essas ordens, o segundo vereador Joaquim da Costa Siqueira (o segundo-vereador era o secretário do Senado da Câmara de Cuiabá) ampliou os registros do cronista Joseph Barboza de Sá. De 1782 a 1786, ele enriqueceu o texto anterior e redigiu as suas “Crônicas do Cuiabá”, com as anotações do Dr. Antônio de Toledo Piza, publicadas na “Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo”, Volume IV, 1898-1899, por iniciativa do historiador paulista Antônio de Toledo Piza, com os manuscritos dos herdeiros do tenente-general José Arouche de Toledo Rendou

A missão de Joaquim da Costa Siqueira, encerrada em 1786, foi continuada pelos seus sucessores na secretaria do Senado da Câmara de Cuiabá: capitão Paulo Fernandes Machado, 1787; capitão Joaquim Xavier da Costa Vale, 1788; Joaquim José da Gama, 1789; capitão João José Guimarães, 1790; capitão Joaquim Xavier da Costa Vale, 1791; capitão Paulo Fernandes Machado, 1792; capitão Joaquim Xavier da Costa Vale, 1793; capitão Joaquim da Costa Siqueira, 1794; capitão Antônio Peixoto de Azevedo, 1795; Joaquim Geraldo Tavares, 1796; Domingos Dias da Costa, 1797; capitão Paulo Fernandes Machado, 1798; sargento - mor Antônio da Silva Albuquerque, 1799; Joaquim José da Gama, 1800; capitão João dos Santos Ferreira de Sá, 1801; capitão João Goulart Pereira, 1802; capitão Antônio do Nascimento Barros, 1803; capitão João Goulart Pereira, 1804; capitão José Gomes Monteiro, 1805; Paulo Luís Barata, 1806; capitão João Goulart Pereira, 1807; alferes Manoel Antunes Maciel, 1808.

Não foram identificados os nomes de 1809 a 1812; capitão Apolinário de Oliveira Gago, 1813; também não existem dados relativos a 1814, mas nesse ano foi eleito como segundo-vereador o capitão Antônio de Siqueira e Morais; capitão Manoel Antônio Pires de Miranda, 1815; ajudante Joaquim da Silva Prado, 1816; capitão José do Couto da Encarnação, 1817; terceiro-vereador Salvador Gonçalves da Cruz, pela morte do segundo-vereador, o capitão Antônio Machado de Siqueira, 1818; Manuel José da Silva, 1819; de 1820 a 1825 não há registros e por isto os lançamentos foram feitos depois, por decisão tomada em correição de 1826, sem mencionar o autor; Francisco Manuel Vieira, 1827; vereador sargento – mor Sancho João de Queiroz, 1828; João Fleury de Camargo, 1829; José Joaquim Vaz Guimarães, 1830; José de Souza Neves, 1831.

Diz Joseph Barboza de Sá, o "arraial do Cuyabá" foi fundado "aos oito dias do mez de abril da era de mil setecentos e dezanove annos" no local então conhecido por "ribeiraó do Coxipó, invocação de Nossa Senhora da Penha de França". O primeiro cronista cuiabano acrescenta: "Trataraó logo de fabricar cazas e lavouras de mantimentos pellas margens dos rios Cuyabá e Coxipó; extinguindo huma aldeya de gentio que se achava no lugar chamado hoje Porta do Borralho". A lógica permite admitir que a fundação de Cuiabá ocorreu em Forquilha, devido à "invocação de Nossa Senhora da Penha de França", e não em São Gonçalo.

Os últimos registros feitos por Joseph Barboza de Sá estão reservados às cruéis incursões indígenas: em maio de 1775, os Payagoás invadiram sítios no Rio Paraguai, matando oito "pessoas brancas de um e outro sexo e vinte escravos e cortaraó as cabeças a alguns espetandoas em pontas de paoa outros abriraó e tiraraó as entranhas a outros espedaçaraó espalharaó os quartos pelo campo pozeraó fogos as cazas roubaraó tudo o que poderaó levar comsigo". Tudo sem ponto e virgula ou preocupação com a gramática.

O texto das "Chronicas do Cuyabá" do vereador Joaquim da Costa Siqueira é a continuidade dos registros feitos pelo cronista Joseph Barboza de Sá até 1775, com as notas explicativas do historiador paulista António de Toledo Piza, além das informações sobre as festividades realizadas na Vila Real para homenagear o ouvidor Diogo de Toledo Lara Ordonhes, que chegou a presidir o Senado da Câmara de Cuiabá. Foram encerradas com os registros relativos a 1781.

Felipe José Nogueira Coelho, procurador real no governo do capitão-general Luís d’Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, escreveu as “Memórias Cronológicas da Capitania de Mato Grosso - Relação dos Principais Acontecimentos”. Outras obras importantes são as do coronel Ricardo Franco de Almeida Serra, do Corpo Real de Engenheiros, entre elas: “Extrato da Descrição da Capitania de Mato Grosso”, “Reflexões sobre a Capitania de Mato Grosso”, “Navegação do Tapajós para o Pará”, “Diário da Diligência ao Reconhecimento do Rio Paraguai”, ”Parecer Sobre o Aldeamento dos Uaicurus e Guanás, Com a Descrição dos Seus Usos, Religião,Estabilidade e Costumes” e Descrição Geográfica da Capitania de Mato Grosso”.

O capitão Luiz D’Alincourt, do Real Corpo de Engenheiros, escreveu outros livros: “Memória sobre a Viagem do Porto de Santos à Cidade de Cuiabá”, “Notícias sobre a Parte Meridional da Província de Mato Grosso”, “Estatística da Província de Mato Grosso”, “Reflexões Acerca da Província de Mato Grosso”, “Indagações Estatísticas”, “Resumo das Explorações de Camaquã a Cuiabá” e “Plantas e Levantamentos” (Fortes Bourbon e Coimbra). No período colonial, dois merecem citação: o padre João Antônio Cabral Camello, que enviou ao padre Diogo Soares um relato da viagem que fez, de São Paulo a Cuiabá, em 1727, e que recebeu o título de “Notícias Práticas das Minas do Cuiabá e Goiases”; e José Gonçalves da Fonseca, autor de “Notícia da Situação do Mato Grosso e Cuiabá: Estado de Uma e Outras Minas e Novos Descobrimentos de Ouro e Diamantes”.

No “Ciclo dos Cronistas”, que prosseguiu até ao período imperial, Mato Grosso foi pesquisado pelo cosmógrafo e matemático Francisco José de Lacerda e Almeida, autor do livro “Diário de Viagem do Dr. Francisco José de Lacerda e Almeida Pelas Capitanias do Pará, Rio Negro, Mato Grosso, Cuiabá e São Paulo, nos anos de 1780 a 1790” e “Diários de Viagem de Francisco José de Lacerda e Almeida”; e pelo geógrafo Antônio Pires da Silva Pontes Leme, que escreveu ainda “Diário de Diligência e Reconhecimento das Cabeceiras dos Rios Sararé, Guaporé, Tapajós e Jauru”, “Memórias Físico-Geográficas das Lagoas Gaíva, Uberaba e Mandioré”; “Diário de Viagem no Rio Guaporé”; e “Notícias do Lago Xaraiés”. Eles dois foram homenageados no nome do Município de Pontes e Lacerda.

Alexandre Rodrigues Ferreira foi nome de importância durante o período colonial, tendo explorado o Rio Amazonas e a Capitania de Mato Grosso de 1773 até 1789. Escreveu: “Relação Circunstanciada do Rio Madeira e seu Território”; “Suplemento ao Diário do Rio Madeira”; “Suplemento à Memória dos Rios de Mato Grosso”; “Enfermidades Endêmicas da Capitania de Mato Grosso”; “Memória Sobre as Febres da Capitania de Mato Grosso” e “Catálogo da Verdadeira Posição dos Lugares Abaixo Declarados, Pertencentes às Capitanias do Pará e Mato Grosso”.

O primeiro cronista nascido em Mato Grosso foi o padre José Manoel de Siqueira, que nasceu em 1750 na Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá, onde morreu em 1825. Foi professor régio de Filosofia Racional e Moral da Capitania de Mato Grosso e sócio correspondente da Academia Real de Ciências de Lisboa. Dos seus escritos destaca-se: “Memória Sobre a Decadência das Três Capitanias Mineiras e Sobre o Descobrimento das Minas dos Martírios”. Durante o “Ciclo dos Cronistas", foram escritos os primeiros textos em Português Culto em Cuiabá, mas o padre José Manoel de Siqueira foi o precursor da "Linguagem Cuiabana".

VIII - DA CAPITANIA À PROVÍNCIA
A Capitania de Mato Grosso teve a mais longa e a mais armada fronteira colonial dos portugueses frente aos espanhóis, pois as duas maiores potências marítimas do período colonial mediram forças na América do Sul, no Século XVIII. Em 1825, essa imensa fronteira "de mais de 500 léguas", conforme Luiz D'Alincourt, tinha "princípio na cachoeira de S. António, no Rio Madeira, pela Latitude de 8° 48'; e seguindo por este, e pelos rios Mamoré, Guaporé, Paraguaçu, passa por detrás das serras de Albuquerque e da dos limites, aproximando-se às grandes baías da Uberava e Gaíba; vai à boca da Baía Negra, no Rio Paraguai, e corre depois pelo Rio Apa até às fontes do Rio Iguatemi, pela Latitude de 23° 20', onde finda abrangendo a Vacaria; vindo a formar estes rios a raia entre esta Província e as espanholas do Paraguai, Chiquitos e Moxos". Nas extremidades, estavam o Forte de Coimbra, em Mato Grosso do Sul, e o Forte do Príncipe da Beira, Rondônia, fundados pelo capitão-general Luís d’Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, que governou a Capitania de Mato Grosso de 13/12/1772 a 20/11/1789.

Para entender essa época, dois livros são citados. O primeiro deles é "Relação da Viagem que Fez o Conde de Azambuja da Cidade de São Paulo para a Vila do Cuiabá no Ano de 1759", de autoria do Dom Antônio Rolim de Moura (17/01/1751 – 01/01/1765), primeiro capitão-general da Capitania de Mato Grosso. É um relato "fluvial", pois ele navegou pelos rios já conhecidos dos bandeirantes paulistas. O segundo é "Memória Sobre a Viagem do Porto de Santos à Cidade de Cuiabá", publicado pela primeira vez em 1826, de autoria do sargento-mor de Engenheiros Luiz D'Alincourt, o elo da cultura mato-grossense entre o "Ciclo dos Cronistas" e o "Ciclo das Expedições Científicas". É um relato "'terrestre", sobre o percurso entre Santos e Cuiabá, através de Goiás.

O capitão-general Antônio Rolim de Moura viajou pelos rios Tietê, Pardo, Taquari, Paraguai e Cuiabá e chegou à Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá em 12/01/1751 para instalar a Capitania de Mato Grosso em 17/01/1751. Foi recebido em 11/01/1752, no atual Santo Antônio de Leverger, conforme narrou: "Neste dia já algumas pessoas me vieram encontrar em canoas, e no seguinte todos os ministros e Câmara me conduziram até o porto, onde estavam duas peças de artilharia, que estiveram salvando desde que me avistaram. Ao saltar em terra me salvaram também os Dragões com três descargas de mosquetaria, e a peça com 21 tiros. No porto tinham todos seus cavalos e estava também um preparado para mim por ter distância até à vila de meia légua e me acompanharam todos até à minha porta. Aos principais convidei a cearem comigo. Ali estavam formadas as ordenanças da terra, muito bem fardadas de uniforme, as quais eu mandei retirar, e antes de o fazerem deram três descargas; e no domingo seguinte, dezessete do mês, tomei posse".

O sargento-mor de Engenheiros Luiz D'Alincourt nasceu próximo de Lisboa, em Oeiras, a 17/02/1787. Viveu em Mato Grosso de 1822 a 1830 e morreu em 1841, com 54 anos, no posto de major-de-Engenheiros, no Estado do Espírito Santo. Considerado autoridade sobre usos e costumes de Mato Grosso da sua época, ele descreveu o poderio militar português em "Memória Sobre a Viagem do Porto de Santos à Cidade de Cuiabá", concluída em 16/12/1825, relata a viagem feita em 1818 de Santos até Cuiabá pela Capitania de Goiás. Atravessou o Rio Araguaia, passou pelo Rio Manso e atingiu a Aldeia de Sant'Ana de Chapada, hoje Chapada dos Guimarães, de onde viu o grande Vale do Rio Cuiabá.

Dom Antonio Rolim de Moura usou o então Português Culto ao escrever “Relação da Viagem que Fez o Conde de Azambuja da Cidade de São Paulo para a Vila do Cuiabá no Ano de 1759": "A vinte e dois (novembro de 1750) entrei nos Parrudos (Rio dos Porrudos, hoje Rio São Lourenço), que naquelle lugar se devide em dois braços. Hum que conserva o seu nome, e vai buscar o Paraguay, o qual me ficou a esquerda, e outro, que forma o Archianes, por onde havia sobido; logo mais adiante lança o mesmo rio outro braço, que tãobem me ficou a esquerda, aonde se devide o caminho para Matto Grosso; por cuja razaõ se chama huã praia, que ali há - a Praia dos Abraços - por ser o lugar até onde faraõ os do Cuiabá no ano de 35 ou 36 acompanhar, e despedir-se dos primeiros descobridores, ~q foraõ para o Mato Grosso". Mas no livro "Memória Sobre a Viagem do Porto de Santos à Cidade de Cuiabá", o sargento-mor de Engenheiros Luiz D'Alincourt mostrou um Português Culto mais evoluído.

Conforme as instruções da Rainha Maria Ana, austríaca, esposa de Dom João V, a Dom Antônio Rolim de Moura, em 19/01/1749, a nova Capitania de Mato Grosso confinava com "as Províncias do Peru", sem fixar limites. Foi a maior Capitania do Brasil-Colônia e teve seu território diminuído durante o Império com a Questão do Acre, um longo processo histórico iniciado com os Tratados de Madri e de Santo Ildefonso, agravado no final de 1865 com o povoamento da margem esquerda do Rio Guaporé. Confinando com o Peru e as Capitanias do Pará, de Goiás e de São Paulo, e os governos espanhóis de Assunção, Chiquitos e Moxos, a Capitania de Mato Grosso tinha 22.000 (15.000 somente em Cuiabá) habitantes ao ser criada em 09/05/1748: 12.000 escravos, 5.000 mulheres, 5.000 velhos, jovens e crianças, restando apenas 2.000 em condições de lutar.

O sexto capitão-general Caetano Pinto de Miranda Montenegro (06/11/1796 - 15/08/1795), depois Marquês de Praia Grande, será lembrado na História de Mato Grosso. No seu governo ocorreu o primeiro conflito militar no Forte de Coimbra. O governador do Paraguai, Dom Lázaro de Rivera Espinosa de Los Monteros, queria tomar as terras que eram situadas ao Norte do Rio Apa, mas seria necessário ocupar o Forte de Coimbra, que ao entardecer de 16/01/1801 foi bombardeado por 600 soldados de uma flotilha fortemente armada. Respondendo a uma mensagem agressiva dos invasores, o tenente-coronel Ricardo Franco de Almeida Serra, que comandava o forte, disse que "a desigualdade de forças sempre foi um estímulo que animou os portugueses, por isso mesmo, a não desamparar os seus postos e defendê-los até às duas extremidades: ou de repelir o inimigo, ou de sepultarem-se debaixo das ruínas dos fortes que se lhes confiaram;..." O Forte de Coimbra, defendido por 109, entre eles 60 civis, foi bombardeado por oito dias. No nono dia, sem conseguir vencer essa minoria de heróis, os espanhóis voltaram a Assunção.

Em 1822 as Capitanias foram transformadas em Províncias. Em 1828, a Província Cisplatina deixou o Império Brasileiro para formar a República Oriental do Uruguai. Da Província do Pará separou-se em 1850 a Comarca do Rio Negro, surgindo a Província do Alto - Amazonas. Da Província de São Paulo foi desmembrada em 1853 a Comarca de Curitiba, para constituir a Província do Paraná. O Império Brasileiro estava dividido em 20 Províncias, sendo 16 no litoral e quatro no interior: Amazonas, Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais. As primeiras, em número de três, não tinham limites definidos.

A proclamação da Independência do Brasil encontrou a Capitania de Mato Grosso atravessando grave crise política entre as lideranças de Cuiabá e de Vila Bela. Os desencontros administrativos prejudicavam os interesses das duas únicas cidades da Província de Mato Grosso (a terceira maior população estava na Vila de Nossa Senhora da Conceição do Alto Paraguai Diamantino, atual Cidade de Diamantino). A Capitania de Mato Grosso foi importante para Portugal devido ao confronto de poder com a Espanha, mas a Província de Mato Grosso foi quase ignorada entre os primeiros objetivos do Império do Brasil, pois Dom Pedro I estava preocupado com a Coroa Portuguesa, a que tinha direito, por ser o herdeiro de Dom João VI e pela qual abdicou em 1831.

Com a volta da sede do governo colonial para Cuiabá, Vila Bela entrou em franca decadência. Dom Pedro I nomeou para presidente do governo provisório o cônego Manoel Alves da Cunha, de Poconé, presidente da junta governativa de Cuiabá desde 1822. Ele assumiu perante a Câmara da Cidade de Cuiabá em 17/08/1823. Em 20/04/1824 Dom Pedro I nomeou o tenente-coronel José Saturnino da Costa Pereira para as funções de presidente da Província de Mato Grosso, empossado em 10/09/1825. Ele ficou nesse cargo até 03/05/1828, quando se afastou para tomar posse como o primeiro senador eleito (por via indireta) da Província de Mato Grosso, em 18/08/1828. Foi o segundo senador mato-grossense, substituindo o capitão-general Caetano Pinto Miranda Montenegro, nomeado por Dom Pedro I, e falecido em 11/01/1827.

Quem melhor descreveu os primeiros momentos de Cuiabá após a Independência foi o sargento-mor Luiz D'Alincourt, do Corpo Real de Engenheiros, através de seus registros históricos e estatísticos: “Memória sobre a Viagem do Porto de Santos à Cidade de Cuiabá”, “Notícias sobre a Parte Meridional da Província de Mato Grosso”, “Estatística da Província de Mato Grosso”, “Reflexões Acerca da Província de Mato Grosso”, “Indagações Estatísticas”, “Resumo das Explorações de Camapuã a Cuiabá” e “Plantas e Levantamentos” (Fortes Bourbon e Coimbra).

No "Resumo das Explorações Feitas pelo Engenheiro Luiz D'Alincourt, Desde o Registro de Camapuã, até a Cidade do Cuiabá", ao Sr. João Vieira de Carvalho, o ministro e secretário de Estado dos Negócios da Guerra, datado de 25/07/1825, ele forneceu dados estatísticos que servem para fazer uma avaliação sobre a Capital da jovem Província de Mato Grosso: "A Cidade do Cuiabá, antes Vila Real do Senhor Bom Jesus, está na Latitude 15° 36' e Longitude 32° 23'. As minas do Cuiabá foram descobertas em 1718, fundou-se o arraial em 1723, criou-se a vila em 1727 e cidade em 1818".

Após citar o volume das importações feitas pelos negociantes de Cuiabá e dizer que "a força de legião da Primeira Linha anda em 214 praças, e para o seu completo faltam 274" e que a legião de Segunda Linha chega a 1.506 praças, e a Companhia de Pedestres a 169, ele informa: "Há nesta cidade 30 lojas de fazenda seca e molhada, 120 tavernas, 4 lojas de ofício de seleiro, 12 de carpinteiro, 5 de alfaiate, 9 de sapateiro, 8 de ferreiro e há somente 10 pedreiros".

Os seus registros são importantes: "A população da cidade e Porto Geral consta: homens brancos até 15 anos, 145; de 15 em diante 231; mulheres até 15 anos, 144; de 15 para cima, 260; pardos até 15 anos, 229; e de 15 para cima, 274; mulheres, 230, até 15, e para cima, 580; pretos forros até 15, 74, de 15 para cima 113; mulheres até 15, 107, de 15 para cima, 298; pardos cativos até 15, 53, para cima 34; mulheres menores de 15, 77, maiores 71; pretos cativos menores de 15, 151, maiores, 379; mulheres menores, 118, maiores, 380; total da população 3.918 almas; nos subúrbios junto à cidade, 1.102 almas; esta população ocupa 725 fogos, entrando o Porto Geral".

Em outro resumo, datado de 05/10/1826, ele cita o Bairro do Porto: "O Porto Geral da Cidade do Cuiabá está na margem esquerda do Rio Cuiabá, distante da cidade uma milha, e fica a S.S.O. dela estabelecido há 70 para 80 anos. Junto a este porto acha-se um largo retangular ornado de casas, e vizinho ao barranco, da parte direita, olhando para o rio, um armazém pertencente à fazenda pública, que serve de depósito geral aos víveres, para dali se fornecerem à legião de linha, pedestres, hospital e presídios da fronteira do Paraguai; à testa dele existe um almoxarife, subordinado ao intendente dos armazéns, provedor geral da gente de guerra, e escrivão deputado da junta da fazenda pública".

"Seguindo para a cidade, e a curta distância deste sítio, em terreno algum tanto elevado, está uma capela dedicada a São Gonçalo, e em frente a ela, do lado oposto da estrada, acha-se a Casa da Pólvora. Além do porto, na margem direita do rio, estão algumas casas, e dali segue a estrada para Vila Maria (Cáceres), São Pedro d'El Rei (Poconé) e Mato Grosso (Vila Bela). A passagem do Cuiabá anda arrematada por conta da fazenda pública em 100$000 réis anuais; cada pessoa paga 40 réis, cada carga o mesmo, e por cada animal 100 réis".

Sobre o Rio Cuiabá ele acrescenta: "O rio é abundantíssimo de pescado todo o ano, principalmente no tempo da seca, que fornece peixe de escama, de qualidades diversas, como piraputangas, pacus, dourados, curimbatás, piabussús e outros; e no tempo de águas todo o pescado que aparece é de pele, como palmitos, pintados, que são muito saborosos; bagres, grandes jaúsgeripocas, jurupensens, fidalgos, barbados e outros de bom sabor".

Sobre Cuiabá acrescentou: "O ouro deu motivo à fundação desta Cidade e todo o terreno imediato, e circunvizinho, o forneceu em grande cópia, e do melhor quilate, principalmente o Morro do Rosário de que extraíram em um só mês quatrocentas arrobas, em o Ribeirão da Prainha (hoje coberto pela Avenida Coronel Duarte), que vai correndo para o Rio Cuiabá junto e a Leste da mesma Cidade. As casas são de taipa e térreas, à exceção de seis ou sete moradas, uma das quais é um magnífico edifício para a terra e de gosto mui moderno; a Igreja Matriz da Invocação do Senhor Bom Jesus é regular; há mais quatro templos menores de menores dimensões: o de Nossa Senhora do Bom Despacho, do Rosário, da Boa Morte e o do Senhor dos Passos; tem dois hospitais muito bons: o dos Lázaros, fora da Cidade, e o da Misericórdia ainda imperfeito".

"O Quartel novo para a Legião de Linha acha-se bastantemente adiantado; é um edifício retangular, com uma boa praça dentro e que tem de lados exteriores setenta e cinco braças de comprido e quarenta e uma de largo, com todas as acomodações necessárias para a Legião, guardando ao mesmo tempo a mais exata simetria em todas as suas partes. É nesta cidade que o Excel. Capitão-general faz a sua maior residência e é o assento do Ex. Prelado Bispo de Ptolomaida, da Junta da Fazenda Pública, e do Tribunal de Justiça; tem juiz-de-Fora e professor régio de Latim".

A notícia da criação da Capitania de Mato Grosso (09/05/1748), chegou a Cuiabá em 18/12/1748. A da independência do Brasil (07/09/1822), demorou menos: em 05/01/1823, mas somente em 22/01/1823 Dom Pedro I foi reconhecido pelas autoridades cuiabanas como imperador do Brasil. Esses atrasos ocorriam com freqüência devido à grande distância entre Cuiabá e o Rio de Janeiro, na época sede da Coroa Portuguesa. Das notícias importantes para a vida nacional, a mais rápida foi a da Proclamação da República, em 15/11/1889, que chegou a Cuiabá pelo comandante do paquete "Coxipó", e tornada pública já às duas horas da madrugada de 09/12/1889. A independência do Brasil ocorreu durante a mais grave crise política da Capitania de Mato Grosso. Cuiabá e Vila Bela disputavam acirradamente o comando administrativo. Ambas foram elevadas à categoria de cidade por Dom João VI, pela Carta de Lei de 17/09/1818.

A Câmara da Cidade de Cuiabá, em 22/01/1823, foi a primeira de Mato Grosso a reconhecer a autoridade imperial de Dom Pedro I através de documento em que ela "tem a honra de representar o povo dela, e seu Distrito, povo valente, brioso e leal" através do Deputado de Côrtes, o Tenente-coronel Antônio Navarro de Abreu, "a quem ela escreveu, para por esta Câmara, e em nome do mesmo povo, congratular-se com Vossa Majestade, pela feliz Exaltação com que o Brasil soube premiar os distintos feitos de Vossa Majestade, elevando-o ao eminente Emprego de Seu Imperador, Defensor Perpétuo; tributar os mais puros e sinceros protestos de firme adesão à Causa Sagrada da Independência deste Império (...) e apresentar este Ofício, e as Cópias Autênticas do Edital, e Termo de Vereação Extraordinária a que se procedeu para o fim de ser Vossa Majestade Imperial Aclamado nesta Cidade como Imperador deste vasto e rico Império do Brasil". A íntegra do documento seguiu acompanhado de outro, com a total solidariedade do Governo Provisório e dos comandos militares.

IX - ORIGENS E INFLUÊNCIAS
Oriunda do Português falado na Península Ibérica no Século XVII, preservando as primeiras manifestações cultas da língua, a começar pelo épico "Os Lusíadas", a "Linguagem Cuiabana" tem por base os valores fonéticos do Português Vulgar da época. Do Século XIII ao Século XV, surgiu o Português Arcaico em documentos oficiais. No Século XV, começou o ciclo das conquistas marítimas de Portugal. No Século XVI, são divulgadas as primeiras obras sobre a organização da língua, com gramáticas e dicionários; No Século XVII, consolida-se o Português Europeu com inovações nos dialetos do centro e do Sul de Portugal e no Alentejo.

Esse é o Português Europeu que chegou a Cuiabá com os bandeirantes paulistas. O professor Franklin Cassiano da Silva, de Cuiabá, foi o primeiro a escrever sobre a "Linguagem Cuiabana": "Subsídios Para o Estudo da Dialectologia em Mato Grosso", artigo publicado em 1921, e em 1930 na "Revista do Centro Mato-grossense de Letras" (Academia Mato-grossense de Letras). Antenor Nascentes, reconhecido filólogo, casou-se com uma cuiabana de tradicional família e visitava a Capital mato-grossense com freqüência. Pesquisou as variações lingüísticas do Português usado no litoral brasileiro e identificou em Cuiabá valores do Português antigo. A História Lingüística do Brasil surgiu no Século XX com “O Linguajar Carioca” e “O Dialeto Caipira”, dele e do filólogo Amadeu Amaral. Em 1988 (ele faleceu em 1972), a Academia Brasileira de Letras publicou o seu "Dicionário da Língua Portuguesa".

O professor Franklin Cassiano da Silva, por excesso de zelo, enganou-se ao tratar a “Linguagem Cuiabana” como um "vício de linguagem", mas foi ele o primeiro a dizer que o Português do Século XVII estava preservado em Cuiabá. O seu artigo "Subsídios para o Estudo de Dialectologia em Mato Grosso" inicia lembrando que o "Século XVII foi para o Brasil o que Século XVI foi para Portugal". "O Português trazido para o Brasil no Século XVI, na época em que a língua começava a submeter-se à disciplina gramatical, era ainda dúctil (flexível) e não podia resistir a tantos embates por que passara na América portuguesa".

Ele prossegue explicando: "Na época do descobrimento de Mato Grosso já havia, pois, a língua portuguesa sofrido alguma diferenciação dialetal e o seu léxico havia se enriquecido de novos termos que recebera das línguas aborígines". (...) “Essa pronúncia tão comum entre os mato-grossenses, existe ainda hoje em Portugal, - naturalmente, os colonos portugueses a trouxeram para o Brasil”. Lembra que no dialeto do Minho deixam de molhar o grupo lh em lhe, - tal como em Portugal e mesmo em todo o Brasil - Já le disse. Em corresponde a eim nasal: ningueim, teim, beim, etc". Continua: "No vocabulário de palavras e modos de falar do Minho e Beira, de Raphael Bluteau, encontra-se o vocábulo dávida (dádiva). Ditongam a terminação io em tio (tiu), rio (riu), como em São Paulo. O ditongo ei é pronunciado ê - bichêra, companhêro. Deixam de pronunciar a consoante d nos particípios presentes dos verbos: ino (indo), saíno (saindo), cantano (cantando), etc". "O l muda-se em r também em arma (alma), arto (alto), ardêa (aldeia)".

Cita a permuta do b por v, lembra o que acontece na primeira pessoa do plural do indicativo do verbo ir (bamo) e no vocábulo verruga (berruga): "As sílabas nasais áfonas finais são elididas (eliminadas) - cantaro (cantaram), viéro (vieram), Estevo (Estevam), etc". E explicou: "Com as relações que se estabeleceram depois entre colonos e os aborígines, foram aqueles aceitando os termos indígenas que se tornavam necessários para a designação de novos objetos e grande número de termos em Tupi-guarani que vieram enriquecer o léxico brasileiro, sendo que muitos desses vocábulos foram fazer parte do léxico português”.

Permanecem em Mato Grosso palavras portuguesas do Século XVII, destacando-se agardecê (agradecer), alugué (aluguel), anteado (enteado), câmera (câmara), ametade (metade), madurecê (amadurecer), animá (animal), com sua "pronúncia quinhentista”. Contudo, ressalva: "Seja dito uma vez por todas que os modismos de dizer estudados neste pequeno trabalho, com exceção de um ou outro que se encontram entre gente culta, são encontrados nos dizeres da plebe".

Sempre de acordo com o professor Franklin Cassiano da Silva: "O grupo ch e x (com o valor de ch); pronunciam tch - Coxipó (Cotchipó), Encheu (Entcheu) - Peixe (Peitche) - Faixa (Fatxa). Essa pronúncia é usada ainda pelos caipiras de São Paulo e foi transplantada para nosso Estado pelos bandeirantes que conservavam ainda os modos de pronúncia arcaicos dos primitivos colonos portugueses". (...) “A palatal gê tem o valor de dgê: gente (dgente), jogo (djogo), caju (cadju), etc"... Depois de afastar a possibilidade da influência italiana, conclui: "Seria natural que colonos portugueses pronunciando tachapéo, catchorro, pronunciassem também dgente, dejogo, etc".

Se os cuiabanos mantiveram os “erros” do Português falado no Século XVII, com a permuta do l em r no grupo pl (pranta por planta, prano por plano, etc.), ou da pronúncia reduzida de córrego (córgo), chícara (chicra), cósca (cócega), também respeitaram a "lei fonética que regulava a transformação do grupo ni seguido de vogal em nh na passagem do Latim" e destaca os livramentenses com o exemplo: Tónho, Tónha, por António, Antónia, nomes preservados em Cuiabá com a grafia portuguesa: António, Antónia. O desembargador António de Arruda assinava assim, sem o circunflexo. Em Mato Grosso "raramente se observa, e isto só entre pessoas de mediana cultura", a "falsa concordância dos verbos fazer e dar", pois "o povo geralmente diz: “Faz dois anos”, “Deu duas horas".

Finalizou sua pesquisa dizendo: "O Estado de Mato Grosso, separado dos seus irmãos do país, devido à dificuldade de comunicação, tem conservado como se vê, mais que qualquer outro Estado do Brasil, alguns com modificações, outros sem elas, os mesmos modismos de dizer que recebera dos seus colonizadores". O interessante é que na “Linguagem Cuiabana” existe a cuidadosa preservação dos valores lingüísticos do período colonial, com os acréscimos vindos do índio e do negro, enriquecendo ainda mais a memória cultural mato-grossense.

Seguindo os passos do professor Franklin Cassiano da Silva, o desembargador António de Arruda também pesquisou a "Linguagem Cuiabana", e identificou as particularidades originadas na Língua Portuguesa, desde "Os Lusíadas". Tratou do assunto inicialmente no álbum "Terra e Gente", publicado por Fernando Leite de Figueiredo. Anos depois escreveu o artigo "A Propósito de Formidável", publicado no número de novembro de 1952 do mensário cultural cuiabano "Ganga". Voltou em 1970 com uma conferência intitulada "Cuiabá e a Integração Nacional", dando continuidade à palestra pronunciada no Clube de Engenharia, no Rio de Janeiro, no "Ciclo de Estudos Amazônicos", promovido pelo general Frederico Rondon.

Em "O Linguajar Cuiabano e Outros Escritos" pretendia reunir tudo o que já havia escrito a respeito, mas decidiu, em maio de 1998, pouco antes de vir para Cuiabá, onde o livro foi publicado, incluir outros temas. A sua extraordinária capacidade de escrever transformou um simples diálogo familiar em obra prima. Um dos autores mato-grossenses de maior e melhor produção, foi incansável e brilhante em tudo que escrevia, mas em "O Linguajar Cuiabano e Outros Escritos" até parece que buscava a perfeição suprema, pois ele sempre conseguiu escrever com perfeição.

Numa manhã, quando fazia os últimos retoques do livro, perguntou pelo glossário cuiabano que eu estava anotando há anos. Decidiu publicar apenas as palavras tipicamente cuiabanas, não citadas em dicionário. Solicitou, então, o "Dicionário da Língua Portuguesa", de Antenor Nascentes, e passou a eliminar todas as palavras não usadas pela "Linguagem Cuiabana", que ele conhecia desde criança, ainda no Bairro do Porto onde nasceu.

Insisti com "digoreste", uma palavra recente e em uso, mas ignorou dizendo que ela não existia antes da sua ida para o Rio de Janeiro. Mais tarde, esclarecido sobre a antecipação do “é” ou “foi”, mudou de idéia. “Digoreste” não era aplicada corretamente, uma vez que corresponde a alguém que é certeiro ao atingir o alvo. Após as explicações, aprovou "digoreste", partindo do princípio de que as línguas vivas incorporam sempre novos vocábulos, porém "O Linguajar Cuiabano e Outros Escritos" já estava impresso.

Nesse livro, o desembargador António de Arruda explica que o “falar cuiabano" era generalizado e depois restrito praticamente à zona rural. Na área urbana ficou no “âmbito de pessoas menos cultas". Citou alguns exemplos, como o verbo "assistir" com o sentido de morar, "fortuna" com o significado de sorte e não de riqueza; a expressão "a reio" como sinônima de "a fio", e outros, que caíram em desuso no país mas permaneceram em Cuiabá e seus arredores, “dado o relativo isolamento em que esta região se manteve por mais de dois séculos".

Diversos termos freqüentes no falar cuiabano foram perpetuados pela transmissão oral e que só raramente são empregados em outras regiões. Como exemplo citou de asssuntar (observar), molóide (fraco), ladino (esperto), encasquetar (ter idéia fixa), perrengue (molóide). Prossegue dizendo: "Outro fenômeno interessante é a persistência em Cuiabá de formas intermediárias, de uso popular, que se tornaram arcaicas com a evolução semântica das palavras. Assim, ainda se ouvem entre nós falares como: alumear (diz-se alumeio, à semelhança do antigo adágio: "O ignorante, como a candeia, a si se queima e aos outros alumeia"); dereito, despois, fruito, luma (lua), etc".

Mostrou as semelhanças entre os falares de Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais, pois o mineiro ainda usa o verbo "assistir" como morar temporariamente. Maior identidade é em relação a Goiás, que sofreu o mesmo isolamento geográfico de Mato Grosso. Citou trechos do livro "Dos Becos de Goiás e Estórias", de Cora Coralina, com "termos característicos do falar cuiabano": "Eu era triste, nervosa e feia, /Amarela, de rosto empalamado, / De pernas moles, caindo à toa....".

Em "Vintém de Cobre", ela "usa dois outros termos também encontradiços em Cuiabá, pelo menos na Cuiabá de outrora: mandrião e timão": "Eu vestia um antigo mandrião / De uma saia velha de minha bisavó, / Eu vestia um timão feio / De pedaços de resto de baeta". No mesmo livro existem palavras tipicamente cuiabanas como badulaques, mulher-dama e de apé.

Mencionou corruptelas usadas em Cuiabá, "cuja origem se perde nas brumas do passado" e destacou: “Duvidá: talvez. Emprega-se em frases como: "Será que ele vem hoje?" - "Duvidá". Suponho que esse duvidá seja uma redução da frase: "Se duvidarem...". Intá! (interjeição): Toma! Qual a formação do termo? Derivaria de "aí está"? ou de "ainda está"? Murciço: maciço (ouro murciço). Sistrodia: por "esse outro dia". Saltaveaco: espécie de banana da terra, enorme. Segundo a explicação que se costuma apresentar, a palavra é corruptela de farta velhaco. Quer dizer: a banana é tão grande que o velhaco que a furta pode fartar-se dela".

O Rio Paraguai aproximou os vínculos culturais de Mato Grosso com o Paraguai e a Bolívia. O desembargador António de Arruda disse a propósito: "O confrade Lenine C. Póvoas, em seu ensaio "Influência do Rio da Prata em Mato Grosso" enumera alguns termos usados em Cuiabá aos quais atribui proveniência do espanhol platino. Exemplo curioso citado por ele é o da palavra mano (mão na bola) usada no futebol. É’ que esse jogo, em Mato Grosso, teve inicialmente, como técnicos e jogadores, chilenos, paraguaios, argentinos e uruguaios, e daí a origem do mano. Em carta que escrevi ao Lenine, lembrei-lhe dois termos de largo uso entre nós, também provenientes do espanhol: alambrado (cerca de arame) e a interjeição caramba!".

Em "O Linguajar Cuiabano e Outros Escritos", ele cita um fato interessante: "Nasci e me criei no Porto, na outra margem do Rio Cuiabá, no meio de gente humilde, sobretudo de lavradores que comerciavam com meu pai. Não é de admirar, pois, que o meu Cuiabanês fosse, como era, dos mais carregados”. “Ora, a conselho da Professora Marina Brandão, amiga de nossa família, deixei o Colégio Salesiano e fui matriculado no terceiro ano primário da então Escola Modelo, no antigo Palácio da Instrução - portanto, no coração da "Cidade". Ali, entre os garotos, em sua maioria citadinos, minha fala devia causar estranheza. Lembro-me do dia em que, contando a dois colegas uma pescaria de piraputangas, um deles perguntou-me: - E você pegou muitas? - Disparate!. Esse disparate foi enunciado com ênfase, para significar a abundância do pescado. Mas notei uma troca de sorrisos entre os dois, e um deles, que era muito meu amigo, me aconselhou depois que não dissesse mais disparate. "É feio", disse ele".

Quanto à pronúncia do "tch" (cotchipó) e do "dj" ("dgelo, djóia"), ele acrescentou: "Ao que me parece, tais pronúncias, tanto no caso do "ch" e do "x", como no "g" e "j", foram trazidos pelos portugueses e bandeirantes, que as empregavam à maneira então vigente, à semelhança do que aconteceu com o Cuiabanês como um todo, ou seja, aquelas pronúncias, como este, permaneceram em nossa cidade, caindo no esquecimento em outras partes. Com efeito, observa o Professor Antenor Nascentes, em sua "Gramática da Língua Espanhola", que o "ch" espanhol se pronuncia como "ch" inglês da palavra child, o que ocorre em pontos de São Paulo, assim como em Trás-Os-Montes, no Entre-Douro e Minho e parte da Beira”.

“De fato, a alguns conterrâneos tem acontecido, quando em viagem pelo interior de Portugal, ouvirem com surpresa essa mesma pronúncia e a do nosso "g" (dj). Ora, se tais sons se conservaram em lugares de Portugal e de São Paulo (principalmente naqueles de onde vieram os Bandeirantes), o mesmo deve ter ocorrido em Cuiabá, onde, além disso, a imigração portuguesa foi intensa nos primeiros tempos de sua formação. Por ser considerado "feio", o "Cuiabanês estava condenado".

Prossegue: "Expostos assim ao deboche, com o nosso Cuiabanês, não tivemos ânimo para resistir. Ficamos realmente convencidos de que o nosso linguajar era feio. Adaptamo-nos a outros falares. Não nos ocorreu que não podia ser feia uma pronúncia que se conserva até hoje no espanhol e no inglês. Ademais, deixamos de seguir os nordestinos, por exemplo, que mantêm sua pronúncia típica, especialmente a abertura do "e" e do "o" pretônicos: Recife (ré), progresso (pró)”. “Não pensem que eles foram poupados ao ridículo, que não foram".

"Pretendemos ser requintados e só conseguimos ser desastrosos: destruímos os nossos mais caros valores. Reparem que estou empregando a primeira pessoa do plural, pois me julgo também culpado - culpado quando nada pela omissão e pelo silêncio. Oxalá que desses destroços possamos salvar ao menos o Cuiabanês, hoje reduzido a alguns núcleos dispersos, principalmente fora dos limites urbanos. Oxalá possam os jovens continuar o movimento que já iniciaram e restaurar a linguagem quase perdida de nossos maiores".

As suas anotações sobre o falar cuiabano foram publicadas no jornal "O Estado de Mato Grosso" em 1985. As correspondências que lhe enviaram amigos e leitores foram assim comentadas: "Tais observações são válidas e não implicam em discordância para com o meu trabalho. Pois, para mim, conforme deixei claro, o Cuiabanês não desapareceu de todo, mas deslocou-se principalmente para as áreas rurais, enquanto na cidade permaneceu residualmente, cultivado sobretudo pelas pessoas mais idosas. Com essas ponderações, concordo que o cuiabanês ainda existe, mesmo porque podemos surpreendê-lo às vezes em toda a sua pureza".

Em "Cuiabá e a Integração Nacional", ele escreveu: "O cuiabano adquiriu, com predominância, aqueles traços que, para o brasileiro, foram devidos, especialmente, ao isolamento e às grandes distâncias. A falta de comunicações gera no homem a convicção de que deve contar consigo mesmo, que o cuiabano sempre cultivou, com suas manifestações mais expressivas de coragem e bravura. É essa também a origem do coronelismo, que ali predominou por muito tempo, de que ainda restam vestígios".

A proximidade geográfica e os laços familiares garantiram a presença dos países platinos nos costumes dos cuiabanos. Em 1982, o historiador Lenine de Campos Póvoas disse no seu livro "Influências do Rio da Prata em Mato Grosso": "Logo que cessa o conflito armado com a República do Paraguai e que se restabelece a franca navegação fluvial desde os portos do Prata até a Capital da Província de Mato Grosso, Cuiabá, entra num ritmo ascendente de progresso. E, por isso mesmo, se torna, cada vez mais, uma cidade dependente dessa navegação. As ligações eram muito mais fáceis com Assunção, Buenos Aires e Montevidéu do que com o Rio de Janeiro, que era a "Corte". Mais adiante: "Algumas famílias mandavam seus filhos para serem educados em Montevidéu ou Buenos Aires". Alguns deles se radicaram por lá.

Essas “influências” enriqueceram os hábitos mato-grossenses: a) as cadeiras nas calçadas após o jantar (de Buenos Aires), o uso do charuto (comum no Paraguai), a sésta após o almoço (igual à tradicional siesta paraguaia), o truco espanhol ainda jogado em Cuiabá, Várzea Grande e Leverger, que procede dos países platinos, igual a bocha (italiana). Os gaúchos chegaram a Mato Grosso no final do Século XX e encontraram o uso do chimarrão, vindo pelo Paraguai, a exemplo da sangria, uma mistura de vinho, água e limão. Até o nosso "bonde de burros" acompanhou um costume observado nos países platinos.

Na “Linguagem Cuiabana” existem várias palavras espanholas: chacra, (chácara), changador (pessoa que fazia serviços de carga e descarga das embarcações), chalana (pequena embarcação de madeira), liviano (referindo-se a coisa leve, de pouco peso), vianda (marmita, vasilha usada para por comida), guarapa (caldo de cana), barrer (varrer), verdularia (verduraria, onde se vende verduras), verdulero (verdureiro), na mano (mão na bola, no futebol), saladero (local onde se faz charque), cambiar (mudar), pregunta (pergunta), e assim por diante. No futebol, o historiador Lenine de Campos Póvoas lembrou o grito de guerra das torcidas cuiabanas: "A-le-guá! A-le-guá! Hurra! Hurra!. Descobriu depois que era corruptela do espanhol "A-le-gole! A-le-gole! Hurra! Hurra!", para incentivar o time preferido a atacar e marcar o gol.

A arquitetura colonial cuiabana, com casas semelhantes às do Minho ou de Trás-os-Montes, no Norte de Portugal, recebeu a influência platina. Sobre isto, disse o historiador Lenine Campos Póvoas: "O elemento "platibanda", principalmente, se impõe, nas fachadas, em substituição aos beirais portugueses. As fachadas, decoradas, com colunas terminando em capitéis, aparecem nas construções de maior luxo, seja nas obras públicas, seja nos palacetes de residências familiares".

X – UMA EXPRESSÃO REGIONAL

O professor Manoel Mourivaldo Santiago Almeida, de Letras, da Universidade de São Paulo, também reconheceu a origem da “Linguagem Cuiabana” no Português do Século XVII e a influência do falar dos Bandeirantes que estiveram em Cuiabá naquele período, bem como do negro e do índio. Ele e a professora Maria Inês Pagliarini Cox organizaram em 2005 a edição do livro "Vozes Cuiabanas: Estudos Lingüísticos em Mato Grosso", que publicou pesquisas dos professores Ulisdete Rodrigues de Souza, Rachel do Valle Dettoni, Vanderci de Andrade Aguilera, Maria Luiza Canavarros Palma, Lúcia Helena Vendrusculo Passari e Ana Antônia de Assis Peterson.

Sobre a herança indígena o professor Manoel Mourivaldo Santiago Almeida disse: "O que nos conta a história social é que mesmo depois da proibição do uso da língua geral pelo reino, em 1757, por força da política levada a cabo pelo Marquês de Pombal em favor do uso obrigatório da língua portuguesa, durante todo o Século XVIII os brasilíndios ou mamelucos paulistas falavam duas vezes mais a dita língua geral do que o português”. Adiante: “A língua geral era a língua caseira, instrumento de comunicação do cotidiano. O certo é que, pelo menos do ponto de vista de Melo (1971, p. 137-138), dentre outros, o português foi ganhando terreno a medida em que a população que usava a língua geral foi, até por questão de sobrevivência, adotando no dia-a-dia a língua lusitana”.

Nesse livro, a professora Ulisdete Rodrigues de Souza destacou importância do negro na época da Capitania: "Muitas das monções que chegavam a Mato Grosso eram constituídas de "escravos já aclimatados em sítios litorâneos, ou alguns recém-chegados da África" (Corrêa Filho, 1994, p.105). Eles vinham para trabalhar principalmente nas minas e também nas primeiras plantações de cana-de-açúcar". Acrescentou: "No entanto, a princípio, a atividade açucareira foi proibida, por se considerar que a aguardente, que também se extraía da cana, era maléfica, "a verdadeira perdição dos negros". Em 1727, quando foi elevada a Vila Real do Senhor do Bom Jesus do Cuiabá, a Capital mato-grossense tinha 2.600 negros e índios trabalhando na mineração de ouro.

A professora Maria Francelina Ibrahim Drummond com o seu "Do Falar Cuiabano", publicado em 1978 no número 5 dos "Cadernos Cuiabanos", revelou-se uma das melhores pesquisadoras da "Linguagem Cuiabana". Ela fez um valioso inventário do que identificou como uma linguagem popular: "Chamou-nos atenção, à primeira vista, um conjunto sonoro muito grande, e, pouco a pouco, fomos sentindo os traços curiosos e peculiares em que se revelava a linguagem popular de Cuiabá". Esses traços sobreviveram, segundo ela, porque existem "hábitos antigos que se conservam, tradições que não desapareceram e evidenciam força muito grande".

Seus estudos foram concentrados nas localidades de Guarita, em Várzea Grande, e São Gonçalo, em Cuiabá, onde procurou ouvir todos aqueles que tivessem faixa etária "acima de quarenta anos, pessoas nascidas, criadas e residentes aqui, que desenvolvem atividades relacionadas ao modo de viver cuiabano”. Foi identificada uma "linguagem poética" nos termos também encontrados "em outras áreas da cidade (Coxipó, Porto, São João dos Lázaros, Pico do Amor e Praieiro)". Ela aconselhou: "Que este trabalho possa ser, senão um reencontro dos cuiabanos com seu modo de falar completo, mas um incentivo a que seja feito e continuado o que propusemos. Rápido. Antes que se desmanche a sonoridade do poema que este povo fala".

Na Fonética do Falar Cuiabano a professora Maria Francelina Ibrahim Drummond encontrou palavras ainda hoje em faladas pelos mineiros, goianos e nordestinos, todos contemporâneos dos cuiabanos no período colonial:

VOGAIS: a. Tônicas. Letra A: - Desnasalização em final, como em "irmã - irmá"; mas seguido de nasal, se abre, como em "lancha - láncha"; Letra E: Final fechada tônica se abre, como em "banguê - bangué. Com nasal: Letras A, E, O: ficam abertas, como em "conheço - conhéço" e "fome - fóme". b. Átonas. 1. Ocorre freqüentemente a aférese do A,como em "anoitecer- noitecer". 2. Letra E: Protônico com final em R passa a I, caindo o R, como em "senhor - sinhô". 3. Letras E, O: Finais se pronunciam Ê e Ô, como em "de - dÊ" e "carro - carrÔ". 4. Letras A, I, U, mantêm-se a vogal média e as extremas.

DITONGOS: a) o IO se transforma em IU, como em "rio - riu"; b) o EU final aberto se fecha, como em "chapéu - chapêo"; c) o OU final fica reduzido a Ô, como em "estou - estô"; d) o ÃE final vira AI, como em "mamãe - mamai"; e) o AI interior passa para EI, como em "raiva - reiva", mas a letra L desaparece diante do X, como em "caixão - caxão"; f) as palavras com EI, AI e OI seguidas de sibilante ficam reduzidas, como em "seis - sês", "demais - demás" e "depois - depôs"; g) o EI interno, antes de palatal ou R, passa a Ê, como em "queijo - quejo", "cativeiro - cativêro"; h) o ÃO final passa a ON, como em "coração - coraçon".

CONSOANTES: a) as prevocálicas são mantidas; as pós-vocálicas desaparecem como em "rebuçar - rebuçá"; b) o B torna-se V como em "piaba - piava"; c) o J é pronunciado DJ como em "caju - cadju"; d) o S inicial passa a CH, como em "Sá Mariana - Chá Mariana"; e) o Z vira G, como em "várzea - várgea"; f) o L no final das palavras vira U quando ao lado do E ou do I, como em "papel - papéu", ou "sutil - sutiu", ou desaparece depois de A, como "saranzal - saranzá"; o LH passa I, como "mulher - muié"; g) O X e CH são pronunciados TCH, como "peixe - petche", e em "chuva - tchuva".

Ainda na Fonética registrou: a) no gerúndio, desaparece o D da terminação, como em "falando - falano"; b) troca-se o O pelo U em vocábulos como em "foge - fuge"; e OU em U, como em "ouve - uve"; c) BL passa a BR, como em "neblina - nebrina"; d)PL passa a PR, como em "plano - prano"; e) o vocábulo ASSIM vira ANSI (nasaliza-se o A inicial e desnasaliza-se o I final); f) freqüentemente se deslocam sílabas tônicas de paroxítonas terminadas em AO e de proparoxítonas, como em "bênção - benção"; g) o grupo PR seguido de O passa a POR, como em "proíbe - poribe"; h) OI passa a ORI, como em "depoimento - deporimento"; i) a preposição PARA passa a PRA e/ou se aglutina com os artigos, como em "para - prá"; j) o pronome VOCÊ fica sincopado em OCÊ, como em "para você - procê"; e l) POR passa a PRO, como "Dei ocê pro morto".

Sobre a Morfologia e a Sintaxe, a professora Maria Francelina Ibrahim Drummond fez as seguintes anotações:

SUBSTANTIVOS: a) mudança de gênero no pronome e/ou artigo seguinte ao nome: "Mora num casa desses"; b) flexão do grau para o aumentativo com o sufixo AINA: "comezaina", ou com o sufixo ADA: "peixada"; c) flexão do grau para diminutivo com sufixo OTE: "gurizote"; ou INHA: "dorinha - dorzinha"; d) entonação da voz na sílaba tônica do vocábulo para flexionar o aumentativo, alongando, como em "Mora loonge daqui", e o diminutivo, reduzindo, como em "Tem um guri piquinininho".

ADJETIVOS: a) normalmente, a adjetivação é escassa; b) os adjetivos não têm gênero feminino, seja para o homem ou para a mulher, como em "A porta tá aberto"; c) o superlativo é formado com a expressão DEMAIS DE antes do adjetivo, como em "Tá demais de bom"; d) o superlativo é reforçado por outro adjetivo, como em "Põe chico-magro prá ferver com o caldo e ele fica alvo de branco"; e) ou com o uso da expressão DE UMA VEZ, como em "Ficou doido de uma vez" (doidíssimo).

PRONOMES: a) pronomes pessoais de terceira pessoa no masculino para homens ou mulheres, como em "Ele vai agorinha" (referindo-se a uma menina), ou "A criançada tá sem domínio. Ninguém pode com ele", ou "Ele chama Isabel"; b) pronomes demonstrativos prevalecem no gênero masculino, como em "Esse é bravo", (referindo-se a uma mulher), ou em "Mas a vida é esse mesmo"; c) pronomes possessivos após o substantivo unicamente no masculino, como em "Era uma prima meu"; d) pronomes indefinidos substituídos pelas expressões QUE SÓ, QUE TAVA, QUE ERA, como em "Tinha mato que só", "Festa bonita. Festa que tava" e "Bicho que era. Nunca num vi tanto"; e) pronome de tratamento sempre no masculino, como em "Sinhô tá bom?", cumprimentando uma mulher.

VERBOS SER, IR, POR E ESTAR: uso da terceira pessoa como primeira pessoa do singular no pretérito perfeito indicativo, como em "Eu foi pescador a vida inteira" (ser), "Eu foi pro hospital primeira vez" (ir), "Eu pôs os cestos de lado e fui ver" (pôr) e "Eu esteve lá" (estar).

NEGATIVAS DUPLAS, como em "Eu nem num sei quanto que é".

"ESSE MUNDO" POR "DEMAIS": como em "Lá é longe esse mundo".

VERBO VIR: No imperativo afirmativo prevalecem as terceiras pessoas do singular e do plural, como em "Venham, crianças" e "Venha, guri".

MUDANÇA DE CLASSES DE PALAVRAS: a) pronome indefinido tudo passa a substantivo, como em "Já fiz de um tudo"; b) artigo indefinido passa a substantivo, como em "Só tenho um filho. Só este um"; c)adjetivo passa a advérbio, uma exclusividade de "duro", como em "Bate duro" e "Desceu o rio, piloteando duro"; d) advérbio "demais", seguido da preposição "de" vira adjetivo, como em "Vinha demais de povo".

ALTERAÇÃO DE REGÊNCIAS DE VERBOS E NOMES, PARA DAR MAIOR ÊNFASE: a) chegar, com preposição "de", em vez do artigo definido "a", como em "Ele chegou de fazer assim"; b) pelejar, como transitivo direto, significa trabalhar no dia a dia, como em "A gente continua aí, pelejando a vida"; c) lutar, com a preposição "contra", substitui "trabalhar com", como em "Eu luto contra o gado", sendo usado, nesse sentido, com a preposição "com", como no caso de "Minha vida foi lutar com peixe, comprar e vender peixe"; d) perguntar, com a preposição "de", no sentido de "informar", como em ""Perguntei de sua casa prá ele. Num sabia"; e) telefonar em, no lugar de "telefonar para", como em "Fui em Várzea Grande telefonar em casa do doutor...."; f) fornecer, com a preposição "de", regendo o termo que seria objeto direto, como em "Naquela época, a gente fornecia ele de leite"; g) emprestar, usado como transitivo direto, mas o objetivo indireto está implícito no sujeito, como em "Fulano, eu emprestei sua mala".

Na linguagem popular dos cuiabanos encontrou uma música do falar, lembrando um momento da pesquisa que ela presenciou: "Margeando o rio, uma população fala a linguagem da forma. De tantas gerações passadas, o hábito se perde no fazer louça, lutar com barro, lutar com tauá e dar colorações às formas, queimar catipé, reforçar a argamassa, modelar e remodelar. Depois, a luta com forno e a queima".

"Não sabem contar como é. Vem da avó, de antes da avó - as louças antigas eram demais de bonitas! - da mãe, da tia. As criançadas de hoje vão percebendo o veio tão forte. Muitas entendem que é preciso continuar a cantiga sem letra que a força do rio não se esgotou, que há carradas de barro para as mãos, e é tempo de modelar a trama de argila e cores. Outras, que outro apelo se faz, que é outra a hora, há remos de espero e peixe demais. Ah! A tessitura das redes! Ah! Que diverso é o fio que faz a história"!

E inspirada pela beleza natural do cenário cuiabano prossegue, como se estivesse a cantar com a alma de povo cuiabano, que aprendeu a viver só: "Catipé, atuá, saraguá. Ajuntam-se potes, jarros, pratos; a imaginação acode pronta e encontra jeito. Pombas, panelas, travessas: treliças... Margeando o rio, convive uma população que fala a linguagem do rio. Jacás brancos de Sol; sombreando, sarã; rede, canoa, pacu. Subiu uma lufada. Demais de peixe, ê ah. O rio deu praia, ô guri". Sai do leito rico do rio e vai para a terra fértil: "Mangueiras, caju: formas".

Prossegue o cantar espiritual: "Antes tinha o boi a serra, dava medo que é! Uma vez, ergueu a palha, saiu criançada gritando, rasgou meu vestido. Perdi. Hoje tá escasseando. Fiz dois “Senhor Jesus”, uma beleza que só. Foi lá prá Corumbá. A gente ajunta cacho de aguaçu, uma zinga perto do forno, prá que más? Tem viola, dona, que toca zoada bonita nos cururu e siriri, muita moçada nem num sabe mais. Queimei louça demais, hoje tô fraco, nem num faço mais. Nas águas, o rio sobe. Num turvando, dá peixe que só! Peguei um pintado prá mais de trinta quilo, vieram buscar. "Prá que falar mais? Fala um povo inteiro junto do rio; busca do rio sua fala, amassa e (arg) amassa no rio sua fala. Queria que tivesse luz, uma estrada. O quá? O guri matou um curimba, fez isca de peixe, subiu piraputanga, jeripoca. Se é dura lutar com o rio? Não, faço por gosto, vê lá. Mas, agora, rede não pode. Que tá difícil a vida, tá. Tarrafa. Foi tarrafear logo de manhãozinha, dá de ver o que trouxe. Disparate"!

A autora "Do Falar Cuiabano" emociona qualquer leitor: "A pimenteira tá no fim, de tanto lasquear ela. Lá, perto duma aguinha, só os galhos mais altos. Para fazer louça, mãos com jeito de esculpir. O rio levou, aguabaixo, as origens das formas. A linguagem das formas, as manhãs, o sarazal, o ganzá, o carcaxá, a viola de cocho, adufo correndo. Viva meu São Gonçalo, oi, torna a revivar! Agora!" A professora Maria Francelina Ibrahim Drummond, natural de Ouro Preto, em Minas Gerais, será para sempre uma cuiabana de "tchapa e cruz".

“Quem cotchitcha, o rabo espitcha. Quem escuta, o rabo encurta. Quem importa, o rabo entorta”. Revivendo esses momentos, também encontro na tradição o cantar carinhoso em que revivo o passado, cada vez mais distante, mas que sempre está presente no amor à terra que escolhi para os meus últimos dias.

GLOSSÁRIO CUIABANO

Na organização deste glossário contei com a colaboração de vários amigos. Entre eles cito por merecimento o desembargador António de Arruda, o desembargador José Vidal, o historiador Rubens de Mendonça, a professora Maria Benedita Deschamps Rodrigues (a professora Dunga), os médicos Ivens Cuiabano Scaff e Luiz Alves Corrêa e a minha esposa Carminda Póvoas Jucá. Não é um texto definitivo. Reconheço que o trabalho não está completo e há muito a pesquisar.


LETRA A

PALAVRAS SIMPLES
Abancar: Apoderar-se de alguma coisa.
Abaulado: Tem a forma de baú.
Abelhudo: Intrometido, curioso.
Abichado: Animal que tem a larva da “mosca varejeira”.
Abiúda: Abelhuda, intrometida.
Aboiano: Falando, cantando, com o gado.
Abonado: Quem está rico, endinheirado, próspero.
Abufelado: Cansado.
Acampar: Ocupar algo que não lhe pertence.
Acanhado: Sem jeito, tímido.
Acentar: Anotar.
Acesa: Pessoa levada, quem não para de falar.
Achegar: Chegar, aproximar.
Acochar: Apertar.
Acoitar: Apoiar, ajudar.
Açoites: Chicotadas.
Acoloiar: Ajuntar, apoiar.
Acuar: Impedir a fuga de alguém ou de algum animal.
Adispois: Depois.
Adobe: Tijolo grande de barro prensado manualmente.
Adornar: Enfeitar, embelezar.
Adufo: Tamborete quadrado, de couro, usado no Cururu.
Advena - Gente de fora, não é cuiabano.
Aforante: Excluindo algo ou alguém.
Afortunado: Próspero, com sorte.
Afrontar: Enfrentar.
Afrissurado: Interessado.
Agardecer: Agradecer.
Agachi: Nome de lancha usada no transporte fluvial.
Agente: Pequeno comprador de diamantes.
Aguada: Onde os animais podem beber água.
Aguacero: Muita água, muita chuva.
Aguaçu: Tipo de palmeira regional.
Agregados: Criados pelas famílias.
Aguapé: Espécie de lírio aquático, roxo ou cor-de-rosa.
Aguar: Irrigar, molhar.
Aguaxado: Cansado, esgotado.
Ajantarado: Almoço servido mais tarde, geralmente no domingo.
Ajuntação: Ajuntamento, reunião, casamento não oficial.
Ajoujado: Ligado, unido, ajuntado.
Ajoujamento: Ajuntamento, casamento não formalizado.
Ajoujar: Juntar, ligar, amigar.
Ajutório: Ajuda, apoio, colaboração.
Alarido: Agitação, barulho.
Alambrado: Cerca de arame ou madeira.
Alardear: Divulgar, espalhar.
Alcova: Quarto do casal.
Alegar: Lembrar um favor, como cobrança de algo.
Alembrar: Lembrar, recordar.
Alfinim (Alfenim): Pessoa muito delicada, sensível demais.
Alforge: Bolsa de couro usada no lombo de animal.
Algodoim: Algodão.
Alhada: Confusão, distúrbio.
Alimpar: Limpar.
Aloitar: Lutar.
Aloito: Luta entre pessoas ou animais, trabalho.
Alongado: Animal domesticado que fugiu para o mato e não voltou.
Aloprado: Descuidado, alvoroçado.
Alterado: Nervoso, agitado, doente.
Altercação: Confusão, tumulto, briga.
Alumeia: Ilumina.
Alumiar: Acender, iluminar.
Amanuense: Quem manuscreve, antiga função pública.
Amarelinha: Brincadeira infantil.
Amenhã: Amanhã.
Amigado: Vive maritalmente com alguém.
Amiudar: Diminuir, apequenar, fazer algo com freqüência, amiúde.
Almocafre: Semelhante a enxada.
Amoitado: Animal escondido no mato.
Amojo: Por o bezerro para mamar antes de se tirar o leite da vaca.
Amolar: Aborrecer, importunar.
Amontoeira: sujeira, despejo.
Amornado: Pouco aquecido.
Amostrar: Apresentar, mostrar.
Amuado: Animal embravecido que se deita no chão.
Anágua: Roupa usada embaixo da saia.
Anarquista: Bagunceiro, desordeiro.
Anca: Quadris femininos.
Andaço: Diarréia.
Andejo: Viajante de longas distâncias.
Aniquilado: Fraco, definhado, acabado.
Anseado: Está aguardando alguma coisa, com pressa.
Antagônico: Contrário, contraditório.
Antepunho: Entre o pano da rede e o punho.
Apagador: Limpador de quadro-negro escolar.
Aparecer: Destacar-se sobre os demais, sem méritos.
Apatacado: Endinheirado, rico.
Apear: Desmontar da montaria, descer de um carro, perder regalia.
Apeia: Desce.
Apertar: Travar, com sabor mais amargo.
Apreçar: Saber o preço.
Apurado: Apressado, agoniado.
Apurar: Para o doce ficar no ponto.
Aranzé: Aranzel, confusão, tumulto, agitação, bagunça.
Araputanga: Árvore com madeira de qualidade; mogno.
Ardume: Ardido.
Arear: Limpar, lavar, polir.
Arfante: Respirando forte.
Arga: Corruptela de ilharga (sair de arga, de lado).
Arigó: Matuto, caipira, da zona rural.
Arqueado: Curvado pelo peso ou pela idade, cansado.
Arrebalde: Arrabalde, periferia urbana, subúrbio.
Arremedar: Repetir, fazer o mesmo.
Arraial: Antiga povoação do período colonial.
Arranchar: Ficar muito tempo na casa dos outros.
Arregaçar: Destruir, acabar.
Arrear: Ato de colocar o arreio no animal.
Arreio: Conjunto de peças para se montar em um animal.
Arremediado: Quem possui alguma propriedade.
Arrepiar: Reagir.
Arriado: Apaixonado, cansado.
Arribar: Fugir, ir embora, fugir.
Arrieiro: Chefe dos tropeiros no transporte de mercadorias.
Arrocho: Aperto.
Arruaça: Briga, agitação.
Arruinado: Está falido, está acabado.
Arruinar: Estragar, apodrecer, piorar.
Arruinou: Alguém estava doente e piorou.
Arrumado: Postiço.
Artífice: Profissional.
Ascança: Alcança.
Ascendorada: Mulher assanhada.
Asneira: Palavra obscena, tolice, besteira.
Asneirento: Quem só diz besteira ou usa palavra obscena.
Aspato: Quem ambiciona ou aspira alguma coisa.
Asprito: Apressado, aflito.
Assanhamento: Para chamar atenção, atitude de moça enamorada.
Assento: Traseiro, bunda.
Assoberbado: Com muitas tarefas a realizar.
Assuntando: Ouvindo, prestando atenção a alguém.
Assuntar: Escutar, observar, ouvir, verificar.
Assistir: Ficar hospedado por um determinado tempo.
Astrever: Atrever.
Ata: Pinha, fruta-de-conde.
Atachar: Apertar, unir, anexar.
Atamancar: Agir com cuidado, sem pressa.
Atapetado: Cheio de gente.
Atarantado: Aturdido, sem rumo.
Atarracado: Abraçado, agarrado, junto demais, apertado.
Atibado: Cheio demais, no limite.
Atiçar: Insuflar, provocar alguma reação.
Atirado: Confiante, corajoso.
Atochado: Apertado.
Atolado: Quem demora a fazer algo, quem é preguiçoso.
Atraquei: Segurei, agarrei, amarrei.
Atravessado: Engasgado, não é aceito.
Atropelado: Atrapalhado.
Atropelar: Atrapalhar.
Audácia: Abuso.
Audacioso: Quem passa dos limites, intrometido.
Auto: Automóvel.
Avoado: Desorganizado, descontrolado.
Azular: Sumir.

PALAVRAS COMPOSTAS
Abanar a mão: Cumprimentar, saudar.
Acha de lenha: lenha apropriada para usar no fogão.
Adro da igreja: Pátio da igreja.
A dona: Pessoa do sexo feminino.
Água esperta: Água morna, quase quente.
Água turva: Água suja.
Alimento sentido: Alimento estragado, deteriorado.
Almoço-ajantarado: Almoço servido mais tarde, substituindo o jantar.
Alisar a roupa: Passar ferro na roupa.
Alugar alguém: Ocupar alguém.
Andar de a pé: Andar a pé.
Animal arisco: Animal que se assusta facilmente.
Animal arreganhado: Animal cansado.
Animal sentido: Animal que perdeu peso por algum motivo.
Ano Bom: Entrada de Ano Novo.
Anunciando chuva: O sabiá cantando na época das chuvas.
Anzol enroscado: Está preso em alguma coisa dentro do rio.
Apertar o passo: Andar mais depressa.
A reio: Sem descanso, a fio.
Ar de vento: Dor nas costas.
Araticum-do-campo: Planta típica do Cerrado, de agradável perfume.
Arca caída: Dor na boca do estômago ou nas costelas.
Arcar com...: Assumir com determinada responsabilidade.
Armar laço: Defecar, obrar.
Arrastar asa: Demonstrar interesse por alguém, querer namorar.
Arroz carreteiro: Arroz com carne seca, alho e cebola.
Arroz doce: De arroz cozido, com água e leite, açúcar, sal e cravo.
Arroz-de-festa: Quem não perde uma festa.
Arrumando chuva: Quando as nuvens ficam escuras.
Atarracar com...: Agarrar-se com...
Atracar-se com...: Brigar com....
Azular: Fugir, sumir.
Azulou: Desapareceu, foi embora.

EXPRESSÕES REGIONAIS
A banana está apertando: não está madura e trava no sabor.
A casa caiu: O imprevisto aconteceu.
A chuva apertou: A chuva aumentou, está mais forte.
A como está a penca de banana?: Quanto custa a penca de bananas?
Acoloiado com...: Ajuntado com...
Agora como...: Não acredito.
Agora de quê?...: Ora, o que é isto?
Agora de quê será? : Não pode ser.
Agora quando! - Interjeição de espanto, desmentindo ou desacreditando.
Ah! Hum!..: Indignação, concordando ou não.
Ah! Sim!...: Concordo, compreendi.
Ajustar contas: Prestar contas.
A jogo do rio: Movimento das águas nas margens dos rios.
Alimento sentido: Alimento estragado.
Alvo de branco: Bem branco.
Amanhão de manhã: Amanhã de manhã.
Andar depressa: Andar rápido.
Animal apadrinhado: Animal amansado, no Pantanal Mato-grossense.
Apanhou até fofar: Apanhou demais.
Apanhou prá bestera: Apanhou demais.
Apanhou que nem cachorro de bugre: Apanhou demais.
Aparar criança: Fazer o parto.
Aguerma: Acalma.
Ar-de-vento: Dor nas costas.
Armar laço: Evacuar, obrar, na zona rural.
Arrodear o toco: Ter dificuldade de chegar ao final do que está falando.
Às gatas: Estar cansado demais.
Assistir na casa de...: Hospedar-se na casa de...
A torto e a direito: Para todos os lados.
Até Chico chegar da lenha: Vai demorar.
Até na Oreia: Repleto, cheio, demais.
Até na pituca: No máximo.
Até parece...: Quando não acredita...
A trouxe-mouxe: Fazer as coisas de qualquer jeito.
À unha seca: Encontrar diamante em cascalho ainda não lavado.
A úfa de...: Abundância de algo ou alguém.
A vaca foi “pro” brejo: Já aconteceu, agora é tarde.

LETRA B
PALAVRAS SIMPLES
Babuja: Doces, balas, guloseimas.
Babujar: Comer doces, ou alguma coisa, antes das refeições.
Bacia: Parte da jazida de diamante, em aluvião.
Baco: Caixão usado para peneirar o cascalho de ouro ou diamante.
Bacurau: Caipira.
Badero: Hostil.
Badulaque: Objetos de menor valor, amontoados.
Bafo: Jogo com figurinhas, usando a mão em concha.
Bagageiro: Serviçal, bajulador.
Bagaço: O que ficou na bateia depois da lavagem do cascalho.
Bagarete: Ponta de cigarro, dinheiro pouco, o que é pouco.
Bagerê: Camada acima do cascalho onde fica o diamante.
Baguá: Pessoa valente.
Baqueiado: Está fraco, frágil.
Bagueiar: Fracassar.
Bagueio: Fracasso.
Bagueragem: Pessoa de baixo nível social, grosseira.
Bagueragem: Gesto grosseiro, sem educação.
Baía: Semelhante a lago, lagoa, no Pantanal.
Bainha: Estojo de couro para guardar faca, facão.
Baita: Grande, enorme, extenso.
Baitarra: Grande demais, mais do que o comum.
Baiúca: Casa modesta.
Baixeiro, bachero: manta, ou conjunto de sacos, que se põe no lombo do cavalo, seguindo-se a carona e a sela.
Baixio: Parte rasa do rio.
Balaio: Cabelo em grande quantidade, despenteado.
Baleia: Empresa regional que popularizou o nome como ônibus.
Balda: Defeito habitual, tipo mania.
Baldear: Carregar, levar.
Baldio: Terreno abandonado, não cuidado.
Baliza: Para marcar limites.
Bambolê: Chinela de borracha.
Bamburral: Lugar cheio de cipós.
Bamburrar: Achar pedra preciosa de grande valor.
Bamburro: Local sujo, com muito mato.
Bamburrou: Ganhou, venceu.
Banana: Pessoa fraca de vontade, manipulada por alguém.
Bandalheira: Roubo, corrupção, malversação do dinheiro público.
Bandoleiro: Não demora no mesmo lugar, vai com qualquer um.
Bandos: Textos oficiais, desfiles tradicionais.
Bandulho: Barriga.
Banguê: Grande quantidade.
Banguela: Desdentado.
Banzando: Pensando.
Banzé: Bagunça, confusão.
Baqueiar: Balançar, quase cair.
Baquité: Cesta indígena de palha de buriti.
Barrotear: Colocar barro nas paredes de casa de pau-a-pique.
Bartelão: Embarcação típica do Pantanal, canoa grande.
Barrigada: Faixas de couro curtido ou pano, para firmar o arreio na cela.
Batalhar: Trabalhar.
Batê: Uma gaiola, armadilha, para capturar pássaros.
Bateia: Tipo de gamela de madeira para lavar ouro e diamante.
Batedeira: Local onde se bate a peneira para lavar cascalho.
Batelão: Canoa larga usada nos rios Cuiabá e Paraguai.
Batente: Degrau de casa, de prédio, serviço.
Batido: Conhecido, velho demais.
Batido de água: Pequeno rego de água para uso na garimpagem.
Batistério: Certidão de Batismo, na Igreja Católica.
Batuta: Ótimo, de boas qualidades.
Barroso: Cavalo que tem cor entre castanho, preto e amarelo escuro.
Bebericar: Beber apenas para tomar gosto.
Beiju ou biju: Bolo assado feito da raspa da mandioca.
Beiradear: Margear.
Beirando: Aproximando, chegando perto.
Belisqueira: Sem valor, pouco.
Benze: Cachaça tomada como aperitivo.
Bereré: Dinheiro por fora, dinheiro suspeito.
Berrano: Gritando.
Besteira: Palavrão.
Bexiga: Varíola.
Bexiga: Bola velha.
Bibico: Casquete (boné militar ou colegial) de dois bicos.
Biboca: Casa modesta, em local distante.
Biju (Beiju): Bolo de massa de farinha de milho ou mandioca.
Biju ou bijuzinho: Pessoa querida.
Biboquê: Bilboquê, bola de madeira, amarrada a um bastão, onde se encaixa.
Bingo: Órgão genital masculino, pênis.
Biguá (mulher): Prostituta, biscate.
Biguá: Exímio e imponente pássaro do Pantanal.
Biri: Semente esférica e preta.
Birrento: Teimoso, criador de caso, mal humorado.
Biruá: Grão de milho que não virou pipoca.
Bisbilhotar: Ter curiosidade sobre a vida alheia.
Bisbilhoteira: Pessoa que presta atenção na vida alheia.
Bisca: Mulher de moral duvidosa.
Bisca: Jogo doméstico.
Biscoito: Produto caseiro.
Bispar: Olhar algo ou alguém.
Bispando: Olhando com muito interesse.
Bixiguinha: Catapora.
Bobó: Bobo, tolo.
Bocaiúva: Saborosa fruta com coco.
Bocaiuvais: Onde existem muitos bocaiuveiros.
Bocaiuveiro: Tipo de coqueiro que dá bocaiúva.
Bocó: Órgão genital feminino, vagina.
Bocudo: Falador, boca grande.
Bodoque: Arco rústico, com vários fios, para lançar pelotes de barro.
Bodoque: Nos garimpos, mistura de álcool puro, com água e açúcar.
Bofera: Porcaria, não presta, mau feito.
Boiadeiro: Comprador de gado, para criadores e açougueiros.
Boiota: Pessoa abobalhada.
Boipá: Doce de abobara com casca, feito com rapadura.
Boitatá: Assombração, fenômenos naturais que causam temor.
Bolacha, bolachinha: Biscoito industrializado.
Bolapé: Modo de nadar do cavalo pantaneiro, em água de pouca profundidade.
Boleando: Lançando alguma coisa.
Bolear: Rodear o objeto que vai ser lançado.
Bolicheiro: Proprietário de um bolicho.
Bolicho: Pequeno comércio, geralmente nos bairros.
Bolita: Bola de gude, de vidro, bila.
Boqueira: Ferida Localizada no canto da boca.
Boquejar: Discutir à toa, falar irritando.
Bordoada: Paulada.
Borel: Palavra pantaneira relativa a índio.
Borocochô: Tristonho.
Bororo: Nome dado pelos portugueses aos índios Bóes.
Bosque: Bairro ao redor da Praça Santos Dumont (Cuiabá).
Boteco: Pequeno comércio, geralmente na beira de estrada.
Botica: Farmácia, drogaria.
Boticário: Farmacêutico.
Brabo: Feroz, zangado.
Brazino: Boi rajado de cor preto-amarelo escuro.
Brechó: Tipo de botina grande, sapato grande.
Brefado: Sem dinheiro.
Brete: Corredor estreito nos currais, para vacinar, marcar e capar.
Breve: Privada, sanitário, banheiro com vaso.
Brichichila: Pinga, caninha.
Broca: Frieira que atinge o casco do cavalo e o deixa manco.
Brocha: Cordinha usada para prender a canga no pescoço do animal.
Brocoió: Pessoa sem graça, retraída.
Brocotó: Terreno esburacado, bem distante.
Bródio: Banquete, jantar.
Bronco (Brôco): Envelhecido.
Broto: Moça ou rapaz, quando bem jovens.
Bruaca: Bolsa de couro não curtido. Mulher feia, bruxa, intrigante.
Bruaqueiro: Burro ou cavalo manso usado no transporte de bruacas.
Bruburu: Pessoa que faz tudo errado.
Brutelo: Grande.
Bruto: Estúpido, sem trato.
Buçá: Sacola de milho que se coloca na boca de um animal.
Bufo: Urro do animal quando está acuado.
Bugiar: Andar sem rumo.
Bugre: Palavra antiga referente a índio.
Buque: Buraco feito no chão para jogar bolita.
Budum (Bodum): Odor fedorento, catinga, de uma pessoa.
Bulir: Mexer, tocar.
Bundeta: Quem manca por ter uma perna curta.
Buré: Mingau de milho verde em grãos.
Burra: Antigo cofre usado em Cuiabá.
Burrica: Nas lendas, onde se guardava riqueza.
Busilis: O nó do problema, a dificuldade.
Buzo: Diamante sem qualidade, mas vistoso e bom para inexperientes.

PALAVRAS COMPOSTAS
Bamboleiar as cadeiras: Balançar as cadeiras, balançar os quadris.
Bandeira do Senhor Divino: Grupo que pede esmola durante a festa.
Bandeira de São Benedito: Grupo que pede esmola durante a festa.
Bater atrás: Ir atrás, ir buscar.
Bate-pau: Capanga.
Batedor de alho: Socador de alho.
Batendo a cabeça: Procurando acertar, buscando algo.
Bater bruacas: Andar à toa.
Bater chapa: Tirar fotografia, tirar radiografia.
Bater duro: Bater forte.
Bater invernada: Limpar a invernada.
Batida de carro: Acidente de carro.
Beco do Candieiro: Atual Rua 27 de Dezembro.
Beco do Pito Aceso: Atual Rua Barão de Casalvasco, no Araés.
Beco Torto: Atual Travessa 21 de Abril.
Bica das Moças: Antigo nome da Bica da Prainha.
Boca de caçapa: Boca grande.
Boca de lobo: Nó que encurta o punho da rede.
Bocado de Tempo: Muito tempo.
Boi baguá (ou bagual): Boi selvagem.
Boi banana: Quando tem um ou os dois chifres tortos ou moles.
Boi-de-carro: Boi de carroça.
Boi-de-piranha: No Pantanal Mato-grossense, é o boi entregue às piranhas, para que a o resto da boiada atravesse o rio, à montante, sem ser molestado. Também é usado, no sentido figurado, quando algo ou alguém é prejudicada para salvar outro negócio ou situação.
Boi mocho: Boi sem chifres.
Boi sinuelo: Boi grande e manso.
Bolo-de-arroz: Fubá de arroz, mandioca, açúcar, queijo, coco, ovos e gordura.
Bolo-de-queijo: Queijo ralado, polvilho de mandioca, ovos, nata de leite e sal.
Bolo de vela: Torta de aniversário que tem vela.
Bolo embatumado: Bolo duro, achatado.
Bola de bexiga: Feita com bexiga de boi, no Pantanal.
Bom Barqueiro: Antiga brincadeira infantil.
Bosque Municipal: Antigo nome da Praça Santos Dumont.
Bota fora: Despedida de alguém.
Braço de rio: Pequeno curso de água ligado a um rio.
Braço esquecido: Braço insensível.
Busca-pé: Rojão, foguete de festa.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Bacalhau de porta de venda: Pessoa magra, de físico frágil.
Baixar a crista: Perder a arrogância.
Balaio de gato: Onde ninguém se entende.
Banda de lá: Local sem definição exata.
Banho de assento: Quando se lava apenas as partes íntimas.
Bater atrás de...: Procurar, tentar pegar, alguma coisa.
Bate na boca três vezes: Atitude de penitência.
Bate num quara: Como lava, veste. Bateu, levou.
Bater na boca três vezes: Como se penitenciar por falar demais.
Bater na bruaca p'ra cangalha entender: Dar uma indireta.
Bater as pacoéras: Morrer.
Bater até fofar: Bater muito, até dizer chega.
Bem cedo: De manhã.
Bezerro tambeiro: Bezerro de vaca leiteada.
Bobó cheira-cheira: Pessoa boba.
Bobó-lelé: Bobo demais.
Bocó de fivela: Quem é bobo, tolo.
Boi erado: Boi com mais de seis anos.
Boi de piranha: Sacrificado para salvar os demais.
Bola de bexiga: Bola usada antigamente nas fazendas.
Bom demás: Muito bom.
Bonito prô-cê...: Repreendendo quem fez algo errado.
Bonito para s'a cara...: Repreendendo alguém.
Bons Anos: Próspero Ano Novo.

LETRA C
PALAVRAS SIMPLES
Caapiá: Vegetal rasteiro. O pó da raiz dá um sabor especial ao guaraná.
Cabeça: Uma pessoa muito inteligente.
Cabreiro: Desconfiado.
Cabuloso: Chato, inconveniente.
Cacau: Antigo bolo cuiabano, feito com trigo, bicarbonato, fermento, gordura e rapadura, que lhe dá a cor achocolatada .
Caçamba: Pedaço de sola, usado no estribo, para proteger o pé.
Cachaço: Suíno adulto, não castrado, reprodutor.
Cachara: Peixe semelhante ao pintado, com listas horizontais.
Cachi: Faca que ficou menor depois de muitas vezes amolada.
Cachimônia: Cabeça, inteligência.
Cachola: Cabeça.
Cachorrada: Doce feito com leite coalhado.
Cachorro: Beiral de telhado de casa antiga.
Caçoar: Rir de algo ou de alguém.
Cacunda: Costas, lombo.
Cadeira: Quadril, anca.
Caducar: Dedicar muito afeto a alguém.
Cafézinho: Pequena ave, de cor preta-avermelhada e bico amarelo.
Cafifa: Pessoa chata.
Cafitear: Importunar, encher o saco.
Cafu: Touro grande e forte.
Cafuçu: Alguém feio.
Caínha: Quem é avarento.
Cainhar: Negar algo.
Cajázinho: Doce de queijo, em calda de açúcar, com gemas de ovos.
Cajuada: Refresco com suco de caju.
Cajuzinho: O preferido.
Camalote: Planta aquática do Pantanal.
Camarada: Empregado de fazenda no Pantanal Mato-grossense.
Cambambá: Bando, cambada, grupo.
Cambada: corja, bando, quadrilha.
Cambaio: Quem tem pernas tortas, quem é torto.
Cambalear: Andar sem firmeza.
Cambeta: Tem pernas tortas.
Cambetear: Cambalear, andar sem firmeza.
Cambito: Perna fina e torta.
Cambito: Antigo pão feito em Cuiabá, longo e fino.
Cambucu: Peixe pintado grande.
Cambuquira: Cozido de broto de aboboreira, servido como acompanhamento de assados.
Campear: Cuidar dos animais no campo, procurar.
Cancela: Portão pequeno, para cercas e muros.
Candieiro: Candeeiro, lampião.
Candimba: Do lendário cuiabano. Sempre doente, e acamado, tinha um rabo.
Candimba: Pequeno coelho, tipo lebre.
Canga: Usada pelos bois carreiros. É de madeira, com quase dois metros.
Cangalha: Sela de madeira, com acolchoados internos, para cargas em animais.
Cangote: Nuca.
Canhambora: Quem usa cabelos grandes e descuidados.
Canhar: Negar alguma coisa a alguém.
Canivete: Alguém jovem demais.
Canjica: Tradicional caldo de milho branco, com leite e açúcar.
Canoada: A quantidade transportada numa canoa.
Cansanção: Urticária que coça e arde, mas ótimo para expulsar morcegos.
Canzil: Petrecho de carro de boi.
Caó: Comida que não é das melhores.
Caolho: Quem é estrábico, zarolho.
Capação: Castração de boi, cachorro e outros animais.
Capacho: Quem é subalterno, aceita tudo.
Capão: Animal castrado.
Capanga: Bolsa de couro para carregar diamantes.
Capangueiro: Comprador e vendedor de diamantes.
Capear: Proteger ou adular alguém.
Capenga: Quem anda mancando.
Capinha: Ajudante dos “toureadores”, que enfrentava o touro a pé.
Caracachá: O mesmo que ganzá, instrumento musical usado no Cururu.
Carpir: Limpar o mato, o jardim, capinar.
Capitão: Comida amassada com a mão.
Capivara, ou capincha: Roedor, comum na beira dos rios.
Capivariar: Mergulhar.
Capoeira: Área fértil de mata onde já houve roça.
Caramba!: Interjeição de espanto ou admiração.
Carapinha: Cabelo duro, enrolado, pichaim.
Carnear: Comer churrasco na tradição pantaneira.
Carnegão: O centro do pus endurecido de tumores e furúnculos.
Carona: Manta de couro em cima do baixeiro, protegendo o lombo do animal.
Carpir: Limpar algum terreno com enxada.
Carrada: Refere-se a grande quantidade.
Carrear: Carregar.
Carreta: Carro puxado a boi, hoje quase em desuso.
Carrerear: Sentado na popa, remando com uma mão e pescando com a outra.
Carrinheiro: Vendedor que usa carrinho de mão.
Carteado: Jogo de baralho, jogo de cartas.
Cartela: Semelhante a cartão.
Carumbé: Vasilha usada para lavar ouro e diamante. Tartaruga, em tupi-guarani.
Casabeque: Agasalho curto, antigamente usado no frio.
Cascar (descascar): Agir com o maior rigor, ser rigoroso.
Cascudo: Tipo de peixe, bater na cabeça com a mão fechada.
Casório: Casamento, núpcias, no sentido popular.
Casqueiro: Exigente demais.
Casquete: Com dois bicos, usado por militares e estudantes.
Cata, catra: Mina de diamante, medida bruta de tempo na garimpagem.
Cataplasma: Curativo com uso de remédios caseiros.
Catear, catrear: Garimpar.
Catinga: Odor desagradável.
Catingueiro: Veado pantaneiro, avermelhado.
Catinguento: Fedorento.
Catita: Bonita, elegante.
Cativo: Prisioneiro.
Catre: Cama de madeira rústica, dobrável, com os pés em forma de “x” e lona.
Catreado: Retângulos nos garimpos para tirar cascalho.
Catrevage: O que não presta, mulher de programa.
Caturra: Pessoa obstinada.
Caturrita: Espécie de periquito, papagaio pequeno.
Cavernoso: Cadavérico.
Cavoteiro: Enjoado, sem graça.
Caxambu: Denominação dada ao monte de cascalho para ser lavado.
Caxiri: Faca desgastada pelo uso, faca pequena.
Cecê: catinga, fedor.
Cerqueiro: Fazedor de cercas.
Cerrar: Fechar, encostar.
Ceva: Amansar, acostumar, peixe com comida.
Cevar: Engordar, alimentar.
Ceveiro: Local onde os peixes ficam acostumados com comida.
Chá: Café matinal típico e variado.
Chácra: Chácara, pequena propriedade de terra.
Chacreiro: Alguém ligado a chácara (chácra).
Chacota: Gozação, crítica em tom de brincadeira.
Chalana: Barco de madeira, largo, fundo chato.
Chambalé: Antiga camisola para criança dormir, comprida e folgada.
Chambão: Alguém mau vestido.
Chanca: Pé grande.
Changador: Carregador de mercadorias no antigo Porto de Cuiabá.
Chaguaiano: Sacodindo, balançando.
Chaento: Chato.
Chanha: Chatice.
Chapa: Dentadura.
Chapa: Foto, radiografia.
Chapa: Parte superior do fogão à lenha.
Charqueada: Onde se faz carne de charque, carne seca.
Chata: Embarcação de pequeno calado, puxada por outra com motor.
Chaté: Quem é baixo.
Chaveta: Amarra a canga na ponta do cabeçalho do carro de boi.
Chelba: Inconveniente, chato.
Chelpa: Dinheiro, na gíria dos garimpeiros.
Chibiu: Pedra preciosa com menos de 20 pontos e de pouco valor.
Chilado: Bêbado, embriagado, tonto.
Chilique: Desmaio ou escândalo, no sentido pejorativo.
Chincha: Parte da barrigada da sela usada pelo vaqueiro.
Chichano: Segurando na chincha o laço que está na rês.
Chimi: Tamanduá-mirim.
Chinchão: Beliscão.
Chinchar: Puxar, beliscar, cutucar.
Chinchar: Apertar a chincha, barrigueira de animal, no Pantanal.
Chinchim: De qualidade inferior, não é bom.
Chinfrim: De péssima qualidade, baile de ponta de rua.
Chiriri: Pouco, mínimo.
Chispar: Sair correndo, sair rápido, sem avisar.
Chispou: Foi embora de repente.
Chita: Tecido estampado, barato.
Choça: Moradia modesta, de palha.
Choça: Armadilha de pássaro.
Chocho: Algo murcho, seco e sem suco, retraído, tímido, sem graça.
Chuçar: Ferir, furar, espetar.
Chuço: Arma semelhante à faca.
Chucro: Animal ainda não amansado, peão tímido.
Chupa: Ingênuo, tolo.
Chuvarada: Muita chuva.
Cimbre ou jimbre: Dinheiro, moeda.
Cinteiro: Cinturão que era usado para segurar as calças e punir alguém.
Cipoal: Moita de cipós.
Ciscaiar: É o mesmo ciscar usado para as galinhas.
Ciscar: Desafiar alguém para uma disputa.
Cisma: Temor sem justificativa, mania, balda.
Clarear: Iluminar.
Coadjuvante: Ajuda nas despesas da casa.
Cobre: Dinheiro, moeda de cobre.
Cocho: Feito de madeira, onde se põe sal para o gado.
Cochichar: Falar baixo, no ouvido.
Cochicholo: Bem pequeno.
Cocorocar: Mimar demais.
Cocorocando: Mimando demais.
Coió: Assobio fino para chamar a atenção das moças, bobo, trouxa.
Cognome: Apelido depreciativo.
Coloiado: Amontoado, agrupado, ao lado.
Coloiar: Agrupar com outros, pejorativamente.
Coloio: Acordo no sentido pejorativo.
Combinação: Roupa feminina, embaixo do vestido.
Comedoria: Mesa farta, muita comida.
Companheiro: Placenta.
Compoteira: Vasilha destinada a conservar doces.
Condutor: Responsável pela viagem da boiada, em comitiva.
Cônscio: Ciente da responsabilidade, compenetrado.
Constipação: Resfriado.
Constipado: Gripado.
Consumir: Gastar, usar em excesso.
Contrário: Oposicionista, adversário.
Corcovear: Quando não aceita laço e mexe com o pescoço.
Cordero: Quem gosta de contar vantagem.
Córgo: Córrego.
Córnice: Tiro de canto no futebol, variação do “corner” inglês.
Corisco: Descarga de raio.
Corixo: Canais naturais para escoar água das lagoas, baías e brejos para os rios.
Corja: Designação pejorativa de grupo de pessoas.
Coró: Pequena lagarta que aparece nas frutas.
Correição: Fileira grande de formigas.
Corrução: Forte diarréia que existiu em Vila Bela, no período colonial.
Cortado: Espaço entre dois "capões de mato", campina.
Cortar: Coalhar.
Coscorão: Massa frita de pastel, sem recheio.
Costado: Lateral.
Cotó: Pessoa mutilada, animal sem a cauda.
Coxé: Quem é coxo, quem tem uma perna mais curta.
Cozidão: Carne cozida, com várias verduras.
Crequento: Torrado, áspero, cascudo.
Cria: Agregado, adotado.
Cria: Filhote de gado, de cavalo.
Criquiri: Quiriquiri, ave pantaneira que se alimenta de carrapatos.
Crítico: Alguém irreverente, que sabe apenas caçoar.
Crucuçar: Esmiuçar alguma coisa.
Cubado: Quando o carumbé está cheio de cascalho.
Cubando ou Cubano: Olhando, observando, mas discretamente.
Cubar: Observar, medir algo.
Cuia: Vasilha feita com a casca de cabaça.
Cuiada: Ironia, grosseria, sarcasmo, para constranger alguém.
Cuiada: Batida com cuia.
Cumbu, cubu: Azar.
Cumbuca: Vasilha redonda.
Cueiro: Fralda feita com flanela.
Cural: Garimpeiro novo.
Curau: Creme de milho verde, doce. Canjica no Nordeste.
Curro: Para manejo de gado nas fazendas.
Curro: Onde os touros ficavam antes das Touradas Cuiabanas.
Curso: Desinteria, desarranjo intestinal, diarréia.
Curtido: Sem vergonha, esperto, cínico.
Cururu: Dança típica regional, só para homens.
Cururueiro: Tocador de viola-de-cocho.
Currutela: Pequena localidade.
Cuscuz: Bolo de milho, cuzido no vapor de água fervente.
Cutilada: Golpe de faca ou de qualquer arma branca.
Cutela: Faca larga.
Cutelo: Faca com forma semicircular.
Cutuba: Ótimo.
Cutucar: Criticar alguém para provocar.

PALAVRAS COMPOSTAS
Cabeça de canoa: Cabeça semelhante à canoa.
Cabeça-seca: Parece com o Tuiuiú, preto na cabeça, bico e ponta das asas.
Cáis do Porto: Ladeira de pedra, na Avenida 15 de Novembro.
Cambada de peixe: Amarrilho, com três ou mais peixes, dependendo do tamanho, para comercialização.
Cangar grilo: Ficar à-toa, sem fazer nada, descanso.
Campo da Mandioca: Antigo campo de futebol na atual Avenida Mato Grosso.
Campo de Aviação: Aeroporto.
Campo Limpo: Onde existe pastagem natural.
Cantador de Cururu: Homem que canta Cururu.
Capão de mato: Ilha de mato mais denso no meio do campo.
Capim-carona: Capim que o gado não gosta.
Capim-navalha: Típico de brejo, prejudicial aos touros, principalmente.
Cara azeda: Cara fechada, com raiva.
Cara de caju: rosto pequeno.
Cara-de-canga: Rosto de pele áspera e bastante furada.
Cara-de-cavalo: Ao xingar alguém.
Cara-de-queijo: Rosto de pela semelhante ao de queijo.
Cara de tacho: Sem graça.
Cara lambida: Cara de sem-vergonha.
Carne-com-arroz: Mistura de carne seca ou fresca com arroz.
Carne de bocaiúva: Camada amarela da bocaiúva.
Carne frescal: Carne salgada, ainda crua, em início de processo de secagem.
Carne de panela: Carne cosida em panela.
Carne-de-pescoço: Pessoa de difícil trato.
Carne sentida: Carne quase podre.
Carro de praça: Táxi.
Caruru com angu: Carne com quiabo e angu de fubá de milho.
Casa de adobe: Casa feita de adobes.
Casa de taipa: Casa de parede de taipas (terra umedecida e socada) entre tábuas que fazem uma forma.
Casa de pau-a-pique: Casa em que as paredes têm um gradeado de madeira, no qual é jogado ou aplicado o barro.
Casa de material: Casa construída com tijolo e telha.
Catar alguém ou algo: Pegar, recolher.
Cavalo afrontado: Cavalo cansado ao máximo, quase sem respiração.
Cavalo chucro: Cavalo que não foi amansado.
Cavalo pantaneiro: Típico do Pantanal, é um cavalo de grandes qualidades.
Cepo de...: Para dizer: grande, bom.
Chácaras do Bufante: Atual Bairro Araés.
Chacrinha de estudantes: Grupos de estudantes.
Chá-com-bolo: Café tradicional cuiabano, bem variado.
Chá-de-fedegoso: Para combater verme.
Chá-de-erva Santa Maria: Para acabar com verme.
Chá-de-picão: Para curar qualquer tipo de hepatite.
Chão mole: Atoleiro, depois da chuva.
Chapa-de-dente: dentadura.
Chapa-de-fogão: Parte superior do fogão.
Chapa-do-pulmão: Abreugrafia.
Cheio da gaita: Com muito dinheiro.
Chico Magro: Planta do Cerrado, com frutas adocicadas.
Chofer de praça: Motorista de táxi.
Chum-chum: Bagre pequeno.
Chuva-de-caju: As chuvas de julho e agosto, quando florescem os cajueiros.
Coisa ruim: O que não presta, o diabo.
Comida requentada: Comida esquentada depois de feita.
Comitiva de gado: Grupo que conduz boiada.
Com rompância: Com arrogância.
Com rudeza: Com grosseria.
Correndo solto: Correndo muito, com facilidade.
Correr duro: Correr ou fugir depressa, muito rápido.
Corre disparado: Corre rápido, em disparada.
Correr presépios: Visitar os presépios no Natal.
Correr trecho: Fazer longa caminhada.
Cortar o leite: Coalhar o leite.
Crescer em cima: Reagir com vigor, avançar.
Criança birrenta: Criança manhosa.
Curicaca-Pantaneira: Ave cinza-chumbo, tipo íbis, com olhos e patas vermelhos.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Caça mé: Caça mel. Com olho apertado para ver melhor.
Caçando lagartixa: Fazendo pouco.
Cada um com o sheo (seu) dele: Cada um a seu modo, à sua maneira.
Canhaém, canhaém: Semelhante ao latido de cachorro, para discordar.
Cair na gandaia: Cair na farra.
Cara de broa: Rosto gordo e redondo.
Cara de caju: Rosto pequeno.
Cara de réu: Emburrado.
Cara lambida: Cara de sem vergonha.
Carregador de frutas: Vendedor de frutas.
Casa pegada com outra: Casa junta a outra.
Casca de ferida: Pessoa de difícil trato, encrenqueiro.
Castigo do capeta: Punição rigorosa.
Catingudo qui nem gambá: Fede demais.
Cavalo baldeiro: Cavalo que pula e dá coice.
Cepo de ...: Grande, forte, em relação a alguém ou a algo.
Chibata em punho: Chicote ou chibata na mão.
Chamar na chincha: Repreender alguém.
Chapa e cruz: Autêntico, legítimo.
Cheia de badulaque: Muita coisa de pouco valor amontoada.
Cheia de nove horas: Pessoa arrogante e antipática.
Cheirando mais do que maleta de barbeiro: Cheiroso.
Chequetré da cabeça: fraco da idéia, desorientado.
Chia lá: Espia lá, olha lá.
Chiou no mourão de rédea: Foi castigado por alguma coisa.
Chispa daqui: Vá embora, saia.
Chocar como jacaré: Não tirar os olhos de alguém.
Chuça e rebuça: Provoca e resolve.
Chumbo trocado não dói: Quando alguém vinga alguma coisa.
Chuva-de-molhar-bobo: Chuva fraca, que nem chega a molhar.
Coalhado de gente: Cheio de gente.
Coisa e loisa: Isto e aquilo.
Cô ocê...: Com você...
Com farpa: Com ponta, algo ponteagudo.
Comer de vianda: Comer de marmita.
Comeu até fazer bico: Comeu demais.
Comeu carne seca?: Quando alguém está bebendo muita água.
Como é que é?: Como é? E dai?
Como é que ele teve a cachimônia de fazer isso?: Como ele inventou isto?
Como não...: Claro que sim, confirmando.
Comprar porco: Estar perdido, sem saber para onde ir.
Conheceu papudo?: Bem feito, aprenda com isto.
Conversa de cerca Lourenço: Arrodeio antes de chegar no assunto.
Cor de burro fugido: Cor indefinida.
Costas-largas: Pessoa protegida por alguém de prestígio.

LETRA D
PALAVRAS SIMPLES

Damasco: Tecido de seda com desenhos em relevo.
Danado: Levado, arteiro.
Daninheza: Travessura, traquinagem.
Debandar: Ir embora, sair.
Defluxo: Resfriado, gripe, coriza.
Defrontar: Derrubar, no sentido de cortar o mato.
Degote: Decote (como era pronunciada em Algarve)
Degotado: Decotado (como era pronunciada em Algarve).
Delir: Diluir, dissolver (palavra antiga, do Século V), com pouco uso.
Delivrance: Parto.
Dereito: Direito.
Derriçar: Derrubar.
Derrubada: Quando derruba o mato.
Desacorçoado: Desmotivado, com preguiça.
Desastrado: Desajeitado, não faz algo corretamente.
Descabriado: Desorientado, perdido, sem rumo.
Descampado: Em campo aberto.
Descangotado: Dormindo a sono solto, com a cabeça de lado.
Descarnar: Emagrecer, perder peso.
Descobrar: Vingar, retribuir, dar o troco.
Descompensado: Desnivelado, fora de nível.
Desdenhar: Desmerecer, não dar atenção.
Desengonçado: Desajeitado, desorganizado.
Desenxabido: Triste, sem graça, deprimido, sem entusiasmo.
Desforrar: Vingar, descontar.
Desforro: Vingança.
Desgarrar: Extraviar, afastar-se.
Desgramado: Demais, em excesso.
Desguaritado: Sem rumo, sem destino.
Desquaritar: Sair sem destino ou rumo.
Desinflar: Esvaziar antigas bolas de futebol.
Deslindar: Solucionar.
Desmonte: Tirar a terra sob o cascalho, buscando jazidas de pedras preciosas.
Desmontar: Retirar o desmonte.
Desmilinguido: Fraco, doente.
Desmilinguir: Esmorecer, enfraquecer.
Despejo: Monte de terra ao lado de uma mina, entulho.
Despois: Depois.
Despotismo: Grande quantidade, abundante.
Dereito: Direito, correto.
Dessedentar: Matar a sede, beber água.
Destempero: Perder o controle emocional, agressão.
Desvalido: Abandonado, sem apoio.
Dezasseis: O mesmo que dezesseis.
Dezassete: Corresponde a dezessete.
Difruço: O mesmo que defluxo, gripe.
Diguada, ou liquada: Água dos rios com cinzas das queimadas, que serve para curtir couro, e é levada pelas chuvas, reduzindo o oxigênio.
Discabelado: Desesperado.
Discobrar: Dar o troco por alguma agressão sofrida.
Discontar: Vingar, desforrar.
Disengonçado: Sem jeito.
Disenxavido: Sem vontade de fazer qualquer coisa.
Disfeita: Desprestígio, desagrado.
Disgrama: Infortúnio.
Disgualepado: Destroncado, desorganizado.
Dismilinguido: Fraco, frágil.
Disparate: Muito, demais, grande quantidade.
Disparou: Descontrolado, sem obedecer a comando.
Dispencando: Caindo.
Dispidição: Momento da despedida.
Dispois (ou Adispois): Depois.
Distampatório: Agressão verbal, discussão violenta.
Distemperado: Briguento.
Distemperar: Perder a calma, o controle.
Distrambelhada: aloucada, não tem juízo.
Distrenado: Desacostumado.
Divisa: Limite entre propriedades rurais, identificação na orelha do animal.
Dobrado: Alguém robusto, forte.
Domação: Como amansar o animal.
Dordolhos: Tipo de conjuntivite, irritação dos olhos.
Durar: Demorar, tardar.
Dureiro: Parte endurecida de alguma coisa ou parte do corpo.
Duro: Forte.
Dus: dois.

PALAVRA COMPOSTA
Dar birra: Quando a criança chora muito.
Dar de ouvir: Tem condições de se ouvir, dar para ouvir.
Dar chepa: Dar carona.
Dar corda: Estimular.
Dar cria: Parir.
Dar no pé: Ir embora.
Dar parte: Denunciar, reclamar, apresentar queixa.
Dar praia: Quando surge areia nas margens dos rios.
Dar rodeio: Reunir o gado em rodeio.
Dar tábua: Recusar ao convite para dançar.
Dar trela: Dar atenção, ouvir alguém, no sentido pejorativo.
Dar um estirão: Fazer uma caminhada.
Dar uma lapada: Usar o cinto ou cinturão, contra alguém.
De algo: Alguém na posição de lado.
De soslaio: Olha com atenção, mas sem demonstrar a intenção.
Debulhar o milho: Tirar os grãos de milho da espiga seca.
De chupetão: De surpresa.
De criame: De criação.
De sorte que...: Continuando o assunto (desde a Capitania).
Despotismo de...: Abundância de...,
Dobrar alguém: Convencer alguém.
Doce de mamão espelho: De mamão verde, em fatias.
Doença de peito: Tuberculose.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Da boca para fora: Falar algo que inventa.
Da donde?: De onde?
Dá o pira daqui: Vá embora, saia daqui.
Dá que racha: Em excesso, fartura.
Danado da vida: Com raiva.
Dar (botar) banca: Causar falsa impressão, querer aparecer.
Dar no padre: Fraquejar.
Dar uma rasteira: Derrubar alguém com o pé, prejudicar alguém.
Dar tábua: Quando a moça não aceite convite para dançar.
Dar vau: Permitir a passagem do animal nas águas sem nadar.
Deitou o cabelo: Correu forte, rápido.
Deixa está jacaré, sua lagoa há de secar: O revide vem depois.
Deixa de ser tonta: Deixa de ser boba.
Deixar o bezerro no tampo: Amarrar o bezerro na hora de leitear.
De arga: De lado, obliquamente.
De ameio: compartilhado (dividido) com outro.
De butuca: Na espera.
De carreira: Depressa, logo.
De chapa e cruz: Autêntico, verdadeiro.
De déo-em-déo: Sem rumo.

De um tudo: De tudo.
Deu uma chispada: Foi embora.
Deu um sumiço: Desapareceu, escondeu em algum lugar.
De déu-em-déu: De um lugar para outro, sem rumo.
De cata-quirera: Fazendo muita coisa ao mesmo tempo.
De cata-mamona: Procurando algo em vários lugares.
De gatinho: Andar se arrastando, cansado.
De graça: Grátis.
De mão abanando: De mão vazia.
De nariz furado: Está apaixonado, está decidido.
De pirraça: Para insultar.
De pito aceso: Com todas as forças, excitado, apressado.
De que será?: Não acredito.
De um tudo: De tudo.
De rabanada: Visita curta, de passagem.
De sorte que...: De tal sorte que...
De sete costados: Autêntico.
De vez: Fruta quase madura.
De verso a cantiga: Duas coisas diferentes.
Deshoras: Tarde, às tantas horas.
De japa: Cortesia de quem vendeu alguma coisa.
De mamando a caducando: De novo a velho, todos.
De porteira fechada: Compra ou venda total de uma propriedade rural.
Dês...: Desde que...
De supetão: Imprevisto, de repente.
Demás...!: Expressão usada para discordar.
Demás de...: Muito, demais.
Demás de apurado com...: Está demais apressado com...
Demás de bom: Ótimo, bom demais.
Demás de povo: Muita gente, um grande público.
Demás de quente: Está muito quente.
Deu na sapituca: Resolveu fazer alguma coisa de repente.
Deus que assista: Agradecimento a convite para comer.
Deus te crie para o bem: Ao cumprimentar os jovens.
Deus lhe dê saúde: Dizem os pais quando os filhos espirram.
Deus te proteja ou te acrescente: Cumprimento entre adultos, desejando votos de bem estar e de felicidades.
Deus te proteja ou te acrescente e não me falte: Cumprimento entre adultos, desejando felicidades ao próximo e a si mesmo.
Dia de despacho: Dia de se abastecer no armazém da fazenda.
Disgramado de bom: Ótimo, exímio.
Diz que...: Estão dizendo que...
Dois-de-pau: Alguém apagado, que fica parado, sem iniciativa.
Dona menina: Tratamento respeitoso a uma moça.
Dormindo de touca: Descuidado.
Dor nos quartos: Dor nas cadeiras (entre a cintura e a coxa).
Duvidá: Se duvidar, talvez, é possível, com esperança.

LETRA E
PALAVRAS SIMPLES
Edênica: Como no Éden, no céu.
Efetivo: Antigo.
Eflúvios: Emanações.
Embarcadista, embarcadiço: Quem trabalha embarcado.
Embaúba: Madeira (morácea) muito usada para fazer “pau de sebo”.
Embira: Fibra usada para fazer corda e palha.
Embonecar: Enfeitar.
Emboquecado: Desestimulado, não quer participar.
Embotocado: Encurvado.
Embotocar: Ficar em forma de bodoque.
Embromador: Quem fica atrasando, enganando, tapeando, preguiçoso.
Embrombar: Atrasar quando está fazendo alguma coisa.
Emburrado: Zangado, com cara feia.
Emburrar: Ficar com raiva.
Empacado: Parado, emburrado.
Empachado: Quem está com gases no estômago.
Empacado: Parado.
Empacou: Parou, não sai do lugar.
Empalamado: Anêmico, pálido, amarelo.
Empanzinado: Quem comeu demais e não faz digestão.
Empanturrado: Está bem alimentado e não quer mais.
Empedrado: Endurecido.
Empetecar: Embelezar, enfeitar.
Empombar: Encrencar.
Emprasto: Preguiçoso, quem faz as coisas devagar.
Encabrestrar: Amansar os animais no Pantanal, colocar o cabresto.
Encafifado: Intrigado, preocupado.
Encafuado: Escondido.
Encafuar: Esconder-se ou demorar muito em algum lugar.
Encalistrar: Encabular, encafifar.
Encarangado: Paralisado pelo frio ou doença, aleijado.
Encarapitar: Subir em algo apressadamente.
Encarnar: Não largar.
Encasquetar: Pensar em uma única coisa.
Encastoar: Proteger a embalagem de algo enrolando papel.
Encorpar: Engrossar o caldo, engordar.
Encosto: Companhia indesejável ou onde se encosta.
Encravado: Enfiado, no meio.
Encrespar: Reagir em desagrado a alguma atitude.
Enfarada: Enjoada.
Enfarruscado: Tempo fechado, nublado, brusco.
Enfatiotada: Bem vestida.
Enfastiado: Sem apetite, sem fome.
Engabelar: Enganar, enrolar, alguém.
Enganchar: Prender, dependurar, ficar.
Engatar: Chegar perto de moça com quem pretende conversar.
Engomar: Passar a roupa a ferro, alisar a roupa.
Engodar: enganar.
Engrasando: Misturando, unindo, somando.
Engrasar: Misturar.
Engrouvinhado: Enrugado, amassado.
Engrouvinhar, engruvinhar: Amassar.
Enleiar: Enrolar, prender em algo.
Enleiado: Envolvido.
Enricar: Enriquecer, ficar rico.
Enrosco: Alguém que só atrapalha ou algo enrolado.
Entalado: Engasgado, entupido.
Entanguido: Com muito frio, morrendo de frio
Entojado: Enjoado, entediado, aborrecido, do espanhol “enojado”.
Entojar: Causar nojo (português culto).
Entonce: Então, e agora (espanholismo).
Entrevado: Sem poder andar.
Entroxar: enfiar, meter, introduzir, demais.
Exagerar em dar ou fazer algo.
Entrudo: Tradição de jogar água no outro, como brincadeira.
Entubigaitado: Cheio, com excesso de algo.
Enveja: Inveja.
Envejar: Ter inveja.
Enveja de ...: Ter inveja de ....
Enxarquerar: Fuxicar.
Enxarquerava: Fuxicava.
Enxerido: Intrometido.
Enxotar: Expulsar, mandar ir embora.
Esquisistomosis: Esquistossomose.
Erado: Adulto, com bastante idade.
Eriçado: , Arrepiado, entusiasmado, interessado.
Escalafobético: Coisa estranha, sem nexo ou sentido.
Escaldado: Saboroso caldo com farinha de milho e ovo.
Escancarar: Fazer demais.
Escancarado: Demais.
Escápula: Armador de rede.
Escarcéu, escaricéu: Escândalo, confusão, agitação, tumulto.
Escarrapachado: Espalhado, à vontade.
Escarreirar: Correr atrás de alguém.
Escornado: Cansado demais.
Escorraçar: Expulsar com violência, ou desprezo..
Escrava: Bracelete, pulseira.
Escuitar: Escutar.
Escurraçar: Expulsar alguém com raiva.
Esgoelando: Gritando demais.
Esgravatar: Ciscar, remexer.
Esgualepado: Desarrumado.
Espalhafatosa: Exagerada demais.
Espandogado: Desengonçado, desarticulado.
Espaventado: Desastrado, desajeitado.
Espelho: Doce de mamão verde, em calda, cortado em lascas finas.
Espeloteado: Danado, amalucado.
Espera: Local usado pelos caçadores para aguardar a caça.
Especular: Perguntar com interesse e insistência.
Espevitadeira: Apagador de borrão de vela.
Espinha: Refere-se à parte óssea do peixe. Diferente de espinho.
Espinhaço: Coluna vertebral.
Esporear: Meter esporas na barriga do animal.
Estabanado: Sem controle, desajeitado, derrubando tudo.
Esteira: Espécie de tapete feito com hastes de “pripiri”.
Esterco: Estrume animal.
Estilingue: Funda, com forquilha de madeira e borracha.
Estirão: Cumprimento da corda, grande distância.
Estoporado: Vítima de forte calor.
Estorvar, estrovar: Atrapalhar, prejudicar.
Estorvo: Problema, empecilho.
Estouvado: Alguém desajeitado, desastrado.
Estragado: Podre.
Estrambótico: Estranho, esquisito, ridículo.
Estrilar: Zangar.
Estrisiado: Muito magro.
Estropiado: Cansado ao extremo, esgotado.
Estropício: Algo ou alguém que incomoda.
Estucado: O perdedor sem condições de se recuperar.
Estufado: Inchado.
Esturricar: Sapecar, queimar.
Esturricado: Queimado.
Estúrdio: Extravagante, exagerado.
Esturro: Grito forte, urro da onça acuada.
Etagér: Armário de sala de jantar.
Expediente: Disposição ou capacidade para fazer algo.
Experiente: Benzedor, curandeiro.
Exportador: Grande comprador de diamantes.

PALAVRA COMPOSTA
Embandeirado com ...: Acompanhando alguém, seguindo alguém.
Embandeirar com ...: Acompanhar alguém, seguir alguém.
Em riste: Em pé, a prumo, pronto para enfrentar.
Erva de bicho: Planta medicinal usada para combater verme.
Escorar a porta: Pôr alguma escora na porta.
Escora cavaleiro: Gado que avança sobre pessoas.
Está afrontado: Está cansado, ofegante.
Está amuado: Está triste.
Está cheio de...: Bem alimentado de..., já não suporta mais.
Está cheia: Está grávida.
Está com comichão de...: Está com vontade de fazer alguma coisa.
Está empachado: Está com o estômago cheio, comeu demais.
Está entanguido: Está com frio, gelado.
Está esgarçado: Está rasgado.
Está escarrapachado: Está à vontade.
Está extraviado: Está perdido.
Está gramando: Está sofrendo, está perdendo.
Está manjado: Está conhecido, pejorativamente.
Está ovando: Está sentado há muito tempo, está observando de longe.
Está podró: Está fraco, débil.
Está ralo: Fraco, fino, pouco gosto.
Está touceira: Está metido, pernóstico.

EXPRESSÕES REGIONAIS
E aí?: Então...Como é que fica?
Êh ah!: Ora. Expressão de espanto ou surpresa.
Eh, anzór de prego: Diz o pescador para quem perdeu o peixe.
E aí xô mano, tudo em cima?: Cumprimento amigável.
E aí xô mano, tudo djóia?: Cumprimento amigável, dos mais jovens.
É’ bem ai, assim: É logo aí, é perto, é logo em seguida.
E´ bocó: Pessoa acanhada, caipira, trouxa.
É cara de um, focinho do outro: Pessoas que têm fisionomias semelhantes.
É catinguento que nem gambá: Fede demais.
É chinchin: É pouco, é insignificante.
É’ dado: É de graça, grátis
É da lavra de...: É de autoria de...
É descansado demais: É tranqüilo, é preguiçoso.
É de lua: Fica mal humorado de uma hora para outra.
É’ digoreste: Tem boa pontaria, é exímio, acertou no alvo.
É largo demais: É felizardo, tem muita sorte.
E’mais chato do que rapa canoa: É chato demais.
É’ mato: É’ demais, muito.
Engrasar com...: Misturar com...
É um borra-botas: Não vale nada.
É um pancada: É abobalhado, idiota.
Emborcou o barco: Virou o barco debruço, afundou o barco.
Emenda o dia com a noite: Dormir até tarde.
Engasga gato: Comida ruim, mal feita.
Entregue aos máscaras: Sem apoio de ninguém.
É oreia: É burro, ignorante.
É quarta feira: É pessoa boba.

Erva de cão ou flor de cachorro: Cocô de cachorro.
Esse bicho: Dito popular a respeito de cobra, evitando dizer o nome.
Escrever no cascalho: Procurar pedra preciosa no cascalho.

Escorrega que nem quiabo em boca desdentada: Escorregadio demais.
Esse um: Esse alguém, esse tal, sem citar o nome.
Espanta Coió: Pequeno explosivo, acionado por lixa.
Espia lá: Olha lá, veja lá.
Espia só!: Só faltava esta.
Esse guri não sossega: Esse guri não para, não se aquieta.
Está afim de: Está querendo alguma coisa.
Está arrumado: Quem está em boa situação financeira.
Está bem fresco: Está tranqüilo, na boa, sem problemas.
Está caju por ...: Está apaixonado por...
Está com a avó atrás do toco: Está desesperado, sem rumo.
Está com feição alegre: Está alegre, feliz.
Está com feição triste: Está triste, infeliz.
Está com ovo atravessado: Irritado, zangado.
Está com cólica: Está com dor de menstruação.
Está com quentura: Está preocupada, inquieta.
Está com tanchim?: Quando alguém está sem sossego.
Está de bicho carpinteiro no corpo: Não consegue parar.
Está de bom tamanho: Na medida ideal.
Está de calundú: Está de mal humor.
Está de chico: Está menstruada.
Está de grande: Está importante.
Está de espinhela caída: Dores no tronco ou na espinha dorsal.
Está de nariz furado por...: Está apaixonado por...
Está encrespado: Está com raiva.
Está de pendenga com ... : Está de briga com ...
Está desmanchando: Está se acabando.
Está inteirado: Está cheio, não suporta mais.
Está com ovo virado ou está com ovo atravessado: Está irritado, zangado.
Está de veneta: Está mal humorado.
Está de suêto: Está de folga.
Está empacado que nem uma mula: Emburrado, nada faz.
Está engasgado: Não define, não resolve.
Está entregue: Está sem ânimo.
Está escuro que nem breu: Está escuro demais.
Está fazendo boca para comer: Está com vontade de comer.
Está gorando: Está desejando algo ruim, que não dê certo.
Está mordido: Está com raiva.
Está na vidraça: Mulher sem anágua, contra o Sol.
Está no banho: Está tomando banho.
Está jegue: Está mal vestido.
Está jururu: Está triste, calado.
Está largado: Está separado matrimonialmente.
Está larido: Está faminto, esfomeado, insaciável.
Está moído: Está cansado demais.
Está parado: Está desempregado, sem fazer nada.
Está por um quero: Está faltando pouco para fazer algo.
Está ressecado: Está com prisão de ventre.
Está um (num) bagaço: Está cansado, está esgotado.
Está que só (nem) criquiri: Não dá sossego.
Está supitado: Comeu demais.
Está um bacheiro: Está sujo, surrado.
Está um caco: Está cansado demais.
Está um forno: Está quente demais.
Está variado: Não está falando coisa com coisa.
Está voando: Está distraído.
Estava borrando de medo: Estava com medo.
Estou que nem capa da gaita: Cansado, em péssimo estado, usado demais.
É bem ai: Mesmo com o destino é bem longe.
É cha mãe: É a sua mãe.
É um bate bruaca: Quem anda atôa, sem rumo.
É um bom será: Quem acha que tudo está bom.
É um caça mel: É uma pessoa que tem dificuldade de ler.
É um cão chupando manga: Refere-se a alguém feio demais.
É um chão: É bem longe.
É um quarta feira: Palerma, pateta.
É uma anta: É ignorante, é bruta.
É o mesmo que mandar lembrança para quem não conhece: Não vai dar em nada.

LETRA F
PALAVRAS SIMPLES
Faiscador : Comprador de pedras preciosas no garimpo.
Famaná: Famoso, importante.
Fanchono: Homossexual ativo.
Fanho: Fanhoso.
Farnel: O mesmo que matula, comida para viagem.
Fatiota: A melhor roupa.
Fedegoso: Planta medicinal ótima para combater verme.
Ferrotoada: Picada de inseto, cutucada.
Fervedouro: Rebuliço, agitação, confusão.
Famaná: Pessoa importante.
Ferpa: Dinheiro.
Festar: Festejar, comemorar.
Filosofina: Nome de uma lancha de Apolônio Bouret, fazendeiro do Pantanal e comerciante do Porto, em homenagem à filha, com esse nome.
Fincar: Enfiar, introduzir.
Finuínho: Algo muito fino.
Figa: Defesa religiosa, com sinal da cruz.
Fiofó: Ânus.
Flanar: Sair sem rumo certo.
Flober: Nome popular de espingarda antiga, calibre 22.
Fogaréu: Muito fogo.
Folia: Grupo de pessoas tirando esmolas para festa de santo.
Foló: Frouxo, largo, folgado.
Forje: Buraco para caçar animais.
Formar: Ficar o peão ao lado das rezes.
Formalidade: No acerto, no acordo.
Fortidão: Exemplo de fortaleza, de força física.
Foqueteira ou fouqueta: Mulher assanhada.
Foveiro, fouveiro: Desbotado, quase sem cor.
Francisquito: Biscoito de trigo, com ovos, banha e leite.
Franzido: Enrugado.
Freje: Briga ou bagunça, baileco.
Frescal: Carne salgada, ainda não completamente seca.
Fresco: Metido.
Friagem: Período de frio entrecortado de baixa temperatura.
Friajão: Quando o frio é muito forte.
Frontear: Ficar por perto, aproximar-se de...
Fruita: Fruta.
Fuá: Desordem, confusão.
Fuça: Rosto, cara, focinho.
Fuçar: Revolver, remexer, cutucar, alguma coisa.
Fuero: Petrecho de carro de boi.
Fufu: Pulmão.
Fumo: Fita preta, de luto, no braço do paletó.
Funda: Estilingue, com forquilha, borracha e couro.
Furrundu, furrundum: Saboroso doce de mamão verde com rapadura e gengibre.
Furupa: Festa de arromba.
Fusco: Opaco, branco sujo, escuro.
Fuxicaiada: Fuxico demais.
Fuxico: Mexerico.
Fuzarca: Bagunça.
Fuzilando: Relâmpagos demais, com muitos trovões.
Fuzilar: Relampejar, ação de descargas elétricas no céu.
Fuzilo: Relâmpago.
Fuzuê: Confusão, bagunça.

PALAVRA COMPOSTA
Fazer cubu: Fazer feitiço.
Fazer um estirão: Caminhar até longe.
Feijão empamonado: Feijão cozido e engrossado com farinha.
Fêmea Coberta: Fêmea prenhe.
Finca-finca: Jogo infantil, com haste de ferro na areia.
Foi pinto: Foi pouco.
Fôrma de diamante: Tipo de pedra que é sinal de existir diamante.
Fruta-de-vez: Fruta quase madura.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Fala qui nem uma matraca: Fala demais, sem parar.
Falar pesado: Falar se excedendo no sotaque cuiabano.
Falta de modos: Sem educação.
Faz tempo: Há muitas horas.
Fazendo cera: Fazendo de conta que está trabalhando.
Fazendo que nem...: Fazendo igual a...
Fazer birra: Quando a criança chora e esperneia no chão.
Fazer chichi: Evacuar, obrar.
Fazer chacota: Ironizar, rir.
Fazer de carreira: Fazer com urgência.
Fazer de conta que...: Fingir que...
Fazer um de tudo: Fazer de tudo.
Fazer figa: Cruzar o dedo para evitar o mal.
Fazer fita: Querer aparecer, chamar a atenção.
Fazer fidúcia: Fazer cerimônia, ser formal.
Fazer fiúza: Esperar algo.
Fazer micage: Exagero de gesto, imitação, careta.
Fazer o comer: Fazer a comida.
Fazer o quilo: Costume de descansar após o almoço.
Fazer o saco: Nos garimpos, quando o “meia-praça” recebe a provisão de comida.
Fazer pirraça: Intrigar, agredir.
Fazer um de tudo: Fazer de tudo.
Fazer um gato: Fazer uma ligação clandestina.
Fazer um rasgo: Gastar acima do normal.
Feio que nem cão chupando manga: Horrível.
Feito dois de paus: Ficar em pé sem fazer nada.
Fica quieto: Não espalhe.
Ficar alterada: Ficar com raiva.
Ficar com cara de lata: Ficar sem graça.
Ficar com cara de tacho: Ficar sem graça.
Ficar de déu-em-déu: Ficar de um lugar para outro, sem rumo certo.
Ficar de espreita: Ficar na espera, ficar aguardando.
Ficar de gatinho: Estar cansado demais, andar devagar.
Ficar de guarda: Ficar de plantão.
Ficar de "ora veja": Ficar sem receber algo, ser enganado.
Ficar jururu: Ficar triste, Ficar quieto.
Ficou demás de fraco: Ficou muito fraco.
Ficar besta: ficar admirado.
Ficar esperto: Ficar atento.
Ficar mordida de raiva: Ficar com muita raiva.
Ficar no ora, veja...: Ficar na mão, ganhar e não levar.
Ficar pasmado: Ficar surpreendido.
Ficou fofo de esperar: Esperou demais.
Ficou jururu: Ficou triste.
Figa!: Deus me livre.
Filar a bóia do vizinho: Comer na casa do vizinho.
Filho derradeiro: Filho caçula.
Filho natural: Filho fora do casamento.
Filho torto: Filho fora do casamento, mas reconhecido.
Foi afrontado: Foi insultado.
Foi um Deus nos acuda: Foi uma confusão, um tumulto, uma agitação.
Foi um tropé...: Foi uma confusão...
Frechar no serviço: Concentrar todo o esforço no serviço.

LETRA G
PALAVRAS SIMPLES
Gafeira: Coceira em geral.
Gaferenta: Quem está com gafeira.
Gaitada: Gargalhada ou risada exagerada.
Galigueira: Doença venérea.
Garapa: Caldo de cana.
Gato: Quem contrata trabalhadores para seringais, fazendas ou garimpos.
Galinheiro: Nas touradas cuiabanas, era a parte inferior dos camarotes.
Galpão: Alojamento de peões nas fazendas.
Gambiarra: Ligação clandestina.
Gambira: Negócio, comercialização.
Gancharia: Mato demais.
Gandáia: Farra.
Gangento: Quem é vaidoso demais, cheio de si.
Gangrena: Morte e apodrecimento dos tecidos de qualquer parte do corpo.
Ganzá: Instrumento musical usado no Cururu, feito de bambu.
Garimpeiro independente: Garimpeiro que trabalha por conta própria.
Garité: Barco grande nos rios pantaneiros, corruptela de igaraté.
Garupeiras: Cordas finas de couro para amarrar a traia do vaqueiro do Pantanal.
Garrancho: Caligrafia ruim.
Garrar: Agarrar.
Garrocha: Pau roliço pontudo que o “capinha” usava nas “Touradas Cuiabanas”.
Garrote: Novilho de dois a quatro anos.
Garrucha: Revólver antigo, muito usado no Pantanal.
Gasimira (pronúncia de Algarve): Casimira.
Gasolina: Pequeno barco a motor, no Pantanal, movido a gasolina.
Gasóleo: Antiga denominação do óleo diesel no Pantanal.
Gasosa: Refrigerante ou água com gás.
Gatanhar: Arranhar, namorar fora do limite.
Gavar, ou gabar: Elogiar ou valorizar uma pessoa, alguma coisa.
Gazeteiro: Quem falta à aula ou ao trabalho, para vadiar.
Ginete: Quem é bom para domar cavalos e burros.
Girau: Mesa improvisada, usada na zona rural.
Gorar: Não dar certo, não realizar, prejudicar.
Gordurame: Comida, bóia.
Gramar: Sofrer, no sentido figurado.
Gravatá: Planta espinhenta do Pantanal, ou local de difícil acesso.
Grocochó: Pessoa desanimada.
Grude: Mistura cozida de polvilho e água.
Grupiara: Depósito natural de cascalho de diamante.
Guacha: Feito de couro e madeira para "tocar" ou "domar" animais.
Guacho: Animal criado por peões. Fica manso quando cresce.
Guaiaca: Cinto de couro cru onde o peão coloca arma e munição.
Guaiaco: Porco que não é castrado.
Guampa: Vasilha feita com chifre de rês para se tomar água e mate chimarrão
(teréré).
Guarda: De couro curtido, protege a perna do pantaneiro.
Guenzo: Torto, fora do prumo, inclinado.
Guia: É o peão que vai à frente da boiada, vaquejada. É o mesmo que ponteiro.
Guisado: Carne seca picadinha, cozida com mandioca, abóbora e maxixe.
Guri: Menino.
Guria: Menina.
Gurizada: Meninada.
Gurupeiro: Vegetação espinhosa nas margens dos rios.
Guspir: Cuspir.

PALAVRAS COMPOSTAS
Gado alongado: gado bravio que fugiu do rebanho no Pantanal Mato-grossense.
Gado baguá: gado selvagem que vive no Pantanal Mato-grossense.
Gancho de carne: Gancho usado para pendurar carne.
Garimpo queimado: Garimpo exaurido.
Gavião-Caramujeiro: Gavião de porte médio, corpo preto e faixa branca na cauda.
Guaraná em bastão: Guaraná natural feito pelos índios.
Guaraná espumante: Guaraná tipo refrigerante.
Guaraná ralado: Guaraná em pó, ralado do bastão.
Guaranázinho: Bebida tradicional (três colheres de açúcar e um de pó de guaraná).
Guardar dieta: Dieta de parto ou de alguma doença.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Garganta arranhando: Garganta irritada.
Gavião-Caramujeiro: É um gavião de médio-porte.
Gente de...: Usado com sentido coletivo, não pessoal.
Gente de quem?: Pertence a qual família?
Gente de onde: Vem de que lugar?
Gente da Cidade: É do centro de Cuiabá (Primeiro Distrito).
Gente de Porto: É do Porto (Segundo Distrito).
Gente do outro lado do rio: É de Várzea Grande (Antigo Terceiro Distrito).
Gente nossa: É de família mato-grossense.
Gente de fora: Não é de Mato Grosso.
Gente da beira do Rio: Ribeirinho.
Gente do Rio Acima: Da Guia, Acorizal, Rosário Oeste...
Gente do Rio Abaixo: De Leverger, Barão de Melgaço...
Gente da Serra Acima: De Chapada dos Guimarães...
Grelar os olhos: Observar bem, olhar fixamente.

LETRA H
PALAVRAS SIMPLES
Haveres: Bens de fortuna.

PALAVRAS COMPOSTAS
Hora do chá: Hora do café da manhã.
Hora de relógio: Hora registrada em relógio, e não a do Sol.
Hora do Ângelus: Ato religioso católico, às 18:00 horas.
Horror de gente: Muita gente.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Hum – hum: Sim ou não, conforme a rapidez do falar.

LETRA I
PALAVRAS SIMPLES
Imbicar: Aportar, chegar.
Imitança: Imitação.
Ináugua, anágua: Roupa íntima do vestuário feminino (origem no Mirandês).
Incomodada: Está menstruada.
Incômodo: Menstruação.
Incumbências: Serviços, tarefas, responsabilidades.
Incutido: Cismado, em dúvida.
Incutição:Cisma.
Incutir: Cismar.
Inda: Ainda.
Inflar: Encher.
Influído: Animado, interessado.
Inhanha: Situação difícil.
Inhaca: Mal cheiro, odor ruim.
Inquirir: Perguntar.
Inquizilada: Preocupada.
Instalar-se: Ocupar coisa ou lugar que não é seu.
Intanguido: Encolhido pelo frio.
Inteirar: Ficar sabendo de tudo.
Inteiro: Todo animal macho não castrado.
Intendente: Prefeito municipal.
Interar: Completar.
Invisível: Grampo de cabelo.
Insosso: Sem graça, sem gosto.
Investir: Atacar, avançar.
Invernada: Área de uma fazenda para garantir alimento do gado.
Invocado: Criador de caso.
Irmandade: Refere-se à irmandade de sangue, familiar.

PALAVRAS COMPOSTAS
Ir à breve: Ir ao sanitário, ir ao banheiro.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Ioseilá...: Não sei...
Intá!: Toma, como interjeição.
Intestino solto: Diarréia.
Introchar guela abaixo: Forçar alguém a fazer mais do que pode.
Ir no mato: Evacuar, obrar, na zona rural.
Ispiaí...: Olha ai...

LETRA J
PALAVRAS SIMPLES
Jabiraca: Mulher maldosa.
Jacá: Grande cesto de palha e taquara, para guardar peixe.
Jacote: Seriguela do Nordeste plantada em Mato Grosso.
Jacuba: Auxiliar desarmado do toureador nas Touradas Cuiabanas.
Jacuba: Cascalho rejeitado já misturado com areia e outros resíduos.
Jacuba: Bebida feita com farinha de mandioca, com água e açúcar ou rapadura.
Jangador: Quem carrega e descarrega as embarcações.
Janota: Pilintra, almofadinha.
Janta: O mesmo que jantar.
Jaraguá: Capim para pasto muito usado em Mato Grosso.
Jardim: Designação histórica do Jardim Alencastro.
Jegue: Mal vestido, que veste roupa mal feita ou grande demais.
Jegue: Burrico.
Jimbre: Dinheiro, moeda.
Jirau: Varas sobre estacas e forquilhas, para dormir ou guardar alguma coisa.
Jujo: Qualquer planta medicinal.
Jururu: Triste, cabisbaixo, quieto, acabrunhado.

PALAVRAS COMPOSTAS
Já-começa: Espécie de coceira constante.
Jogo de loto: Jogo de cartelas, de víspora.
Juntar cisco: Juntar lixo de pequeno tamanho.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Jáprecei: Já consultei o preço.
Já cansei de... : Já repeti demais de..., já insisti demais de...
Joga a tarrafa noutro lugar: Não se meta.
Jogar para quebrar: Ser desleal.
Junta de bois: Parelha de bois para puxar carreta, que pode ter várias juntas.

LETRA L
PALAVRAS SIMPLES
Laceado: Frouxo.
Lacear: Afrouxar.
Ladino: Esperto, sabido, inteligente, vivo.
Laia: Identificação pejorativa.
Lambança: Malandragem.
Lambido: Sem vergonha.
Lambiscar: Beliscar algum tipo de comida ou doce.
Lambisgóia: Mulher sem vergonha, atrevida, intrometida.
Lamparina: Para iluminar, com querosene.
Lancha: Embarcação a vapor, movido por rodas e pás laterais.
Lançar: Vomitar.
Lançando: Vomitando.
Largo: Campos pantaneiros com muito capim e poucas árvores.
Lasquear: Talhar a madeira.
Latrina: Instalação sanitária antiga, no fundo do quintal.
Lavadeira: Onde se lava o cascalho, à beira do rio.
Lavrado: Jóia de ouro maciço.
Leblina: Neblina, chuvisco, névoa baixa.
Leicença: Licença.
Leitear: Semelhante a puxar saco, tirar leite da vaca.
Lerdo: Descuidado, vagaroso.
Leseira: Quando não sabe decidir ou fazer alguma coisa.
Levado: Danado, travesso.
Leviano: Irresponsável.
Licenciosidade: Imoralidade.
Limbo: Para onde iriam as crianças mortas sem batismo.
Limboso: Lodo esverdeado.
Lindeiro: Da fronteira, fronteiriço.
Lidar: Lutar, pelejar.
Listo: Esperto, astuto, ativo (origem no Mirandês).
Lixeira: Planta típica do Cerrado, nome de tradicional bairro de Cuiabá.
Lobó: Traíra.
Lograr: Enganar.
Lonjura: Longe demais.
Loro: Correia de couro para prender os estribos ao arreio.
Lubinhando: Com má vontade.
Lubuno: Cavalo escuro com mancha preta da crina até a cauda.
Luma: Lua.
Lufada: Peixes, em cardumes, subindo o rio, geralmente na primeira Lua Cheia de maio, procurando sua nascente e seu amadurecimento gonádico, seguindo-se a Piracema, quando descem o rio e desovam.
Lusquefusque: De pouca claridade.
Lustroso: Brilhoso.

PALAVRAS COMPOSTAS
Lago do Manso: Formado pelas águas da represa do Rio Manso, em Chapada dos Guimarães, sendo duas vezes maior do que a Baía da Guanabara.
Leite engrossado: Leite com maizena ou aveia.
Leite Queimado: Leite com açúcar queimado.
Leite talhado: Leite cortado, leite coalhado.
Leva-e-traz: Fofoqueiro.
Levado da breca: Danado demais.
Liceu Cuiabano: Primeiro colégio público de Cuiabá com o curso secundário, hoje chamado Escola Estadual Liceu Cuiabano Maria de Arruda Müller.
Lugar ermo: Lugar distante.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Lá uma vez: Uma vez ou outra.
Lambedor de botas: É o mesmo que puxa-saco.
Lançar a sorte: O toureador, das Touradas Cuiabanas, ferindo o touro.
Lançar fora: Jogar fora.
Larga disso: Deixa disso.
Larga desse: Deixa disso.
Larga de besteira: Larga de tolice.
Larga de mão: Não faça isto, deixa disso, desista.
Larga de moage: Larga de sem graceira.
Larga de sem graceira: Deixa de chateação.
Larga disso: Deixa disso, repreensão.
Lavagem de Santo: Tradição de lavar a imagem de São João no rio.
Levou os córnos: Saiu-se mal, levou a pior.
Lavra de diamante: Local onde existe diamante.
Levado da breca: Travesso, danado.
Levar um coça: Apanhar.
Levar uma cuiada: Procurar algo ou alguém e não encontrar.
Levantamento de mastro: Hastear a bandeira de uma festa religiosa.
Levou os cornos: Complicou tudo.
Limpa Banco: Nome de um tradicional Rasqueado Cuiabano.
Limpa banco: Todos dançam na festa e os bancos ficam vazios.
Logo ali: Bem ali.
Lusco-fusco: Claro-escuro, meia claridade.
Lufa-lufa: Luta, disputa.
Lufada de vento: Rajada de vento ou pequena ventania.
Lutar com...: Trabalhar com...

LETRA M
PALAVRAS SIMPLES
Macambúzio: Tristonho.
Maçã: No lugar de mansão, residência luxuosa.
Macega: Pasto natural do Pantanal Mato-grossense, moita.
Macegar: Pastar no Pantanal Mato-grossense.
Macharrão: Nome dado no Pantanal ao macho da onça.
Machorra: Vaca estéril, geralmente mais gorda do que o normal.
Madorna: Sonolência.
Magricela: Muito magro.
Malemá: Mais ou menos.
Máquerência: Inimizade.
Maludagem: Comportamento de quem é metido a valente.
Maludo: Metido a valente.
Malhada ou maiada: Onde o gado passa a noite.
Mambanceiro: Trapaceiro.
Mamparrear: Remanchar, fugir de compromissos.
Mamote: Bezerro desmamado, com menos de um ano.
Manancial: Fonte.
Mandinga: Feitiçaria, bruxaria.
Maneia: Tira de couro cru com argola, que o peão leva na cintura.
Mangava: Peão ruim, no Pantanal.
Mangueiro: Cerca do curral.
Maninho: Quem é estéril, não se reproduz.
Mano: Mão na bola.
Mangueba: Quem é manco, tem uma perna mais curta.
Mangueiro: O mesmo que curral.
Manquetola: Quem anda mancando da perna.
Mantelar: Ocupar grande parte da área.
Mantimento: Suprimento de comida, víveres.
Marandová: Tipo de lagarta típica de Mato Grosso.
Marcha: Dia de viagem com uma boiada.
Marinheiro: Arroz com casca ou outro objeto encontrado no arroz limpo.
Marolas: Pequenas ondas dos rios pantaneiros.
Marombar: Enganar, enrolar.
Marrão: Pato, macho da pata.
Marruá: Touro bravo.
Marruco: Touro muito velho.
Marrudo: Mais forte do que comum.
Máscara: Personagem tradicional do Carnaval Cuiabano que escondia o rosto.
Máscaras: Nas “Touradas”, brincavam com o boi já cansado.
Matiri: Sacola de pano com alça longa, usada a tiracolo.
Matraca: Antigo instrumento sonoro, de madeira, usado na Sexta Feira Santa.
Matraca: Pessoa que fala sem parar, taguarela.
Matula: Comida preparada para viagem.
Matungo: Grande, enorme.
Meganha: Referindo-se a alguém pejorativamente.
Meleta: Tamanduá-mirim, pequeno.
Melindrosa: Moça delicada.
Mequetrefe: Não é bom, não tem valor.
Merejar: Gotejar, transpirar.
Mexerico: Fuxico
Micaje: Imitar alguém, fazer careta.
Micareme: Carnaval.
Micha: Pequena.
Micharia: Coisa de pouco valor, sem valor.
Michinga: Pequena mosca que sobrevoa frutas podres.
Miolim ou neolim: Sapato de lona, com sola de borracha.
Mimoso: Pasto macio encontrado nas vazantes.
Minador: Nascente de curso de água.
Minguado: Pouco, pequeno.
Mirrado: Magro, fraco, frágil.
Mistura: O que acompanha o arroz e o feijão.
Mixórdia: Algo mal arrumado.
Mixto: Com “x”, um dos melhores times de futebol de Cuiabá.
Moage: Conversa demorada ou atitude sem valor.
Moagento: Demora demais, conversa muito.
Mocho: Banco pequeno, sem encosto e de apenas um lugar.
Mocho: Caburé, um tipo de coruja pantaneira.
Mocho: Gado sem chifres.
Moído: Cansado, com dor no corpo.
Mojar: Por o bezerro para mamar, antes de leitear.
Molóide: Preguiçoso, fraco.
Molher: Mulher.
Monarca: Quem é importante, dominante.
Monchão: Monte de terra, parte alta.
Mondrongo: Grandalhão, desajeitado.
Montoeira: Muita coisa.
Moranga: Tipo de abóbora, de girimum.
Moringa: Vasilha de barro para guardar água.
Montaria: Canoa muito pequena, para uma só pessoa.
Montueira: Muito, grande quantidade.
Monturo: Um amontoado de qualquer coisa.
Morcego: Garimpeiro preguiçoso.
Morgado: Apertado.
Morgar: Dormir, descansar.
Morgano: Fazendo hora, aguardando.
Mornidão: Calor.
Mujica: Ensopado de pintado, em pedaços, com mandioca.
Muquifo: Lugar sujo, desarrumado.
Muquirana: Quem é conhecido por pão-duro, miserável.
Mundéu: Grande quantidade, fartura. Tradicional bairro de Cuiabá.
Murciço: Maciço.
Muxiba: Pelanca sem carne, quem é “pão-duro”.
Muxibenta: Pelancuda, mole, magra.
Muxirum: Trabalho realizado em grupo, em mutirão.

PALAVRAS COMPOSTAS
Machucador de alho: Socador de alho.
Mão de Ouro: Doceira ou cozinheira de qualidade.
Mão de pilão: Socador de madeira usado no pilão.
Mão Pelada: Animal semelhante ao bicho preguiça.
Mandioca seca: Mandioca macia.
Mandioca aguada: Mandioca de qualidade inferior, dura.
Manta de carne: Pedaço de carne distribuída em corte plano.
Mantear a carne: Cortar a carne e salgá-la para secar ao Sol.
Mata-burro: Pontilhões que impedem a fuga de animais.
Matar aula: Faltar à aula.
Matar-bicho: Beber um gole de pinga.
Matar peixe: Pescar.
Mato sujo: Muito mato.
Minhocão do Pari: Lenda cuiabana, na Passagem da Conceição.
Molho de...: Feixe de...
Morro da Luz: Atual Bairro dos Bandeirantes, antigo Morro da Praínha.
Mulher dama: Meretriz.
Muro de taipa: Muro construído com terra socada, umedecida, entre formas.

EXPRESSÕES REGIONAISMãe Bonifácia: Líder negra, com grande prestígio, que protegia escravos fugidos.
Mãe-de-Lua: Quem é cabeçudo, quem tem cabeça grande.
Mãe-de-peixe: Tipo de libélula também conhecida como papa-mosquito.
Mais chato que nem canoa: Chato demais.
Mais impacado do que mula do Bate Bruaca: Está devagar demais.
Mais enrugado do que maracujá de gaveta: Enrugado demais.
Mais parecia uma taquara: Estava magro demais.
Mais sujo do que pau de galinheiro: Sujo demais.
Malajambrado: Mas vestido, mal arrumado.
Malemá tenteando: Mais ou menos.
Mal de São Lázaro: Mal de Hansen, hanseníase.
Mal empregando: Por falta de outra palavra.
Mancha de diamante: Onde existe muito diamante.
Mão de estuque: Jogar tudo, para ganhar ou perder.
Marcar gado: Identificar o gado com a marca de ferro da fazenda.
Más quá...: Não acredito...
Mata bicho: Aperitivo.
Matar peixe: Pescar.
Maxixe de Verão: É pequeno, isto é, brotou mas não cresceu.
Mea orêa aqui...: Quando se refere a alguém ao lado.
Medir ombro: Zangar.
Me dá um canto: Cinco crianças disputando um só canto.
Mesmo naipe: A mesma coisa, semelhante.
Me seguro com Santo...: Expressão de ato de fé ao Santo...
Meter o bedelho: Intrometer-se.
Metido a sebo: Metido a importante.
Milho granado: Espiga de milho sem falha.
Minhocão do Pari: Lenda cuiabana, na Passagem da Conceição.
Moça de posse: Moça rica.
Moça de teres e haveres: Moça rica e prendada.
Monchão de diamante: Grande concentração de diamante.
Montar no porco: Ficar sem graça, desconcertado.
Mostrar mojo: Quando o animal mostra sintomas que está perto de parir, do parto.
Muxica de peixe: Peixe ensopado, com mandioca.
Mulherzinha de calate ao caco: Mulher chata.
Mulher dama: Meretriz.
Murrinha: Mau humor.

LETRA N
PALAVRAS SIMPLES
Nambi: Sem cauda.
Nambu ou Inhamubu: Espécie de codorna.
Naquear: Mascar fumo de corda.
Negatófi: Não, nunca, jamais.
Nhá: Referindo-se a uma senhora.
Nhaca: Fedor, mau cheiro.
Nhanhá: Apelido.
Nhapar: Furtar, pegar o que não é seu.
Nhato: Pequeno, gordo e de nariz (focinho) curto.
Nhente: O mesmo que não, nada.
Nicho: Oratório antigo.
Nhô: Referindo-se a um senhor.
Nhonhô: Apelido masculino.
Novel: Semelhante a novo.
Novidadeira: Quer saber de tudo e faz mexerico.

PALAVRAS COMPOSTAS
Na batida: No rastro certo.
Nessa quadra: Nessa época.
Ninhal de Seca: Onde as aves vivem no período da seca.
Ninhal das Águas: Ninho de aves no período das águas.
Nó cuiabano: Trança feita na ponta do laço, onde se prega a argola.
No agarro: Namoro agarrado demais.

No gôto: Na parte interna da garganta.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Na chincha: Quando se faz algo certo, com seriedade.
Na chincha: Meio que o vaqueiro usa para amarrar a rês bravia e prender o laço na chincha da sua montaria.
Na fatiota: Elegante.
Na formalidade: Tudo no correto.
Nada a ver: Não parece com nada.
Não dar conta: Não conseguir, não fazer.
Não dar ouvidos: Não escutar, não dar atenção.
Não dar pitaco: Não se intrometer.
Não dar trela: Não dar atenção, não ligar.
Não é boa bisca: Pessoa sem qualidade, o que não presta.
Não é para seu bico: Você não merece, não está à sua altura.
Não estar nem somando com...: Não estar ligando com...
Não estar nem aí...: Não estar interessado em saber...
Não é boa bisca: O que não presta.
Não passou batido: Não passou desapercebido.
Não perde nem festa de aniversário de boneca: Vai a todas as festas.
Não pregar os olhos: Não dormir.
Não quero nem ovos: Estou satisfeito.
Não tá nem ai prá paçoca: Não liga para nada.
Não vale um cinquinho: Não vale um tostão, não vale nada.
Não vale um pequi roído: Não tem valor.
Nas águas: Período de chuvas, a partir de outubro.
Nas grimpas: No alto, no máximo.
Nem abanou: Saiu sem se despedir.
Nem Deus há de deixar: Igual a nem Deus há de permitir.
Nem...não...: Não é não...
Nem sim...nem não: Espere uma resposta.
Nem num sei disso: Não sei disso.
Nem somou: Nem deu atenção.
Nhor-não: Não Senhor.
Nhor-sim: Sim senhor.
Nó cego: Quem é astuto, enrolão.
Nó-de-porco: Que nunca desata.
No firme: Em local alto, no Pantanal, difícil de ser inundado.
No grito: Falando forte, na raça.
No gueto: Calado, aguardando.
Num tapa: O mais rápido possível.
Num tem doença nenhum: Está sadio.
Num vô co cha cara: Não gostei de você.
Num tô nem somando com...: Não estou ligando para...

LETRA O
PALAVRAS SIMPLES
Obra: Fezes.
Obrar: Evacuar.
Obração: Diarréia.
Ocado: Nada tem no interior, ôco.
Oco: Sem conteúdo, vazio, sem nada.
Ofício: Ocupação, emprego, atividade.
Opilado: Pálido.
Orchata: Refresco de semente de melancia socada ou moída.
Ornando: Combinando.
Ornar: Combinar, embelezar.
Ouriçar: Assanhar.
Ouriçado: Interessado, empenhado, assanhado.
Ovando: Está sentado há muito tempo.

PALAVRAS COMPOSTAS
Oitão da casa: Parte lateral da casa.
Olho empapuçado: Olho inchado de dormir.
O moço: Refere-se a alguém do sexo masculino.
Os pessoais: As pessoas.

EXPRESSÕES REGIONAIS
O acontecido: O que já ocorreu, aconteceu.
Oia aqui...: Acompanhado do tradicional gesto, dando banana alguém.
Olho de peixe morto: Com sono, com olho parado.
Olhos gázeos: Olhos claros, azulados.
Onde já se viu!: Inacreditável.
Onde tem pousado: Onde tem se alojado.
O Quá?: O que, como? Não acredito.
O peixe tá assanhado: Diz que o pescador antecipando enchente no rio.
Ora de que!: Chega.
Ora, vá tomar mate...Juviu?: Mandando alguém adiante, com o "juviu" irado.
Orelha de tacho: Orelha grande e saliente.
Os mais antigos: Os mais velhos.
O rio deu praia: O nível da água baixou e apareceu a areia da beira do rio.
O tempo está feio para chover: Choverá logo.
O tempo virou (ou mudou): Vai ficar frio.
Ôh verdade!: Expressão de espanto, que coisa...

LETRA P
PALAVRAS SIMPLES
Pachola: Pilintra, almofadinha.
Pacová: Preguiçoso.
Paçoca: Carne seca socada no pilão ou moída, misturada com farinha.
Pacuera: Refere-se a intestino, a abdome.
Padecer: Sofrer, enfrentar dificuldades.
Paieiro: Cigarro de palha.
Palanque: Mourão maior e mais forte para reforçar a cerca.
Palerma: Bobo, tolo.
Palestrar: Conversar.
Pampero: Briga, confusão, briga, agitação.
Pandolga, pandorga: Brinquedo de papel abaulado, sem cauda.
Panela: Cárie dental grande.
Pantâno: Área do Pantanal onde há mais inundação.
Pantanal: Pantanal Mato-grossense.
Pantaneiro: Proprietário ou pessoa ligada ao Pantanal.
Papagaio: Quem fala muito.
Papagaio, pipa: Brinquedo de papel, com face achatada, com cauda.
Paparicar: Proteger ou mimar demais.
Papudo: Mentiroso, contador de vantagem.
Paquete: Menstruação.
Parelheiro: Cavalo bom para correr em cancha reta.
Parelho: Terno, composto de calça e paletó.
Paroara: Bobo.
Parvo: Idiota, palerma.
Pasmado: Surpreendido, admirado.
Paspalhão: Abobalhado, tolo.
Passeio: Calçada.
Pastilha: Comprimido.
Pastinha: Franja de cabelo sobre a testa.
Pastorear: Cuidar dos animais no campo.
Pastorejo: Pastoreio.
Pecha: Defeito.
Pechisbeque: Falsificado.
Pedincheira: Pidona, pede demais.
Pegajoso: Quem é inconveniente, chato e insistente.
Pegar: Apanhar, trazer.
Peiada: Amarrada, presa.
Peitudo: Valente, corajoso.
Pelego: Couro macio de carneiro com lã, curtido com leite.
Peleja: Trabalho.
Pelota: Refere-se à bola usada pela criançada.
Pelote: Pedra pequena, arredondada, usada nas fundas.
Pelotear: Lançar pedra pequena com estilingue.
Pena: Torneira de água.
Pendenga: Desavença.
Peonada: Grupo de peões, no Pantanal.
Pepinar: Comer devagar, saboreando, às vezes até para fazer inveja.
Pepita: Pequena pedra de diamante ou ouro.
Pêra: Designação popular do peixe piraputanga.
Pereba: Ferida.
Perecer: Morrer, acabar, desaparecer.
Perjuízo: Prejuízo.
Perrengue: Lerdo, vagaroso; alcunha dos filiados do antigo Partido Republicano Mato-grossense (PRMG), formada com as iniciais do nome desse partido.
Pererecando: Caindo, tombando.
Pernada: Caminhada inútil, desencontro.
Perua: Caminhonete.
Pescoço: Garimpeiro que carrega carumbé cheio na cabeça.
Pêta: Mentira, logro, engano.
Pião: A parte mais profunda da bateia.
Pião: Brinquedo infantil.
Pião: Domador no Pantanal, trabalhador braçal, ajudante de vaqueiro.
Piaveira: Criançada.
Piçarra: Tipo de rocha estratificada, endurecida.
Picada: Trilha aberta na mata para demarcar área ou fazer cerca.
Pichar: Lançar, criticar, sujar.
Piché: Paçoca de milho torrado, socado, com açúcar e canela.
Picuá: Feito de um gomo de taquara para guardar diamantes.
Picuínha: Disposição para encrenca.
Picumã: Fuligem.
Pilado: Socado ou descascado no pilão, pálido.
Pilotar: Dirigir a canoa ou batelão, remando na popa.
Pilpita: Moça bonita.
Pilustrica: Alguém ou coisa pequena.
Pinchar: Jogar fora ou lançar alguma coisa.
Pingo: Cavalo bom de estrada.
Pinguço: Alcoólatra, tomador de pinga.
Pinguela: Ponte pequena de duas madeiras para atravessar rios.
Pinimba: Desacordo.
Pinicando: Coçando.
Pintado: Tipo de peixe grande, com pintas.
Pipão: Pipa grande.
Pipinar: Comer devagar.
Piquete: Invernada pequena, próxima da sede da fazenda.
Piquinininha: Bem pequena.
Piraim: Chicote comprido, de couro não curtido.
Pirizeiro: Vegetação aquática nas baías do Pantanal.
Piruá: Grão de pipoca que não arrebentou.
Pirracento: Briguento, criador de caso.
Pisado: Quando alguém está ferido, magoado.
Pisadeira: Pesadelo.
Pisadura: Machucadura no ombro de animal.
Pisar: Machucar o animal com o atrito da sela.
Piseiro: Briga, arruaça, agitação, baderna.
Pisqüila: Algo ou alguém pequeno.
Pitaco: Opinião, palpite, sobre alguma coisa.
Pitada: Tragada de cigarro de palha.
Pito: Repreensão.
Pituca: Cabelo feminino enrolado atrás.
Pituca: Ponta de cigarro.
Piúva: Ipê.
Pixé: Milho torrado, pilado, acrescentado de açúcar ou sal.
Plasta: Quem tem preguiça demais.
Poaia: Nome regional da ipeca ou ipecacuanha.
Podriqüeira: Mal cheiro, sujeira.
Podró: preguiçoso, molóide, sem interesse.
Polacos: Pequenas sinetas de bronze no pescoço de animais.
Polaqueiro: Cavalo mais velho, com polacos.
Ponhar: por, colocar.
Pongó: Tolo, bobo, idiota.
Pombear: Espionar, observar às ocultas.
Porqueira: De pouco valor.
Potó: Melado escuro de cana que escorre no fabrico artesanal do açúcar.
Pousar: Pernoitar, hospedagem rápida.
Pouso: Lugar destinado ao descanso.
Praça: Designação tradicional da Praça da República.



Pranchar: Cair fora, sair.
Praticar: Treinar.
Precata: Alpercata ou qualquer calçado rústico.
Pregar: Colar.
Pregunta: Pergunta.
Prenhe (prenha): Grávida, esperando cria.
Prepereca: Cambalhota.
Pripiri, ou peri-piri: Espécie de junco que nasce em terreno alagadiço.
Priquito: Pênis.
Priscar: Pular, sair rapidamente, ir embora logo.
Proclamar: Dizer.
Pulular: Saltitar.
Putefratas: Poderes.
Puxado: Qualquer acréscimo de área coberta em uma casa.
Puxador: De couro curtido, protege o vaqueiro quando puxar o laço.

PALAVRAS COMPOSTAS
Padecer de...: Sofrer de alguma doença, algum problema.
Paçoca de pilão: Carne seca socada no pilão com farinha de mandioca.
Pacu arrepiado: Com água quente, a escama fica arrepiada e a carne dura.
Pacu batuqueiro: pacu pequeno.
Pacu gameleiro: Pacu grande, em forma de gamela.
Pai-de-mel: Abelha pequena.
Pão mandi: Pão sovado, com características cuiabanas.
Pãozinho do Senhor Divino: Guarda-se, para nada faltar em casa.
Papa terra: Curimbatá, também conhecido por Sopra-fogo.
Papo amarelo: Rifle antigo usado no interior.
Papo de peru: Balão de soprar destinado às festas.
Pari-gato:Crianças, sentadas num banco grande, empurrando um ao outro.
Passagem da Conceição: Localidade histórica de Várzea Grande.
Passação de dia: O mesmo de passar o dia.
Passar batido: Ignorar algo, passar sem ser visto.
Passar o anel: Anel escondido sendo passado entre as mãos.
Passar o dia: Visita que começa com o café da manhã.
Passar um sabão: Repreender.
Pau-de-fumo: Piavuçu.
Pedra canga: De cor avermelhada, comum em Mato Grosso.
Pedra 21: Conjunto de pedras, logo abaixo da Ponte Júlio Müller.
Pegar barriga: Ficar grávida.
Pegar corda: Ser estimulado.
Peixe arrepiado: Quando cozido, a carne fica dura.
Peixe de escama: Tem escama (pacu, piraputanga, dourado).
Peixe-liso: Não tem escama (pintado, cachara, bagre).
Peri-piri: Tipo de junco que nasce em região pantanosa.
Pesca de anzol: Pesca com anzol.
Pesca de armadilha: Pesca com rede, bombas.
Pessoa arisca: Pessoa desconfiada.
Picuá preso: Tradição de vender o diamante para o dono do garimpo.
Pique-esconde: Brinquedo infantil conhecido por Pegador.
Pito Aceso: Entre a Avenida Mato Grosso e início do Araés.
Por demais: Reforço do advérbio demais.
Por essa luz que me alumêa: Juro que é verdade.
Pôr filho fora: Abortar.
Pôr banca: Ficar com pose.
Posar de...: Querer aparecer como...
Prestar sentido: Prestar atenção, acompanhar o raciocínio.
Primeira vista: Direito de primeiro preço do comprador de diamantes.
Primo-irmão: Filho de irmão ou irmã do pai ou da mãe. Primo legítimo.
Primo-segundo: Filho de primo ou de parente distante.
Pular corda: Duas crianças nas pontas e uma pulando.
Pulseira escrava: Bracelete de ouro, roliço.
Puxa-Puxa: Feito com melado de cana de açúcar.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Paeiro repenta o peito: Cigarro de palha muito forte.
Pagar o café: Tomar o café e não sair logo em seguida.
Palanque de cerca: Mourão de cerca mais grosso e maior.
Para cô isso: Para (do verbo parar) com isso.
Paresque...: Parece que...
Passa meu bom barqueiro: Antiga brincadeira, com meninos e meninas.
Passar a largo: Passar de longe.
Passar de arga: Passar de lado.
Passar o ponto a limpo: Anotar no caderno de ponto a limpo.
Passar um pito: Censurar, advertir.
Passar um raspe: Descompor.
Passação de dia: Visita que dura o dia inteiro.
Pá...terra: Expressão popular referente a cair.
Pau-rodado: Não nasceu em Cuiabá ou em Mato Grosso.
Pé-d’água: Descreve muita chuva.
Pé-de-anjo: Tênis branco antigo.
Peiar a vaca: prender a vaca para tirar leite.
Pelotear passarinho: Caçar passarinho.
Per’ainda: Espera ainda.

Período de seca: Geralmente no Outono, quando não chove.
Período das águas: A partir de novembro e até março.
Perder alguém: Morrer alguém da família.
Pessoa casca-grossa: Pessoa grosseira.
Picar a mula: Ir embora logo.
Pilão de socar sebo: Pilão de socar carne.
Podre de chique: Bonito, elegante.
Podre de preguiça: Preguiçoso demais.
Por cima da carne seca: Está com tudo, está mandando.
Por demais de bom: Bom demais.
Por honra de que santo?: Por qual motivo?
Por essa luz que me alomêa: Jurando que não está mentindo.
Por o coração a largo: Preparar-se para receber notícia ruim.
Por um quero: Já está no limite, falta pouco.
Potó: Água de melado.
P’ra besteira: Muito, demais.
P’ra catiça: Demais, exagerado.
P’ra dedéu: Para muitos, para sobrar, em abundância.
P’ra donde?: Para onde?
Pranchei de banda: Caí fora, escapei.
Prás banda de lá: Para o lado de lá.
Prato de ágata: Prato esmaltado.
Pregada junto...: Vizinha de alguma coisa.
Pregar fogo: Ir em cima, reagir logo.
Prêle: Para ele.
Primeiro toque da procissão: Primeiro sinal de que a procissão vai começar.
Prisca daqui: Saia daqui.
Prisca logo: Vá embora logo, depressa.
Professor casca-de-ferida: Professor exigente demais.
Pro-mode-de...: Por causa de ...

LETRA Q
PALAVRAS SIMPLES
Quadra: Época, período, momento.
Quarador: Onde se coloca a roupa ao Sol para secar.
Quarar: Secar a roupa ao Sol.
Quebrando: Bem vestido, com roupa bem passada.
Quebrar: Usar com ostentação, romper ou não cumprir.
Quebrante: Mau olhado.
Queimar: Olhar para trás, correspondendo à paquera, ao flerte.
Queixumes: Reclamações.
Quentura: Calor.
Quibebe: Refogado de mamão verde, xuxu, em pedaços, com ovos cozidos.
Quimba: Ponta de cigarro.
Quirera: Arroz ou milho quebrado.
Quitute: Comida feita por crianças, em panela pequena.
Quizila: Antipatia, aversão, prevenção, questão pessoal.

PALAVRAS COMPOSTAS
Quati mundéo: Quati pantaneiro de cor marrom.
Quebra-torto: Primeira refeição do dia, pequeno almoço.
Que dar sustança: Que alimenta muito.
Queimada de rapadura: Tradicional caramelo cuiabano.
Queimador de campo: No Pantanal, quem é mentiroso.
Queimar louça: Queimar cerâmica no forno.
Quiçaça: Mata fechada, de difícil acesso.
Quintal Grande: Ao redor da Escola Presidente Médici, em Cuiabá.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Quá?: Expressão de espanto e indignação. Como?
Quanto que custa? : Qual é o preço?
Que beleza! : Exclamação de que achou algo bonito.
Que horas são?: Qual é a hora?.
Que qué esse?: O que é isto?
Quebrando de chique: Está muito chique.
Que nem...: Semelhante, igual, tal como.
Que nem cachorro de bugre: Não tem onde ficar, sem paradeiro.
Queimar tijolo: Fazer tijolo em forno quente.
Quem bejô, bejô; quem não bejô, não beja mais: Acabou, terminou. É o fim.
Quem viver, verá: Será confirmado no futuro.
Quetá o facho: Ficar calmo, não avançar mais.

LETRA R
PALAVRAS SIMPLES
Rabanada: Pão embebido em leite e gema de ovo, depois de frito.
Rama: Galhos de um pé de mandioca, que servem de muda.
Ramona: Antigo calçado feminino feito de lona, com sola de borracha, tênis.
Ranho: Secreção do nariz.
Rapelô: Ganhou tudo.
Rasgo: Gastar muito.
Raspador: Apagador de borracha, usado nas escolas.
Raspe: Censura, advertência, carão, pito.
Rata: Gafe, mancada.
Rebingudo: Respondão, malcriado, atrevido.
Rebojo: Redemoinho no encontro das águas do rio.
Rebotalho: Resto, enjeitado.
Rebuçar, ribuçar: Cobrir, agasalhar-se.
Recalcitrar: Teimar.
Recanteando: Passando em diversos lugares.
Rechaçar: Expulsar.
Recolher-se: Acomodar-se, para descansar.
Reculuta: Rês que é devolvida à fazenda de origem.
Refestelar: Desfilar acintosamente.
Refugo: Rejeitado.
Regado: Temperado, acompanhado.
Regateira: Mulher assanhada, safada.
Regrado: No limite, controlado, na base da economia.
Reinando: Mandando, usando e abusando.
Rejume: Regime.
Relampeios: Ocorrências de relâmpago.
Relho: Chicote.
Remanchar: Demorar, fazer devagar, tardar.
Remediar: Tentar uma solução, resolver no que for possível.
Remediado: Tem dinheiro.
Renca: Grande quantidade de pessoas ou objetos, muitos.
Rendido: Quem tem hérnia escrotal.
Rengo: Manco, coxo, capenga.
Requisitado: Muito procurado ou muito convidado.
Ressabiado: Desconfiado.
Resingar: Resmungar, reclamar.
Restaquera: Quem quer ser o que não é.
Renteando: Quase no limite.
Rente: Ao lado, próximo.
Repiquete: Aumento no volume e movimento das águas nos rios.
Ressabiado: Desconfiado.
Ressecamento: Prisão-de-ventre.
Revirado: Picadinho de carne ou fígado engrossado com farinha de mandioca.
Revoltosos: Denominação dada aos participantes da Coluna Prestes (1925-1926).
Rezingar: Resmungar, reclamar.
Rinchado: Barulho provocado pelas rodas do carro de boi.
Riquefoques: Cerimônias.
Rodada: Quando o peixe está de volta ao Pantanal.
Rodar: Navegar, ser levado pelas águas.
Rodeio: Onde o gado é reunido para ser manejado.
Rolimã: Brinquedo infantil, com quatro rodas de rolamentos.
Rompância: Arrogância, bravata, falsa valentia.
Rompante: Gesto exagerado de coragem.
Roncôio ou roncolho: Só tem um testículo.
Rude: Ignorante, sem educação.
Rudo: Ruim de aprender, com pouca inteligência.
Rufar: Bater forte em alguém ou em alguma coisa.
Rusga: Movimento nativista ocorrido em Cuiabá no dia 30/05/1834.

PALAVRAS COMPOSTAS
Rabo-de-Arraia: Traição.
Rancho de palha: Casa rústica.
Rapadura de massa: Não é dura demais.
Raspa de tacho: Corresponde ao final, ao último, caçula.
Rasqueado cuiabano: Ritmo tradicional, com acompanhamento em terças.
Rede de arrastar: Rede redonda, com chumbos, utilizada para pescar.
Rede de espera, de pescar: Armadilha para pescar.
Rede de dormir: Rede destinada a dormir.
Rede lavrada: Rede com bordados.
Regado a...: Temperado com...
Relógio da torre: Antiga denominação do relógio da Matriz.
Remanso do rio: Local onde as águas correm lentamente, quase parando.
Rês torada: Rês que teve a ponta do chifre serrada.
Revirado cuiabano: Comida tradicional, com farinha, carne moída e tempero.
Rio Abaixo: Rio Cuiabá, abaixo da Capital do Estado.
Rio Acima: Rio Cuiabá, acima da Capital do Estado.
Rio Coxipó do Ouro: Nasce na Chapada e deságua no Rio Cuiabá.
Rio Coxipó da Ponte: Parte do Rio Coxipó do Ouro, na sua foz.
Rodeio: Lugar onde o gado se reúne no Pantanal.
Roer piqui: Comer pequi.

EXPRESSÕES REGIONAIS

Rés-por-rés: Na quantidade certa, no limite.
Rino na sha cara: Nem está ligando, rindo na sua cara.
Roda de Porta da Rua: Pessoas em cadeiras na calçada.
Rodear o toco: Falar demais e nada acrescenta. Ser prolixo.
Rodear o tronco: Não sair do lugar.
Rosto finfin: Rosto pequeno e afilado.
Roupa branca: Roupa íntima do homem e da mulher.
Rufar o pau: Bater em alguém com força.

LETRA S
PALAVRAS SIMPLES
Sabença: Inteligência, sabedoria.
Sacudido: saudável, comunicativo, alegre.
Safo: Quem é esperto, sabido.
Saladero: Antigo matadouro, próximo à atual UNIVAG.
Salinas: Baías de água salgada que existem no Pantanal.
Salvar: Saudar, cumprimentar, felicitar.
Saluço: Soluço.
Sapeando: Observando uma festa do lado de fora.
Sapear: Ver a entrada de uma festa e dela não participar.
Sapeca: Saliente.
Sapecado: Quase queimado.
Sapicuá: Sacola dupla, com dois bornais nas extremidades.
Sapinho: Irritação na boca, por fungo, em criança.
Sapiroquento: Alguém com olhos inflados, sem pestanas.
Sapituca: Manifestação de mal estar, chilique.
Sapo: Quem fica sapeando uma festa, do lado de fora.
Saliência: O gesto ou vontade de “querer aparecer”.
Saliente: Alguém que quer ser melhor do que os outros.
Saltaveaco: Tipo de grande banana da terra.
Sarã: Planta típica das margens dos rios, corichos e baías.
Saracotear: Dançar sem rumo.
Sarado: Quem é valente, destemido.
Sarapico: Dança semelhante ao Can-Can no movimento das pernas.
Sarará: Cabelo ruivo, encrespado.
Saranzal: Grande quantidade de sarãs na beira dos rios.
Saroba: Mato muito sujo.
Seboso: Antipático.
Sedinha: Tecido de algodão com fios de seda bem lustrosa.
Sentido: Magoado, ofendido.
Sepóide: Grande.
Serelepe: Esperto, agitado, alegre.
Sésta, siésta: Ligeira cochilada, após o almoço, ao meio dia.
Sezão: Designação popular de malária ou maleita.
Sinapismo: Comportamento de pessoa irritante.
Sinuelo: Gado manso posto à frente da boiada.
Siriema: Ave típica, também chamada sariema.
Sirigaita: Mulher assanhada.
Siriri: Dança típica regional, com viola de cocho, ganzá e tamborete.
Siriri: Rainha e zangão de cupim, que deixam os cumpinzeiros para procriar.
Servir: Atender, ajudar, colaborar.
Sobreano: No Pantanal, rês que já atingiu um ano de idade.
Somana: Semana.
Sondar: Observar, olhar, sem o outro saber.
Songamonga: Vagaroso, lerdo.
Sorte de...: Investida do toureador nas Touradas Cuiabanas.
Sortilégio: Encantamento.
Sortindo: Abastecendo, acrescentando, reforçando.
Suam: Espinha dorsal e ossos próximos.
Suceder: Acontecer.
Sucedeu: Aconteceu.
Sucuri: Bairro de Cuiabá.
Sucuri: Feito de palha, comprido, para fazer farinha de mandioca.
Sucuri: Tipo de cobra variante de sucuriu.
Sumir: Desaparecer.
Supimpa: Excelente, bom demais.
Supitado: Alguém que comeu demais.
Surá: Sem rabo, cotó.
Surrado: Muito velho.
Surrão: Saco de couro para carregar cascalho peneirado.
Surrão: Quem é orgulhoso, soberbo.
Surtir: Abastecer.
Sustância: Substância no sentido de alimento.
Sustancioso: Alimento forte.
Suspiro: Local de saída da fumaça dos fornos.
Surveter: Sumir.

PALAVRAS COMPOSTAS
Sabão de pedra: Sabão em barra.
Saia godê: Saia arredondada.
Saiu tochado: Saiu correndo, em disparada.
Seca poço: Tipo de cobertor, de qualidade inferior.
Sem ação: Sem iniciativa.
Sem graceira: Chateação, idiotice.
Sem expediente: Sem iniciativa, preguiçoso.
Ser arrumado: Acertado, combinado.
Soga: Corda curtida.
Soltar pandorga (pandolga): Brincar ao vento com papel em talas.
Soltar pelote: Lançar pedra com funda.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Sair de arga: Sair de lado, não se comprometer.
Sair de carreira: Sair depressa, sair rápido.
Sair num rompante: Sair bruscamente.
Saltei de banda: Caí fora.
Sambiquira de galinha: Parte carnuda da galinha onde ficam as penas da cauda.
Sangria desatada: Fazendo algo depressa demais.
Se avie: Se apresse.
Se faltar, Sant’Ana intera: Expressão de fé na ajuda que virá da santa.
Segurar a chave: Tradição cuiabana para evitar vômito.
Sem compostura: Grosseiro.
Sem graceira: Sem graça, incomodando.
Sem modos: Mal educado.
Sem graceira: Chatice.
Sentar na graxa: Levar a pior, cair de vez.
Sepo de ...: Grande demais.
Servir de capacho para ...: Servir de besta para alguém.
Serviu de massa de pão: Apanhou demais.
Seu destino vai ser o papo amarelo, desgraçado: Lançando uma praga.
Seu ninguém: Sem prestígio, ninguém mesmo.
Siminina: Essa menina.
Sistrodia: Outro dia.
Soltar bandeira: Sair com a Bandeira nas festas de santo.
Som de taquara rachada: Som fanhoso.
Sossegar o pito: Acalmar, ficar tranqüilo, parar.
Sujo que tá: Está de imagem ruim, sujo de conceito.
Sunga-munga: Imbecil, idiota.

LETRA T
PALAVRAS SIMPLES
Tabual: Vegetação aquática pantaneira que nasce nas baías.
Tacho: Vasilhame de cobre usado para doces.
Tacuru: Fogão rústico de lenha, feito com três pedras.
Tafuiar: Enfiar, meter, introduzir (corruptela de atafulhar).
Taipa: Muro feito de taipa.
Talha: Pote de cerâmica para colocar água nas residências.
Talhar: Atividade de artesão, fazer.
Taludo: Grande, forte, crescido.
Tambo: Onde ficam os bezerros no momento de tirar o leite das vacas.
Tanchim: Parasita do intestino que provoca coceira anal.
Tanger: Tocar um instrumento musical com cordas.
Tapera: Moradia rural abandonada.
Taquara: Uma espécie de bambu.
Taquaral: Onde existe muita taquara.
Tarefa: Trabalho pré-determinado, principalmente no campo.
Tarová: Adoidado, sem juízo.
Tarrafa: Rede arredondada para pescar.
Tarrafear: Pescar com rede de tarrafa.
Tarumã: Planta típica da região, semelhante à jabuticaba.
Tataravô: Corruptela de tetravô, pai do trisavô.
Tatibitate: Pessoa que fala trocando as letras.
Teeira: Tear antigo, de madeira, para fazer rede.
Tecedeira: Quem tece no tear.
Temporão: Filho caçula nascido tempos depois do penúltimo.
Tentear: Economizar, ajustar, equilibrar, até onde for possível.
Tento: Laço trançado de quatro.
Tereré: Mate queimado bebido no chimarrão com água fria.
Terrina: Tijela de louça para servir comida com caldo.
Têsto: Tampa de panela.
Tezar: Repreender em voz alta.
Tibi: Lotado, cheio, completo.
Ticar: Disparar, lançar algo, sair em desesperada correria.
Tigelada: Tipo de pão de ló, recheado com pedaços de banana da terra madura.
Tinhoso: Diabo.
Tijuco: Lama, terra molhada, mole.
Tipi: Pinga, com guiné, curtida por um ano (Semana Santa).
Tiricha: Febre amarela.
Tísico: Tuberculoso.
Tizaina: Chá caseiro.
Tobó: Pedra de diamante ou ouro, de tamanho grande.
Tocador: Quem executa algum instrumento musical.
Tombeira: Caminhão basculante.
Tonto: Bobo.
Tope: Laço de fita.
Tora: Pedaço de madeira grossa, para amansar animais no Pantanal.
Torar: Dividir ao meio, cortar, separar.
Torrada: Bolo de trigo e sal, em forma de argola.
Torrada: Nó feito nas roupas dos companheiros na beira do rio.
Touceira: Metido a importante, exibido.
Toureador: Toureiro das “Touradas Cuiabanas”, O primeiro a enfrentar o boi.
Traia, tralha: Conjunto do que é usado em diferentes atividades.
Tramela: Peça comprida de madeira para portas e janelas.
Traque: Pequenas bombas comuns nos folguedos juninos.
Traquitana ou tranquitanda: Objetos amontoados, algo mal ajeitado.
Traste: Pessoa desprezível.
Travar: Impedir, fechar, cancelar.
Treita: Esperteza.
Treiteiro: Esperto, enganador, não merece confiança.
Trelar, treler: Provocar ou importunar alguém.
Trampo: Serviço.
Trempe: Igual a tacuru, fogão rústico com três pedras.
Trenheira: Objetos de menor valor.
Trincha: Pincel largo.
Triscar: Tocar em algo.
Trôço: Fezes em quantidade.
Troncho: Animal que não tem uma das orelhas.
Troncho: Alguém torto ou defeituoso.
Tropa: Lote de cavalos ou burros.
Trôpego: Quem anda com dificuldade.
Tropeiro: Peão encarregado de cuidar da tropa no Pantanal.
Trens, terém: Objetos diversos.
Trinca: Grupo de pessoas, de três ou mais.
Tristura: Tristeza.
Tristura: Designação pejorativa de procedimento incorreto.
Tronco: Onde prende o gado parar "marcar" ou vacinar.
Tropé: Confusão, barulho, discussão.
Trubufu: Pessoa feia e grosseira.
Trupicão: Tropeço.
Trupicar: Tropeçar, cair.
Trusquiar: Tosquiar ou tosar, cortando o pelo rente.
Tucanaçu: É o maior tucano do Brasil.
Tucura: Boi pantaneiro, trazido pelos espanhóis.
Tufo: Grande quantidade de água.
Tuiuiú: É a ave-símbolo do Pantanal Mato-grossense.
Tundá: Nádegas salientes.
Turrão: Homem grosseiro.
Turuna ou turuno: Touro velho, já castrado.
Turtuviado: Atrapalhado.
Turvar: Sujar. É mais usado quando se refere a água.
Tuteméia: Algo de pouco valor, pouca quantidade.
Tutiço ou toutiço: Parte posterior do pescoço, nuca.

PALAVRAS COMPOSTAS
Tempo brusco: Nublado, tempo chuvoso, nevoento, escuro.
Ter balda: Ter cisma.
Ter cabeça: Ser inteligente.
Ter cisma: Ter desconfiança.
Terra firme: Área não alagável do Pantanal Mato-grossense.
Tirar em...: Pecorrer em determinado tempo alguma distância.
Tirar chapa: Tirar radiografia, tirar abreugrafia.
Titica de galinha: Fezes de galinha.
Tomar conta: Apossar-se de algo.
Tomar chá: Tomar café da manhã.
Tomar chocolate: Beber leite com chocolate.
Tomar choque: Antigo tratamento para problemas do cérebro.
Tomar o ponto: Conferir o conhecimento do estudante.
Torre de Marfim: Nome dado por Dom Aquino ao Palácio Episcopal.
Touro bagual: Boi selvagem.
Tramar contra...: Articular alguma coisa contra alguém.
Tric-tric: Pequeno explosivo, com sucessivos estalos.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Tá empachado: Está com prisão de ventre.
Tá no pano: Está vestido com pano novo e bom.
Taqui procê!: Gesto agressivo.
Tá de cacho com ...: Está namorando, amando, paquerando com alguém.
Ta se achano: Está se julgando o bom.

Tá té no chifre: Está embriagado.
Tá de chico: Está menstruada.
Tchá mãe: Dizer “É sua mãe”, xingando.
Tchá por Deus: Expressão de espanto e indignação.
Tchô...: Desconheço...
Tem mocotó grosso: É forte.
Ter a audácia de...: Ter a coragem de....
Ter a fortuna de...: Ter a sorte de..., ter a felicidade de...
Ter a pachorra: Refere-se a pessoa sem pressa.
Ter fiúza: Ter certeza.
Ter o capricho: Ter o cuidado para fazer bem feito.
Ter imbição: Ter ambição.
Ter muito cajuada com...: Ter muito apego com, ou a, alguém.
Ter gorguio: Ter orgulho
Ter verve: Ter malícia.
Teve o rompante de...: Tomou uma atitude repentina, arrebata.
Tio carnal: Tio legítimo, irmão do pai ou da mãe.
Tirando uma linha: Prestando atenção, observando.
Tirar de casa: Seduzir e fugir com a moça.
Tirar esmola: Pedir esmolar nas festas religiosas.
Tirar o almoço: Colocar o almoço da mesa.
Tirrim, fechou o balaio: Fim de papo. Encerrou tudo.
Toma corno: Quando aplguma coisa saiu errado.
Tomar banho de assento: Lavar apenas as partes pudentas.
Tomar banho de bica: Tomar banho em bicas de água.
Tomar banho de cachoeira: Tomar banho em qualquer queda de água.
Tomar banho de descarrego: Tomar banho com ervas medicinais.
Tomar banho de rio: Tomar banho no rio.
Tomar um pito: Ser repreendido.
Tomar um vento: Mudar de ares, descansar.
Tomou papudo?: Expressão pejorativa, para dizer “bem feito”.
Toque do sino: Badalada do sino da igreja.
Tosse de cachorro: Tossindo muito e rouco.
Tossiu e sumiu: Foi embora muito rápido.
Trasanteontem: Dia anterior ao de ontem.
Trabalhar a reio: Trabalhar demais.
Trabalhar cutucado: Trabalhar sob pressão.
Tratar de...: Cuidar de....
Tuvino?...: Está ouvindo?...



LETRA U
PALAVRAS SIMPLES
Ucia: Fêmea quando está no cio.
Uciêza: Sem-vergonhice, libertinagem.
Ucharia: Mesa ou local para servir salgadinhos e bebidas.
Urinol: O mesmo que penico.
Urucubaca: Feitiço.
Urrar: Gritar alto, forte.

PALAVRAS COMPOSTAS
Usina de açúcar: Engenho de rapadura e açúcar.
Usina de pinga: Destilaria de pinga.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Um bom será: Aceita tudo, acomodado.
Um filete de água: Um pouco de água, quando a água é escassa.
Um quarta-feira: Um tolo, um idiota.
Um "não sei o que diga": Pessoa de grandes qualidades.
Um seu ninguém: Nada vale.
Uma nesga de...: Um pouco de...
Uma Fresta de Sol: Um pouco de Sol.
Urrar de dor: Gritar de dor.

LETRA V
PALAVRAS SIMPLES
Vacada: Nos garimpos, semelhante a muxirum.
Vasanico: Baixa no nível do rio em período de chuva.
Varador, varadouro: Estrada pioneira aberta no capão de mato.
Varapau: Pessoa alta.
Variado: Agitado, aloucado, nervoso, alterado.
Vasqueiro: Raro, escasso.
Vazante: Por onde as águas ficam escoam nas partes baixas do Pantanal.
Vencendo: Encerrando, superando.
Vencer: Concluir.
Venda: Pequeno estabelecimento comercial.
Vendido: Estar por fora do assunto, de tudo.
Ventando: Depressa.
Ventrecha: Costelas ou espinhas maiores do pacu, em postas.
Verdolenga: Fruta quase madura, de vez.
Verduleiro, verdureiro: Vendedor ambulante de verduras e frutas.
Vergastada: Lambada.
Vertude: Virtude.
Verve: Malícia.
Vetusto: Muito antigo.
Vianda: Marmita.
Viciada: Fêmea que está no cio.
Violento: Rápido.
Virote: Haste de madeira para apanhar frutas mais altas.
Vísporas ou loto: Jogo de cartelas, jogo de bingo.
Vitelo: Bezerro com menos de um ano.
Voadeira: Barco ou lancha veloz.
Voltear: Passear.

PALAVRAS COMPOSTAS
Vaca matula: Vaca velha, destinada a abate.
Varanda Cuiabana: Peça central das antigas casas cuiabanas.
Varanda de rede: Renda lateral do pano de rede.
Vento Sul: Vento frio.
Vestido Godê: Vestido de saia rodada.
Viola de cocho: Instrumento musical cuiabano, de quatro cordas.
Virar cambotas: Dar cambalhotas.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Vamo vê: Sem dizer sim ou não, para aguardar.
Vá bater bruacas: Vá andar à-toa.
Vá bugiar: Vá andar por ai, sem rumo.
Vá caçar sapo com bodoque: Vá procurar o que fazer.
Vá mamar na gata: Mandando alguém ir adiante.
Vá tomar até encostar: Insulto, chingamento.
Vai com Deus e a Virgem: Ao despedir-se de alguém da família.
Vai sair de anjo?: Pergunta feita a um guri de cabelo grande.
Vamos chegar: Vamos entrar, cumprimentos de boas-vindas.
Vá tomar mate com garfo: Não torre a minha paciência.
Varar a noite: Atravessa a noite em claro.
Vem cá: Chamar alguém, sem definir quem.
Vender sorvete: Sair de roupa branca em tempo frio.
Vender gazeta: Ponta da camisa masculina fora da calça.
Vender gazeta: Quando a lingerie está aparecendo.
Ventusiar: Expelir gazes pelo ânus.
Verdolengo de fome: Com muita fome, esfomeado.
Verter água: Urinar.
Viche!: Exclamação de espanto.
Vira-casaca: Quem muda de posição política.
Virou sebo e o cachorro comeu: Demorou demais.
Você é gente de quem?: Para saber a origem familiar.
Você trabalha com que?: Qual é o seu serviço?
Voe para lá: Vai rápido para lá.
Vou cercar alguém: Vou esperar alguém passar.
Vou na upa: Vou em cima.
Vou fazer a volta: Manobra de quem vai e volta.
Voncê, vancê: Você.
Vosmecê, vassuncê: De Vossa Mercê, intermediário de Senhor e Você.
Vôte!...: Rejeição, espanto.
Vôte, Deus me livre: Com medo, suplica a Deus.
Voz de taquara rachada: Voz fanhosa e estridente.
Virgem da porteira: Palanque lateral, sempre em par, com quatro ou mais furos, por onde passam as varas que fecham a porteira.

LETRA X
PALAVRAS SIMPLES
Xirimbavo: Serviçal, no sentido pejorativo.
Xiriri (também se escreve chiriri): Pouco, uma ninharia, uma bagatela.
Xixí: Evacuar.

PALAVRAS COMPOSTAS
Xarope de Guaraná: Xarope feito com o guaraná natural.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Não tem.

LETRA Z
PALAVRAS SIMPLES
Zagaia: Lança com cabo de madeira, usada para caçar no Pantanal.
Zagaieiro: Antigo caçador de onças.
Zamboada: Mata de difícil acesso, reunião de gente metida.
Zanzar: Andar sem rumo, de um lado para o outro.
Zarolho: Quem é vesgo, caolho.
Zinga: Vara comprida para empurrar barcos em campos alagados.
Zis: Giz.

PALAVRAS COMPOSTAS
Não tem.

EXPRESSÕES REGIONAIS
Não tem.

POETAS DE MATO GROSSO

1 - ROMANTISMO
O atormentado poeta de Machado de Assis no conto "Uma Excursão Milagrosa" é levado por uma fada a um distante planeta, onde há um palácio com centenas de pessoas manipulando uma massa branca que assumia variadas formas. O poeta pergunta se a massa era uma iguaria destinada a banquetes. A fada responde: “É uma massa cerebral destinada a algumas pessoas privilegiadas, é a "massa quimérica". O poeta tentou e não conseguiu tocar, pois ela logo se transformava em fumaça. Afinal, se convenceu que ela é uma exclusividade do planeta distante onde conviviam a Utopia e a Fantasia. A "massa quimérica" é o sonho dos poetas, que já nascem poetas. Vamos realizar "Uma Excursão Milagrosa" ao "planeta" dos poetas de Mato Grosso, começando pelos grandes nomes do romantismo.

A poesia surgiu em Cuiabá com a chegada do português José Zeferino Monteiro de Mendonça, nascido em 1740 na Freguesia de Santa Isabel, em Lisboa. Ele era professor de Latim e se casou com a Sra. Leonor Ludovina de Morais formando o tronco da Família Mendonça em Mato Grosso. Conforme as "Crônicas do Cuiabá", fez muitas poesias, mas não publicou livros. Um soneto seu, sem título, dedicado ao Dr. Diogo de Lara Ordonhes, pioneiro do teatro em Mato Grosso, é a mais antiga peça poética de Cuiabá, registrada no livro "Poetas Mato-grossenses", de Rubens de Mendonça, seu descendente. Foi escrito no início do período colonial:

"Vosso nome será sempre lembrado
Enquanto em Cuiabá houver viventes,
Passando de umas gentes a outras gentes
A fama do varão o mais honrado.

No Foro tendes vós perpetuado
Instruções sábias, justas e prudentes;
E nos pleitos deixais todos contentes,
Pois sabem que só a bem sois inclinado.

Os que da letra têm conhecimento,
Sem faltar à verdade bem dirão
Que deixais aos vindouros documentos;
Os mais todos, senhor, confessarão
Que a Justiça encontrou em vós assento
E as ciências acharam o seu Platão".

O Romantismo apareceu no início do Século XIX sem regras de composição e de estilo, mas rico em lirismo. Na metade do século estava em Cuiabá, conforme cita Rubens de Mendonça, nos livros "Poetas Mato-grossenses" (1958), "História da Literatura Mato-grossense" (1970) e "Dicionário Biográfico Mato-grossense" (1971). Outra citação feita a respeito é do historiador Lenine de Campos Póvoas, no livro "História da Cultura Mato-grossense" (1982). Quem trouxe o Romantismo para Mato Grosso foi o almirante Antônio Cláudio Soído. Ele chegou em 1857 a Cuiabá, onde faleceu em 12/05/1889. Poeta e escritor, publicou traduções de Lord Byron ("O Pirata") e Victor Hugo ("Para os Pobres"), entre outros, no jornal "Diário do Rio de Janeiro", mas em Cuiabá produziu as primeiras poesias do Romantismo mato-grossense. Em "A Menina Oriental" relembra um amor platônico que deixou no Uruguai. É´ patrono da Cadeira nº 13 da Academia Mato-grossense de Letras. No auge da sua produção, escreveu "Milagre", um ótimo exemplo:

"Quando, senhora, vos envio ou dou-vos
Tão escuro presente,
Que idéia tive eu, que pensamento
Me atravessou a mente?

Do vegetal combusto oferecer-vos
Pulverulenta quarta!...
Mas deixai-me falar e, após, senhora,
Ride até ficar farta.

D'Água do mar, enjoativa, amarga,
Extrai o sol a chuva tão querida;
Em seu laboratório a Terra muda
O vil adubo em condições de vida!

A arte humana, sombra da divina,
também transforma escórias num tesouro,
E vós, que possuís em alta escala,
Podeis mudar esse carvão em ouro".

O primeiro poeta mato-grossense foi Antônio Augusto Ramiro de Carvalho, ótimo jornalista, crítico e humorístico. Nasceu a 28/12/1833 em Cuiabá, onde faleceu em 02/11/1891. Inspetor da Tesouraria de Fazenda, foi removido pelo ministro Silveira Martins para a Província do Pará, sendo exonerado porque não assumiu. Foi reconduzido em 1878. Além de jornalista e poeta, participou da política regional, sendo deputado provincial. Fundou os jornais "Pega Onça" e "Dunda", dedicados ao humorismo, como era do seu estilo. Redator-chefe do jornal "A Situação", do Partido Conservador, e depois fundador do jornal "Quinze de Novembro", após a Proclamação da República, era polêmico e não perdoou nem Dom Pedro II, na data natalícia, encerrando os "Versos Para o dia 2 de Dezembro".

O Romantismo mato-grossense se renovou com Antônio Gonçalves de Carvalho, nascido no Rio de Janeiro em 31/08/1844, formado em Direito pela Faculdade de São Paulo e radicado em Mato Grosso. Foi juiz de Direito da Comarca de Cuiabá, deputado provincial em 1881 e jornalista. Usava dois pseudônimos A. Bueno e Mericano. Faleceu como membro do Supremo Tribunal Federal. É o patrono da Cadeira nº 23 da Academia Mato-grossense de Letras. “Flor de Neve” é uma das suas melhores poesias:

"Se a neve fosse planta e flor tivesse,
Tu serias da neve a flor, gerada
Da fria viração ao tênue sopro
à luz da Lua, aos beijos duma fada.

Se a neve fosse planta e flor tivesse,
Tu serias da neve a flor mais bela
Que brilhando na etérea imensidade
Fanal de Amor -, adamantina estrela.

Se a neve fosse planta e flor tivesse,
Tu serias da neve a flor tão pura!
Ah! Teriam em ti achado os homens
O símbolo da mais cândida ventura!

Se a neve fosse planta e flor tivesse,
Tu serias da neve a flor bendita...
Causarias ciúmes aos próprios lírios
Que dos jardins do céu a brisa agita.

Se a neve fosse planta e flor tivesse,
Tu serias da neve a flor querida,
No meio dos invernos - Primavera,
Sobre o gelado chão - ardor da vida!

Melhor que a flor da neve, és tu, formosa,
Alvo anjinho do céu baixado ao mundo
Para servir de tipo de beleza
E os preitos receber de amor profundo".

Amâncio Pulquério de França foi o primeiro poeta romântico nascido em Cuiabá, em 1846, mas faleceu em Corumbá, hoje Mato Grosso do Sul, em 08/03/1881. Advogado provisionado, foi o principal redator do jornal "O Primeiro de Março". As suas poesias foram publicadas em revistas e jornais sob o pseudônimo "Palmiro". Conforme o historiador Rubens de Mendonça, em "História da Literatura Mato-grossense", ele seguiu o estilo de Casimiro de Abreu. É patrono da Cadeira nº 25 da Academia Mato-grossense de Letras. Em “Outrora e Hoje” encontramos:

"Meu Deus, que gelo, que frieza aquela,
Que indiferença nos olhares seus.
Vejo outra nuvem no horizonte de hoje,
Negra coberta nos azuis dos céus.

Tivera flores meu jardim de outrora,
Tivera rosas de perfume eterno,
Mas hoje as flores sem aroma, secas,
Parecem flores do jardim do inverno.

A Primavera de meus dias, linda,
Sorria leda para o céu de anil,
E o céu faceiro desdobrando - os mantos,
Já teve as falas nas manhãs de abril.

Hoje os cantos que tivera outrora
São tristes cr'oas de cruéis martírios.
Fôra ditoso, já gozara crente,
Vivo perfume dos meus alvos lírios!

Sonhara encantos, deleitosos dias,
Mago castelo de ouropel sonhado;
Feliz eu fôra - mas o manto espesso
Cobriu a tela desse meu passado".

Um dos melhores poetas mato-grossenses é o cuiabano José Tomás de Almeida Serra, que nasceu em 07/03/1866 e faleceu na sua terra natal aos 23 anos, vítima de tuberculose, em 30/03/1889. Escrivão de Feitos da Fazenda Militar e jornalista, no jornal "A Situação", é considerado o corifeu do Romantismo em Mato Grosso. É patrono da Cadeira n.º 34 da Academia Mato-grossense de Letras. O seu soneto "Câmara de Virgem" é citado como exemplo do Romantismo mato-grossense:

"Quando a luz do luar bate-lhe em cheio
Nas formas de primor escultural,
Julgo fitar a Vênus sensual,
Num langue, voluptuoso, devaneio...

No suave ondular do lindo seio,
Julgo ouvir uma música ideal,
Que me transporta à plaga celestial
De uma aurora louçã ao bruxuleio.

Sinto, então, essa febre de desejos
Que nos acende a fruta proibida,
No mais doce e propício dos ensejos...

E vendo-a seminua, adormecida,
Cubro-a de um turbilhão de beijos:
"Morte, morte de amor, melhor que a vida"!

Outro exemplo do Romantismo em Mato Grosso é o cacerense Pedro Trouy, que nasceu em 06/06/1872 e morreu em Santo Antônio de Leverger em 1926. Atuante advogado provisionado, foi promotor público, deputado estadual em diversas legislaturas e jornalista, foi um dos melhores poetas de Mato Grosso. É patrono da Cadeira nº 36 da Academia Mato-grossense de Letras. Em “Outrora”, ele diz:

"Da Primavera ao Sol, que além se erguia
Como uma hóstia de luz em pleno espaço,
Nós nos amamos... Que profundo laço
Nossas almas em flor então unia!

Teu lábio tinha auroras de alegria,
Rosa tinha o vergel, e no terraço
Trilavam passarinhos... Como escasso,
Fugindo, pouco a pouco o tempo ia"!

O cismar de tua alma imaculada
Me deste numa noite constelada,
Quando os astros erravam na amplidão...

Efêmeras ilusões das idas eras!
Teu amor, como a luz das Primaveras,
Feneceu, quando veio outra estação"!

Também atuante jornalista, Frederico Augusto Prado D'Oliveira nasceu em Cuiabá a 22//01/1874 e faleceu no Rio de Janeiro em 29/08/1911. Foi diretor da Imprensa Oficial do Estado e produzia versos satíricos, com o pseudônimo "Zé Capilé". É patrono da Cadeira n.º 38 da Academia Mato-grossense de Letras. Morreu jovem e deixou um ótimo soneto: “Pensando em Ti”:

"Quando me lembro que por um instante,
Ocupei teu ingênuo pensamento,
E traindo talvez teu sentimento,
Fiz corar teu angélico semblante.

Quando penso que num feliz momento
Logrei prender teu olhar brilhante,
E que por mim pulsou teu inconstante
Coração juvenil, de amor isento.

Quando, enfim, na expansão mais delicada
De terna confidência apaixonada,
Das promessas que ouvi, me lembro ainda,

Sinto na alma nascer toda a alegria,
Do meu peito fugir a nostalgia
Da vida presa de amargura infinda".

Elogiado por Monteiro Lobato, e intitulado por Ulisses Cuiabano como "O Poeta da Ilusão", Antônio Tolentino de Almeida nasceu em Rosário Oeste a 24/01/1876 e faleceu em Santo Antônio de Leverger a 24/01/1938, aos 62 anos. Foi promotor de Justiça e jornalista. É patrono da Cadeira nº 29 da Academia Mato-grossense de Letras. De sua autoria, o soneto "Cor Lapidis" foi considerado um dos melhores da literatura mato-grossense:


"Se a mágoa que me fere, assim sanhuda,
Um termo não tivesse, pra curá-la,
Bastava apenas escutar-te a fala,
Se não falasses...ver-te, embora muda.

Pensava assim. Mas, entretanto, cala
A mesma dor no coração aguda;
O teu sorriso o meu sofrer não muda,
O teu desdém somente me apunha-la.

Devo adorar-te? Devo ser cativo?
Hei de por ti morrer se não me queres,
Sacrificando o coração altivo?

Olha, senhora, o nosso amor não medra;
Julguei-te um dia a deusa das mulheres,
Porque não vi teu coração de pedra"!

Pernambucano de Goiana, onde nasceu a 18/05/1884, ainda jovem Otávio Cunha Cavalcanti veio para Mato Grosso e faleceu em Cuiabá a 15/10/1968. Bacharel em Direito pela Faculdade do Recife, foi promotor no Pará e juiz de Direito de Poconé, Rosário Oeste e Cuiabá, chefe de Polícia e desembargador. Publicou suas obras em jornais de Cuiabá e pertenceu à Academia Mato-grossense de Letras, onde ocupou a Cadeira nº 30, da qual é patrono Manuel Esperidião da Costa Marques. Pertenceu a outras escolas literárias, mas em "Êxtases" ele se consagrou como um dos grandes nomes do Romantismo mato-grossense:

"Ontem, pensando em ti, passei o dia,
O dia todo numa inquietude
De sabiá, que o ninho tece e fia,
Antes que o tempo de repente mude.

Embora a crença em nosso amor se escude
Numa esperança, que nos delicia...
Longe de ti, tudo parece rude...
- Galhos quebrados pela ventania...

Longe de ti... a vida é um mar bravio,
Num fragor retumbante de escarcéus;
Junto de ti! - é um leito alvo e macio.

Quando em êxtases fico a te mirar,
- Vejo a terra subindo para os céus...
- Ou os céus descendo para nos levar"!

Líder político, o senador João Villasboas destacou-se como poeta no Romantismo de Mato Grosso. Nasceu em Cáceres a 21/04/1890 e morreu no Rio de Janeiro na madrugada de 03/051985. Foi jornalista, advogado, deputado estadual, deputado federal e senador. Usou dois pseudônimos (J. Vargas e Vitor Jarbas) e produziu várias poesias da melhor qualidade. O soneto "Última Página" é dos melhores, mas sua emoção transborda em "Queimando Velhas Cartas":

"Venho queimar as tuas cartas...Venho
Dar cumprimento a mais um teu pedido.
E junto ao fogo, triste, me detenho
A reler todas elas, compungido.

Queimo-as depois. E o pranto não contenho
Quando tudo é na chama consumido,
Pois me parece que fizeste empenho
Em ver nosso passado destruído...

Enquanto, lentamente, morre o lume,
Dentro em meu peito cresce e toma vulto
A labareda ardente do ciúme,

Por não saber o que tu me escondeste,
Tudo quanto de mim guardaste oculto
E tudo quanto nunca me escreveste"...

Outro grande nome do Romantismo mato-grossense foi o desembargador José de Mesquita. Nasceu a 10/03/1892 em Cuiabá, onde faleceu em 22/06/1961. Brilhou em todas as correntes da literatura mato-grossense. Foi presidente da Academia Mato-grossense de Letras e membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso e sócio-correspondente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Na AML ocupou a Cadeira nº 19, que tem como patrono José Vieira Couto de Magalhães. Da sua imensa obra poética, vale citar "Cópia ou Original":

“Ter teu retrato assim, corpo inteiro, querida,
É para mim, a um tempo, alegria e tortura,
- Alegria, pois vejo o Sol da minha vida,
Que, após tão longa ausência, irradia e fulgura;

Mas tortura, também, tantálica e doida,
Pois que te vendo assim, suave criatura,
- Cópia viva do que és uma rubra ferida
Se me abre dentro d'alma, em imensa amargura.

Como quisera ter-te aqui sempre ao meu lado,
Dia e noite e poder beijar-te como beijo
Tua fotografia, o teu corpo adorado!

Cansado de sonhar, eu aspiro ao real,
E, no meu louco amor, o que ora mais desejo
É que me dês, em vez da cópia, o original"...

Diversos nomes da literatura mato-grossenses se destacaram na poesia. Rubens de Mendonça, notável historiador, foi um dos grandes poetas de Mato Grosso. Na Academia Mato-grossense de Letras ocupou a Cadeira nº 9, cujo patrono é Dom José Antônio dos Reis, o primeiro bispo de Cuiabá. Foi autor de inúmeros sonetos, poemas e quadras, mas do seu acervo literário escolhi uma em homenagem aos poetas do Romantismo mato-grossense que não foram aqui citados: "Felicidade".

"Julguei, acaso, ser felicidade
A grandeza, o poder, a fama, a glória,
Nome aureolado ao Panteão da História
A vã e inútil imortalidade!...

Vi que o poder é uma ilusão inglória...
A riqueza é a força da vontade.
Nome imortal - apenas é vaidade...
A fama neste mundo é transitória!...

Felicidade é coisa diferente,
É uma casinha branca onde a gente
Possa alegre viver com o seu amor!

Felicidade é a mulher querida,
Um filhinho a sorrir - a própria vida,
Vivida no seu cândido esplendor".



2- PARNASIANISMO
Entre o Romantismo e o Parnasianismo há o confronto entre o lirismo do primeiro e o realismo do segundo. A Época Quinhentista chegou a Mato Grosso no Século XVIII, com o Teatro e a Literatura Informativa. Da Época Realista, a cultura de Mato Grosso herdou no Século XIX as poesias Épica e Satírica. Após a Primeira Guerra Mundial surgiram no Estado o Parnasianismo, a Historiografia e a Oratória, do Século XIX ao Século XX. Vários poetas mato-grossenses pertenceram ao Romantismo e ao Parnasianismo. Como exemplo, podemos citar Otávio Cunha Cavalcanti, um dos grandes nomes do Romantismo. Ele ocupou a Cadeira nº 30 da Academia Mato-grossense de Letras. É’, também, um dos maiores nomes do Parnasianismo regional. Ele foi considerado pelo historiador Rubens de Mendonça como sendo o Olavo Bilac mato-grossense. Diante da dificuldade de dizer qual o seu melhor soneto, decidi citar "Destino", somando emoção e realidade:

"Um moço e um velho...Juntos vão seguindo
Pela estrada da vida...andando, andando...
Moço - cabelos pretos - vai sorrindo.
Velho - cabelos brancos - vai pensando...

Talvez o velho a voz do Nada ouvindo...
Talvez o moço em sonhos delirando.
Que haverá no momento que está vindo?
E o relógio do mundo trabalhando...

Futuro só se vê quando é o Passado...
Porque as ondas se quebram no arrecife?
Veio a vida da aurora do pecado.

Moço! - O teu Sol um dia há de tombar,
Só fugirás dos braços da velhice,
Se a morte, antes do tempo, te levar"!

Arnaldo Serra nasceu em Cuiabá a 02/03/1885 e morreu no Rio de Janeiro, em 1943, onde foi agente fiscal e inspetor fiscal do Imposto de Consumo. Dedicou-se à poesia, a crônica e ao jornalismo. Foi sócio-correspondente da Academia Mato-grossense de Letras no Rio de Janeiro. Publicou dois livros: "Páginas Íntimas", de contas regionais, em 1929, e "Aronitas", somente de versos, em 1932. "Bucólicas Cuiabanas" é um soneto que descreve o cotidiano ribeirinho:

“Desliza o belo rio, plácido e sereno,
Às carícias de amor dos verdes saranzais,
Donde a garça gentil distende o vôo ameno.
E o martim-pescador, do galho dos inagais,

Esponta as longas asas, de ambiente pleno,
Acordando-o, parece, a gritos de cristais.
Fere o meio do rio, impávido e pequeno,
E do colo das linfas erguem-se os biguais.

Abica-se ligeiro a trêfega canoa.
O pescador apanha o matim da proa
E isca o anzol. E canta e espraia antiga mágua.

Corre, de vez, o peixe à profundeza a fora.
Ferra o caniço! Em vão. A presa vai-se embora,
E o velhinho, a sorrir, cospe três vezes n'água"...

Dom Francisco de Aquino Corrêa, um dos mais jovens bispos do Brasil, governou Mato Grosso de 22/01/1918 a 22/01/1922. É’ a maior expressão da cultura mato-grossense. Fundou o atual Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso e a Academia Mato-grossense de Letras. Nasceu em Cuiabá a 02/04/1885 e faleceu em São Paulo, onde estava em tratamento de saúde, a 22/03/1956. Considerado o maior orador sacro do seu tempo, pertenceu ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e ocupou a Cadeira nº 34 da Academia Brasileira de Letras. Como exemplo da sua vasta obra poética, incluindo o Modernismo, podem ser citados "Caveira Idolatrada", que dedicou à sua falecida mãe, "Cântico de Alvorada", "Ave, Maris Stella!". Mas, nos versos de "O Lázaro" há emoção e religiosidade:

"O jovem lázaro a janela abrira,
Toda, de par em par;
E viu que o mundo, qual imensa lira,
Palpitava a cantar!

A manhã que raiava, colorida,
Num sorriso de amor,
Era um sarcasmo para aquela vida,
Que vergava inda em flor.

O pobre estremeceu, qual débil haste,
E suspirou assim:
"Que de encantos, meus Deus, tu não criaste!
Mas nada é para mim!"

Outra vez, ele viu o campo santo,
Mudo e frio, ao luar:
Corria em tudo, como um longo pranto,
O orvalho a gotejar.

Ali chirriava, sobre as cruzes nuas,
O mocho assombrador;
E ao longe os cães uivavam pelas ruas
Geladas de estupor!

E eis que, ao som daquele hórrido epicédio,
Seus ais ele une assim:
"Que tristeza, meu Deus! Que horror! Que tédio!
Só isto é para mim!"

Assim dizendo, eleva o olhar magoado,
E vê a cintilar,
Todo florido de astros, lado a lado,
Um céu azul, sem par.

Vê, e sentindo a paz do azul tão terno,
Coar-lhe no interior,
Relembra as esperanças do materno
Credo consolador...

Chora! E, prostrado à luz das infinitas
Estrelas, diz enfim:
"Perdão, meu Deus! O céu azul que habitas,
É também para mim!"

O professor Ulisses Cuiabano nasceu em 04/08/1891 e morreu a 03/01/1951 em Cuiabá. Teve intensa atividade cultural, com destaque para o folclore e a poesia. Pertenceu à Academia Mato-grossense de Letras, onde ocupou a Cadeira nº 16, cujo patrono é Antônio Augusto Ramiro de Carvalho, e ao Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso. Quando Rubens de Mendonça escreveu em 1944 o livro de versos "Cascalhos da Ilusão", Ulisses Cuiabano lhe dedicou o soneto "Garimpeiro das Rimas", em que se referia, no final do último terceto, a outro livro dele, "Garimpo do Meu Sonho":

"Nos golfos, nos monchões, nas brutas grupiaras
Dos ínvios charrascais misteriosos da vida,
Garimpeiro viril rebusca, em dura lida,
Esmeralda e rubi, topázio e gemas caras.

Ei-lo, audaz, a descer nos peraus onde Uiaras
Lhe oferecem, cantando uma canção dorida,
O seio palpitante, dolorosa guarida
De gozos sensuais, de volúpias tão raras.

Depois, à flor da Ninfa, o mineiro aparece,
Trazendo o rebo, e, então, a bateia balança
No desejo de achar a pedra que apetece.

Poeta, como o audaz mergulhador, risonho,
Cascalhos da Ilusão a lavar, com pujança
Lindos versos trazeis dos Garimpos do Sonho".

O desembargador José Mesquita se destacou no Parnasianismo mato-grossense, vindo logo depois de Dom Francisco de Aquino Corrêa. Brilhou no jornalismo, na poesia, na história, no conto e no romance, sem esquecermos do seu empenho na divulgação do folclore regional. Usou vários pseudônimos: Leonel, Altino de Lima, Hélio Maia, Marciano, Luzada Júnior, Jota de Eme e Aurélio Marcos. Um dos seus melhores sonetos é "Ascensão":

"Íngreme e sinuosa, aspérrima e escarpada,
Sob o Sol flamejante ou entre tormentas duras,
Cheia de abismos maus, que abrem fauces escuras,
Vai a estrada coleando, em busca da esplanada.

Sobes. E na ascensão, entre angústia e torturas,
Trons de ira e de despeito, apodos e assuada,
Vês diminuírem mais as coisas na baixada
E se abrirem os céus em mais amplas alturas...

Hás de sempre encontrar urzes pelos caminhos,
Serpes por sob a relva e, nas rosas, espinhos.
Mas nunca te pareça o teu esforço vão.

Lá bem no alto cintila a estrela da bonança,
E além, teu coração, mais do que a vista alcança,
Límpido e claro, o azul da eterna perfeição"!

Outro grande nome do Parnasianismo mato-grossense está Lamartine Ferreira Mendes, que se destacou no Simbolismo. Nasceu em Cuiabá a 07/02/1895 e residiu em São Paulo durante muitos anos. Talvez por isto ele chegou a ser citado como sendo paulista. Foi professor da Escola Normal Pedro Celestino, promotor de Justiça em Três Lagoas e auditor da Justiça Militar da Força Pública de São Paulo. Ocupou a Cadeira nº 31 da Academia Mato-grossense de Letras. Dos seus sonetos, o mais conhecido é "A Palmeira", onde surgem cores do Simbolísmo:

"Olha a palmeira, a sós, cujo bonito,
Esbelto fuste é já tão alto, e cresce,
No desejo talvez doudo, inaudito,
De noivar com o Sol, que resplandece.

Morde-lhe o pé a multidão refece
Das árvores anãs, entre o granito:
E ei-la moça e graciosa, até parece
Um traço, unindo a terra ao infinito.

Cresce, e a nada se anima para a altura
Galgar e bebe luz, numa tonteira,
E abre a espata, abençoando a flor e o espinho.

Na sua aspiração grandiosa e pura,
Homem, imita o exemplo da palmeira:
Subir bastante, mas subir sozinho".

Da. Maria de Arruda Muller, um exemplo da mulher mato-grossense na cultura regional, nasceu a 09/12/1898 em Cuiabá, onde faleceu a 07/12/2002. Ela foi uma das fundadoras do Grêmio Literário Júlia Lopes, que presidiu, e participou do grupo que publicou a revista “A Violeta". Pertenceu à Academia Mato-grossense de Letras, ocupando a Cadeira nº 7, tendo como patrono o Cônego José da Silva Guimarães. Dos seus sonetos, escolhi "Aspiração":


"Bojando a vela sobre o mar sem alma,
Vai, asa branca, ao ritmo do vento.
Circunfletindo, oscila e corta a espalma
Imensidão que espelha o firmamento.

No ar rarefeito treme a leve palma...
Se a tempestade vier, o oceano é cruento...
E ela não sente quando a tarde é calma,
Insídias de borrasca em céu sedento.

Quisera ver minha alma - neste instante -
Como a vela boiar, e se sumindo
No horizonte, indo além, bem mais distante...

E indo a vogar meu pensamento com ela,
Livre da ronda das paixões (que lindo!)
Como a alvura que aclara a branca vela"!

Lembrando que o Parnasianismo teve grandes nomes em Mato Grosso, dedico o final deste título a um dos grandes exemplos da cultura regional, que morreu em 1996, em Niterói: Jary Gomes. Nasceu em Corumbá a 26/11/1913, formou-se em Medicina e gostava demais do jornalismo e da poesia. Foi deputado estadual em 1947 e presidiu a Assembléia Legislativa de Mato Grosso. Com o afastamento do governador Arnaldo Estevão de Figueiredo, candidato ao Senado Federal, ele assumiu o Governo de Mato Grosso durante seis meses e 29 dias, de 02/07/1950 a 31/01/1951. Pertenceu à Associação de Imprensa Mato-grossense e ocupou a Cadeira nº 24 da Academia Mato-grossense de Letras, tendo como seu patrono Aquilino Leite do Amaral Coutinho. Publicou bons livros. O último deles foi "Da Juventude ao Ocaso", que ele me enviou com fraterna dedicatória, encerrando com as palavras: "Desejo-lhe todos os votos de felicidade", datada de 26/01/1990. Desse livro escolhi "Do Fundo D'Alma":

"Ah! Tortura suprema que me invade,
Desespero cruel que crucia,
Tão grande como a dor de uma agonia,
Maior, muito maior do que a saudade.

Nem o pranto se iguala a esta maldade,
Nem lágrima vertida noite e dia,
Nem desventura alguma igualaria
A tortura suprema que me invade!

Ser jovem, ter um mundo de quimera,
Ter n'alma, de ilusões, a Primavera
E sonhos de vitória conquistada...

Ser poeta inspirado, ver o abstrato,
O infinito tocar, louco, insensato,
Ter dito tanto e não ter dito nada"!



3 - SIMBOLISMO
A Época Simbolista teve pouca duração no Brasil e em Mato Grosso, incluindo o Neoparnasianismo. Foi uma reação ao Parnasianismo, que se preocupava com a perfeição e a cadência harmônica dos versos. Começou em 1893, com obras poéticas de Cruz e Souza, e encerrou-se em 1922, durante a Semana de Arte Moderna realizada em São Paulo por Mário de Andrade, que deu origem à Época Modernista. O Simbolismo cuidava do efeito estético e da beleza dos versos, sem o formalismo do Parnasianismo.

Enquanto o Modernismo se consolidava em São Paulo, em Mato Grosso ainda se vivia o período do Simbolismo, com um reduzido grupo, mas de ótima qualidade. Os corumbaenses Pedro de Medeiros e Franklin Cassiano da Silva, o cacerense Oscarino Ramos e o cuiabano Leônidas Antero de Matos são exemplos desse ciclo. Todos eles residiram em Cuiabá e aqui produziram o que havia de melhor no Simbolismo. Outros bons nomes podem ser citados.

Pedro de Medeiros nasceu em Corumbá a 25/11/1881 e faleceu naquela cidade a 12/04/1943. Por ser funcionário do Ministério da Fazenda, residiu durante muito tempo em Cuiabá. Em 1967, seu filho Djalma de Medeiros editou o livro póstumo "Poesias - Crônicas e Comentários". Corumbá, fundada pelo capitão-general Luís de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, está numa área depois escolhida pelo almirante Augusto João Manoel Leverger, o Barão de Melgaço. No Simbolismo de Pedro de Medeiros está uma das mais belas páginas sobre a fundação da "Cidade Branca", com a sua antológica "Lenda Bororo":

"Deus atirou no espaço um punhado de estrelas...
Uma chegou à Terra. Outras tardam ainda.
A que desceu, por certo a mais luzente delas,
Veio e se transformou numa cidade linda!

Desceu, porque do alto o Paraguai parece
Neste ponto uma jóia: escreve em prata um S
Que a estrela imaginara um prendedor ideal
Ligando à serrania o imenso Pantanal.
E como a muita estrela o céu azul não baste,
Caiu. como um brilhante, à procura do engaste!

E Corumbá surgiu, por sobre a terra branca,
Na alegria sem par do gentil casario,
Entre o verde dos montes, - no alto da barranca,
Debruçada a sorrir para o espelho do rio..."

Franklin Cassiano da Silva também nasceu em Corumbá, a 01/05/1891. Veio para Cuiabá ainda jovem e aqui faleceu em 09/06/1940. Foi um dos poucos autores de peças teatrais em Mato Grosso, com destaque para "Cuiabá em Revista", levada à cena em 1940. Foi o primeiro pesquisador da "Linguagem Cuiabana", publicando "Subsídios para o Estudo da Dialectologia em Mato Grosso", em 1921. Pertenceu à Academia Mato-grossense de Letras, onde ocupou a Cadeira nº 16, cujo patrono é Antônio Augusto Ramiro de Carvalho, e ao Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso. Para exaltar a sua presença no Simbolismo, cito: "Estado d'Alma":

"Hoje o dia está triste e o céu nublado.
Vejo em tudo uma lágrima escondida...
Há pelo ar um dobre de Finado
E o tédio a bocejar sinto na vida.

Todo o meu ser se estorce contristado
Numa agonia imensa e dolorida...
Sinto um grande desejo incontentado
De uma beleza vaga indefinida!...

No desejo de um bem, ansiosa e presa,
A receber os beijos da saudade,
Fica minha alma enregelada e fria!...

E é tanta a dor que este meu peito invade
Que nem sei se é do dia essa tristeza
Ou se é minha alma que entristece o dia"!...

O desembargador Oscarino Ramos nasceu em Cáceres a 01/11/1891 e faleceu em Cuiabá a 06/03/1969. Bacharelou-se em Direito pela Faculdade do Rio de Janeiro e retornou a Mato Grosso, sendo promotor de Justiça em Rosário Oeste, Três Lagoas e Cuiabá; juiz-substituto em Três Lagoas e Corumbá; delegado de Polícia em Ponta Porã, Bela vista e Porto Murtinho; consultor jurídico do Estado, juiz de Direito em Cuiabá, Rosário Oeste, Diamantino, Santo Antônio de Leverger e Poconé; presidente do Tribunal de Apelação (Justiça) e do Tribunal Regional Eleitoral, procurador-geral e corregedor-geral do Estado e também jornalista. Ele pertenceu à Academia Mato-grossense de Letras, onde ocupou a Cadeira nº 26, cujo patrono é Joaquim Duarte Murtinho, ao Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso e à Sociedade do Folclore Mato-grossense. Um dos seus melhores sonetos é "Vida Obscura":

"Nasceu, humilde, ao pé de uma montanha,
O regato que vez ali passando.
É tão furtivo o seu correr, tão brando,
Que os pássaros e bichos não assanha.

Povoa-lhe as margens verdes, bando
De aves mansas gozando paz tamanha,
E nas moitas floridas que ele banha
Baloiçam ninhos tépidos noivando.

Igual a este regato é a minha vida...
Ela passa a sorrir despercebida,
Sem sustos, sem invejas, sem clamores.

E assim prossegue sob o teu amparo,
Feliz e obscura à luz de um céu bem claro,
Povoada de gorjeios e de amores".

O cuiabano Leônidas Antero de Matos nasceu em 28/02/1894 e faleceu no Rio de Janeiro em 08/04/1936. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito do Rio Grande do Sul, ele trabalhou com o também advogado Getúlio Dornelles Vargas, em Porto Alegre. Foi um grande orador político e interventor federal em Mato Grosso (15/06/1932 a 12/10/1934). Pertenceu à Academia Mato-grossense de Letras, onde ocupou a Cadeira nº 1, que tem como patrono José Barbosa de Sá.

Sobre ele disse Dom Francisco de Aquino Corrêa: "Leônidas de Matos, essa alma de poeta, cuja musa, desde os tempos de estudante, vive a rendilhar a teia lírica dos versos e prosas, em que lhe desentranha o coração docemente vibrátil". Não publicou livros, mas deixou uma obra poética da melhor qualidade. "Do Acaso e do Silêncio" é um exemplo:

"Nas horas derradeiras
do Sol morrer, o ocaso, evocativo,
Parece uma paisagem simbolista...
É violeta...é sangue...é ouro vivo...
Tem a cor da saudade e da ametista
Das plangentes olheiras...

Longe, em ruínas, a torre secular,
Isolada entre as árvores, levanta
O seu perfil, em cismas dolorosas...
Olha à distância, espia
A ver que crente vem para rezar
A oração derradeira ao fim do dia...

Despetalam-se rosas...
Uma cigarra ao longe canta...
Cai sobre a Terra uma saudade roxa...
Um silêncio de seda...
E a luz vai a fugir...É frouxa...É frouxa,
Debatendo-se aos troncos da alameda...

Ó silêncio da tarde que me exortas!...
Ó silêncio...
... amigo das igrejas mortas...
Das alcovas esquecidas,
Dos beijos que morreram soluçando,
Onde a saudade vai ouvir, chorando,
As palavras perdidas,
Que caladas morreram no silêncio...

Amo-te, hora em que o Ângelus dolente,
Na luz crepuscular,
Chora saudades brancas pelo ar!...
Ó misticismo azul do por do Sol!
Ó pedrarias vivas do arrebol!
Ó quadro simbolista do Poente".

Na vasta obra de José de Mesquita existe um livro de sonetos, "Escada de Jacó", editado em 1945, que no seu conjunto traz a essência do Simbolismo. Ele começa com "Elevação", em que diz: "Homem, busca elevar teu espírito acima/ Do nível inferior da materialidade./ Vê que, dentro de ti, um grande ideal te anima,/ Nesta sêde do Bem e da Felicidade"... E conclui o soneto: "Sê alma e não somente argila e lama escura/ Si, frágil, o teu corpo, exânime, se prostra,/ Suba tua alma a Deus, que é a Perfeição mais pura". E chega às últimas páginas com "Último Degrau":

"Ascendendo, um a um, os degraus desta escada,
Vieste comigo, doce espírito fagueiro,
Desde quando, ao iniciar a custosa escalada,
Juntos demos o passado inda incerto e primeiro.

Longa a ascensão, penosa e dura a caminhada,
Mas nos valeu de muito esse ânimo altaneiro
Com que, vencendo o ingrato e o áspero da jornada,
Incitaste a seguir teu pobre companheiro.

Para o Bem, para o Ideal, de mãos dadas, subimos,
Essa Escada por onde Anjos passando vimos,
E Deus, no Alto, a nos guiar os rumos vacilantes...

Escada de Jacó, da Providência Escada,
Por ela me elevei à celeste esplanada,
No Sonho de Betel de crentes e de amantes!"



4 -MODERNISMO
O Romantismo e o Parnasianismo continuam inspirando até hoje os poetas de Mato Grosso. Em rápida avaliação pode ser dito que nestas duas escolas está uma grande parte da melhor produção poética mato-grossense, vindo o Pré-Modernismo e o Modernismo em terceiro lugar. Embora com o Pós-Modernismo já despontando em São Paulo, em Mato Grosso houve um Pré-Modernismo, onde se destacaram os pioneiros Carlos Vandoni de Barros, Manoel Cavalcanti Proença, Clodoaldo D'Alincourt Sabo de Oliveira e Gabriel Vandoni de Barros, entre outros. Como exemplo do Pré-Modernismo mato-grossense, vale citar a poesia "Xaraés", escrita pelo ainda jovem Manoel Cavalcanti Proença, que nasceu em Cuiabá a 15/07/1905 a faleceu no Rio de Janeiro em dezembro de 1966:

"Ardem topázios pelos céus a fora.
Sobre a pira do ocaso o dia arqueja.
À flor do Pantanal uma asa adeja
E a voz da anhuma, estrídula, clangora.

A vaga azul do Xaraés absorto
Pega fogo no incêndio do Sol-por.
Xaraés verde e azul, oceano morto,
Oceano triste que morreu de amor.

E a luz do ocaso acorda o impulso ardente
De heroísmo que o letargo encerra
Porque tu és, ó Xaraés, ao poente,
O rubro coração da minha terra.

E revivem figuras gloriosas.
Crispam-te a face em fulvos arrepios
A proa das igaras numerosas
Dos Paiaguás membrudos e bravios.

Lá desponta a monção, franjas de espuma
Vêm abrindo o cortejo das canoas
E a tua vaga as beija, uma por uma.
De rudes argonautas te povoas.

Depois? O Paiaguás, e a luta, e breve
A tua água se tinge num instante
De rubro sangue, a tinta em que se escreve
A Epopéia Imortal do Bandeirante.

E ouves a última queixa do precito,
Vendo a torre do sonho que desaba,
Que vai morrer, que é filho... e o olhar aflito
Procura os lados de Araritaguaba.

Aquele outro que bóia sobre as águas
Era noivo. Ainda hoje se pressente
A sua alma a chorar, cheia de máguas,
No grito ansioso da arancuã nubente.

Calma... É noite. Sonolento, absorto,
Tu que, há pouco eras púrpura e esplendor,
Xaraés verde e azul, oceano morto,
Oceano triste, que morreu de amor".

O Modernismo despontou em Cuiabá a 01/06/1939 com a revista "Pindorama", dirigida por Gervásio Leite, Rubens de Mendonça e João Batista Martins de Melo. Lançado em Cuiabá, o "Manifesto do Movimento Graça Aranha" foi assinado por Gervásio Leite, Rubens de Mendonça e Eurícles Mota. Depois surgiram Corsíndio Monteiro da Silva, Carmindo de Campos, Agrícola Paes de Barros, Manoel de Barros, João Antônio Neto, Newton Alfredo de Aguiar, Wanir Delfino César, Agenor Ferreira Leão, Benedito Sant'Ana da Silva Freire, Adauto Dias de Alencar, Ronaldo de Arruda Castro, Sebastião Carlos Gomes de Carvalho, Guilhermina de Figueiredo, Benilde Borba de Moura, Tertuliano Amarilha e outros. Gervásio Leite, que nasceu em Cuiabá a 19/06/1916, publicou na revista "Pindorama" a poesia "Mulher", pioneira e diferente, a começar pela questão da métrica e dos versos. Destacou-se nessa época o jovem Corsíndio Monteiro da Silva, que nasceu em Cuiabá a 24/04/1918. Ele publicou dois livros de poesias: "Está em Silêncio o Jardim de Academus" e "Caminhemos". No último, destaca-se "Incontido Desejo":

"Desejo da humilde liberdade!
Da liberdade de vagar pelas ruas,
Sem horários e sem destino...

Liberdade de ser pobre
E de ser triste.
Liberdade de amar.
Liberdade de ficar em silêncio
E de padecer minhas dores...

Ah! Ainda o incontido desejo de ser isento,
De ser eu mesmo:
Tranquilo, plácido, vago,
Tênue e ausente...
Na doce serenidade do desencanto"...

O único radialista cuiabano que se dedicou ao Modernismo foi Newton Alfredo de Aguiar. No período áureo da Rádio "A Voz d'Oeste" ele entrava no estúdio e vivia um mundo de sonhos nas novelas que escrevia e interpretava. Também escrevia e lia poesias, crônicas e comentários. Gostava também de quadras, líricas ou críticas. Foi um dos destaques do Modernismo em Mato Grosso. Em "Noturno Para o Sonho Quebrado", rompeu as normas poéticas escrevendo sobre a morte:

"Na ansiedade da noite sem palavras
Sou espada contra as dores dos homens todos...
A última estrela,
- A mais alta de todas -
Pisca os olhos
à minha espera...

Está pronta a viagem impossível que eu jamais realizaria...
Há ainda em meus olhos
Um gosto de terra..."

De uma geração mais recente, Ronaldo de Arruda Castro foi brilhante jornalista e deixou uma vasta obra poética. Poderia ser citado o seu poema "O Pacu", mais para Pós-Modernismo. Cito "A Flor dos Aguaçais", com dinâmica própria:

"Não posso apreciar a rosa, cultivada
Pela jeitosa mão do mestre jardineiro.
Por mais que seja bela, é pobre, é deturpada,
É sempre imitação de cunho financeiro.

A essa rosa falsa, enferma e bem-tratada,
Prefiro a flor pagã, de porte alvissareiro,
Que treme e se balouça ao som da chuvarada,
Que brota no negror do insípido atoleiro.

É a flor dos aguaçais...Selvática, viçosa,
Enfrenta a tempestade e cresce bela, inculta,
Em meio ao estridor da luta tormentosa.

E quando a morte atroz perpassa-lhe a raiz,
Ela não chora a dor, e mesmo assim se exulta,
Porque lutou, sofreu, foi livre e foi feliz"!

Com Benedito Sant'Ana da Silva Freire, surgiu um Pós-Modernismo em Cuiabá, quase Concretismo, com características mato-grossenses, exclusivas em todos os sentidos. Em maio de 1965, nas comemorações do Centenário de Nascimento do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon, lançou o poema "Rondon: Silêncio Orgânico das Flores"..., verdadeira revolução na poesia de Mato Grosso. Sempre tivemos uma grande admiração pelo Marechal Rondon.

Estampando a dedicatória "Para Jucá, plantando a nova expressão do jornalismo profissional em Mato Grosso", ele me presenteou em 1973 com uma cópia do "Caderno 8 de Cultura", em oito páginas, com o poema "os oleiros", apenas com letras minúsculas. Para ele, tudo era poema, poema-reportagem, definindo desde “chão/terra/pasto", em letras minúsculas, indo até "cuiabá/cuiabânia/cuiabaninha". Outra das suas inovações foi "japa e outros contos regionais", que ele chamou de prosa, mas que era um autêntico poema de amor ao regionalismo mato-grossense. Ele fazia tudo ao seu modo, individual, diferente. Mantinha apenas a sua devoção a Cuiabá e a Mato Grosso. Ultrapassou o Modernismo e deve estar escrevendo, ainda hoje, mais poemas sem os limites de tempo e espaço, como tanto gostava.

Unindo regionalismo com universalidade, em "os oleiros" está a singularidade do seu plural, assumindo o ego de quem vive da "queimação do tijolo", que "modela o rítmo que prega/ no jeito da pedra/ a pedrada/ pedra de dor/ a cara de pedro/ parceiro/ pedreiro/ no faro do barro/ na liga que trinca,/ trisca o massabarro/ amassando seu cantaro (lar)". Talvez seja o mais longo poema produzido em Mato Grosso, levando o leitor sentir a expressão do autor: "o oleiro transpira o fechado/ na forma da forma/ no forno da fome/ no fogo./ o esteta redimensiona seu tato/ na estrutura primária da vivência/ ola...ria!/ - no galpão o oleiro/ pilha a circuiticidade/ - na rota da atividade/ na roda da idade/ na rede da vida/ o oleiro tati/ é rotatividade do barro./ - no natal/ o oleiro alimenta o santo/musifica a matéria muda".

O poeta cuiabano Manoel (Wenceslau Leite) de Barros nasceu em 19/12/1916, filho de João Wenceslau Leite de Barros e Alice Pompeu de Barros. A sua família mudou-se para Corumbá e depois para Campo Grande, hoje Mato Grosso do Sul. Estudou no Rio de Janeiro, onde concluiu o Curso de Direito em 1949. Ao retornar a Campo Grande em 1960, assumiu o lado pantaneiro. Ainda reside na Capital de Mato Grosso do Sul, mas reserva dois meses para uma viagem anual ao Rio de Janeiro, onde mantém vários vínculos. Suas poesias se tornaram conhecidas nos anos 80 através das colunas de Millôr Fernandes nas revistas "Veja" e "Isto é" e no "Jornal do Brasil". Publicou muitos livros: "Poemas Concebidos Sem Pecado" (1937), "Face Imóvel" (1942), "Poesias" (1946), "Compêndio para Uso dos Pássaros" (1961), "Gramática Expositiva do Chão" (1969), "Matéria de Poesia" (1974), "O Guardador de Águas" (1989), "Retrato do Artista Quando Coisa" (1998), "O Fazedor de Amanhecer" (2001), entre outros. Vale destacar em "Uma Didática da Invenção", na primeira parte do "Livro das Ignorãças":

"I
Para apalpar as intimidades do mundo é preciso saber:
a) Que o esplendor da manhã não se abre com
faca
b) 0 modo como as violetas preparam o dia
para morrer
c) Por que é que as borboletas de tarjas
vermelhas têm devoção por túmulos
d) Se o homem que toca de tarde sua existência
num fagote, tem salvação
e) Que um rio que flui entre 2 jacintos carrega
mais ternura que um rio que flui entre 2
lagartos
f) Como pegar na voz de um peixe
g) Qual o lado da noite que umedece primeiro.
Etc.
etc.
etc.
Desaprender 8 horas por dia ensina os princípios.

IV
No Tratado das Grandezas do Ínfimo estava
escrito:
Poesia é quando a tarde está competente para
Dálias.
É quando
Ao lado de um pardal o dia dorme antes.
Quando o homem faz sua primeira lagartixa
É quando um trevo assume a noite
E um sapo engole as auroras

IX
O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa
era a imagem de um vidro mole que fazia uma
volta atrás de casa.
Passou um homem depois e disse: Essa volta
que o rio faz por trás de sua casa se chama
enseada.
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro
que fazia uma volta atrás de casa.
Era uma enseada.
Acho que o nome empobreceu a imagem".



5 - CUIABÁ EM POESIA
Encerrando esta rápida divagação sobre a poesia mato-grossense, escolhemos os principais versos em homenagem a Cuiabá como tema único. Foram relacionados alguns nomes que têm condições de representar todos os poetas de Mato Grosso, das mais diferentes escolas literárias. O maior nome da poesia mato-grossense é Dom Francisco de Aquino Corrêa. Ele dedicou à sua terra natal o soneto "Cuiabá", a "cidade legendária", "que tem o pedestal de ouro ofuscante". E depois conclui: "O teu futuro está profetizado/ Fostes a cidade de ouro no passado,/ És a Cidade Verde da esperança". Mas, é em "Cidade Verde" que ele chega ao ponto máximo da sua devoção à terra em que nasceu:

"Sob os flabelos reais de mil palmeiras,
Tão verdes, sobranceiras,
És linda como alhures não as há.
Sobre alcatifas da mais verde relva,
Em meio à verde selva,
Eis a "Cidade Verde", Cuiabá!

Guardam-na, frente a frente, quais gigantes,
Eternamente amantes,
Os seus dois morros, e tão verdes são
Que até refletem pálidos verdores
Nos lares sismadores
Que enchem do vale a plácida mansão.

Muitas vezes, na amplidão do céu ridente,
Que tão maciamente,
Sobre a curva do cérulo matiz,
Passa a nuvem dos verdes periquitos,
Gárrulos e infinitos,
Quais chusmas de esperanças infantis.

Passa!...e na calma do horizonte verde,
Que além do azul se perde,
Ela adormece ao ósculo fugaz
Do verde rio lânguido, que a esfrola,
Cantando a barcarola
Infinita dos beijos e da paz.

Salve meu verde ninho, onde, primeiro,
Contemplei o Cruzeiro
E as alvoradas álacres dos sóis!
Tu tens a cor das oliveiras mansas,
Das meigas esperanças
E das láureas eternas dos heróis!

Na tua verdejante flora rude,
Eu canto a juventude
Perpétua dos maternos ubres teus,
E sonho essa visão esmeraldina,
Que se nos descortina
No livro santo, quando pinta os céus.

Como tu, não tem, não, tantas grinaldas
De vivas esmeraldas.
A Úmbria verde, que nem a verde Erin;
Mais rica do que o fúlvido Eldorado,
Tens o encanto sagrado
De uma Canaã melíflua para mim.

Não há tesouro, que teu preço iguale!
Tudo o que mundo vale,
A par de ti, em lodo vil se esvai;
Pois tens o que há de mais sagrado e terno,
O túmulo materno
E esses cabelos brancos do meu pai!

Quem dera, ó Deus, que à luz da tua face,
Minha alma retornasse.
Como batel que volve ao seu fanal,
Embalada nas virides bonanças.
Desse mar de esperança,
Em que se banha o meu torrão natal!

Quero dormir à sombra da verdura
Da Pátria, numa pura
Região de Primaveras imortais,
Onde paire, qual plácida e infinita
Flor, essa cruz bendita
Da religião divina dos meus pais!

E quando, livre, pelo azul infindo,
For minha alma subindo,
Possa ela ainda contemplar, meu Deus,
As verdes palmas dos gentis coqueiros,
Como dedos fagueiros,
A dar-lhe, trêmulas, o extremo adeus!

Salve, cidade verde! A ti, meu berço,
Melhor do que o universo,
Eu de saúdo ao ósculo fugaz
Do rio verde-negro, que esfrola,
Cantando a barcarola
Infinita dos beijos e da paz"!

Em todas as manifestações da cultura mato-grossense está a presença magistral de José de Mesquita, um dos seus maiores nomes em diversas escolas literárias. Ele dedicou "Civitas Mater" à sua amada Cuiabá dentro dos padrões tradicionais de qualidade e esmero, exaltando a histórica da Vila Real do Senhor Bom Jesus:

"Meu carinho filial e meu sonho de poeta
Vêem-te, ó doce cidade ideal dos meus amores,
Em teu plácido vale, entre colinas, quieta,
Como um Éden terreal de encantos sedutores.

Tuas várzeas gentís estreladas de flores
Sagram-te do sertão a Princeza dileta
E o Sol te elege, quando, em íris multicores
Na esmeralda dos teus palmares se projeta.

Nenhuma outra cidade assim à alma nos fala,
Dos teus muros senis a tradição se exala
E a nossa História inteira em teu brasão reluz.

Ainda hoje em teu ambiente, ó minha urbe querida,
Paira dos teus heróis a sombra estremecida
- Nobre Vila Real do Senhor Bom Jesus"!

Rubens de Mendonça tornou-se conhecido como um dos maiores historiadores de Mato Grosso, mas é um dos pioneiros da poesia no Modernismo mato-grossense. Foi o poeta que mais se inspirou na Capital mato-grossense. "Lenda Cuiabana", "Saga da Cidade Natal" e "Alavanca de Ouro" são de sua autoria. Com o título "Cuiabá", foram dois poemas. Num deles, modernista, diz que "O Bandeirante calçou a bota de sete léguas/ E foi invadindo o sertão bruto. /Espantando onças, cobras, jacarés! Por onde passava ia deixando no caminho sementes de cidades...". Mas, no soneto "Cuiabá", com o maior esmero, ele reuniu as escolas literárias conhecidas para descrever o seu amor à terra natal:

"Gloria a ti Canaã do audaz Pascoal Moreira
Que escreveu a maior epopéia da história,
Quando um dia ao partir à frente da bandeira
De "Tordesilhas" rompe a linha divisória...

Ave! A ti Cuiabá, terra boa e altaneira!
Que te importa dos maus a fúria transitória,
Se podes orgulhar a Pátria Brasileira
Ostentando imortal - um passado de glória!...

Glória a Miguel Sutil! Glória, pois aos teus filhos,
Que na guerra ou na paz desconhecem empecilho.
Glória ao teu ouro bom - glória ao teu céu azul!

Bendita, sejas tu, ó minha terra amada...
Tu que és do meu Brasil a pérola engastada
- Em pleno coração da América do Sul".

Em "Cuiabá", o jornalista Carmindo de Campos concentrou uma forte emoção. Os seus versos são simples mas alcançaram rara popularidade, pois exalta todo o encanto da “Cidade Verde”. O seu autor nasceu em Cuiabá a 28/05/1898 e nela faleceu a 28/05/1973:

"Cuiabá, minha velha e lendária cidade.
Você está remoçando...
Está ficando mais bonita ...
Está ficando mais, muito mais, catita.
Se Pascoal Moreira Cabral visse você agora,
Garanto, não ia mais embora,
Nem Pires de Campos, nem outro bandeirante,
Porque você minha velha, está fascinante!

Você bem merece a liderança
Desse velho e valente Mato Grosso.
Você tem um quê que prende a gente.
Você, minha velha, é um colosso!...
Tudo em você, tudo, recende a Brasil.
Seus morros, seu rio piscoso, o céu de anil.
Seu rio é seu pai, e igual não há.
Foi ele quem lhe deu esse nome poético: Cuiabá!

Oh minha cidade linda, não sei porque,
Quando sinto imensas saudades de você
Sinto saudades do pacu, do bagre, da piraputanga,
Do licor de pequi, doce de caju e da manga!
Sinto saudades desse calor sadio,
Que às vezes é melhor, muito melhor que o frio!
Oh minha cidade linda, que igual não há:
Oh minha velha e idolatrada Cuiabá"!

O baiano Rubens Mendes de Castro faleceu em Cuiabá. Foi um dos melhores poetas mato-grossenses. Tinha preferência por quadras e com elas se imortalizou embora a morte não tenha permitido a sua posse na Cadeira n º 3 da Academia Mato-grossense de Letras, para onde foi eleito em 1997. Nos Primeiros Jogos Florais de Cuiabá, disputou com várias quadras. Conseguiu o primeiro lugar com:

"Cuiabá nos diz sorrindo,
Mostrando a porta da rua:
Meu filho, seja bem-vindo,
Pode entrar... a casa é sua"!

Ficou em sexto lugar com:

"Doce murmúrio de fonte,
Linda poesia a bailar...
- Cuiabá! O rio... a ponte,
Meu Sol... meu chão... e meu lar"!

Nos versos de "A Cuiabá Pátria do Meu Coração", o poeta Benedito Sant’ana da Silva Freire manteve o seu tradicional estilo, embora estivesse ainda na fase inicial do seu Modernismo. Conseguiu ligar a beleza de Cuiabá com o mar num poema que ele transformou em hino de saudade do jovem que havia deixado a terra natal para estudar no Rio de Janeiro, como era comum naquela época:

"Feliz de quem zarpa pelo mar,
Como o jangadeiro,
O nordestino cheio de ilusões,
Que tem nas vagas bravias
A esperança de ser levado a um porto seguro...
Que tem no sal das ondas do mar
O consolo amigo para seu pesar...
E que vê no cristal das areias das praias,
- Tal como um cisne solitário
Espanejando as níveas plumas,
A silhueta querida de quem fica...

Feliz de quem zarpa pelo mar,
E segue balouçando por sobre as ondas
Numa eterna infância de poeta,
Numa infinita presença de vida.

Feliz de quem zarpa pelo mar,
E não vê e nem sente,
Fugindo no reflexo das asas do avião,
- Como lágrimas coloridas de saudades,
A paisagem verde e colonial
Da terra em que nasci"!

Entre os expressivos nomes de Modernismo mato-grossense destaca-se o médico Ivens Cuiabano Scaff, autor do livro "Uma Maneira Simples de Voar". Ele escreve poemas de amor a Cuiabá até em receituário. "ABC de Cuiabá" é um exemplo. Foi composto para uma estudante, cujo nome ele esqueceu, recitar na escola.

"Com a letra C de Cuiabá
Escrevo também Chapada, Cerrado e Coxipó.
Pego o U das usinas dos nossos avós usineiros
Das ubás dos bisavós canoeiros
E convido a Uiara pra uma festança.

0 I eu uso duas vezes no piqui
Três vezes no siminina
Que se ouve só aqui.

O B de todos os bairros,
Baú, Bosque, Barcelos,
Compõe também a palavra bem querer

O primeiro A é de Antiga
O último é simplesmente o início
da simples palavra Amor".

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____. Estudos de Philologia Mirandesa. Lisboa: vols. I, II, Imprensa

Nacional, vols. I e II, 2ª ed. Facsimilada, 1992 e 1993, com apresentação e

assistência de Dr. António Maria Mourinho, Câmara Municipal de Miranda

do Douro.



VIDAL, José. Metendo o bedelho. Cuiabá, Edição própria, 2004. 70 p.



DO AUTOR:



JUCÁ, Pedro Rocha. A Imprensa Oficial em Mato Grosso. Cuiabá: Imprensa

Oficial do Estado de Mato Grosso, 1986.



JUCÁ, Pedro Rocha. Personalidades da História de Mato Grosso. Cuiabá:

Univesidade Federal de Mato Grosso - NDIHR, 1987.



JUCÁ, Pedro Rocha. Os Símbolos Oficiais de Cuiabá. Cuiabá: Secretaria

Municipal de Cultura e Turismo – Secretaria Municipal de Educação, 1990.



JUCÁ, Pedro Rocha. Os Símbolos Oficiais do Estado de Mato Grosso. Cuiabá:

Editora Memórias Cuiabanas, 1994.



JUCÁ, Pedro Rocha. Exemplo e Palavra de Jornalista. Cuiabá: Editora Memórias

Cuiabanas, 1995.



JUCÁ, Pedro Rocha. Júlio Müller, Um Grande Estadista. Cuiabá: Editora

Memórias Cuiabanas, 1998.



JUCÁ, Pedro Rocha. Diário Histórico de Mato Grosso. Cuiabá: Editora Memórias

Cuiabanas, 2002. Livro virtual.



JUCÁ, Pedro Rocha. Os Jucás dos Inhamuns. Cuiabá: Editora Memórias

Cuiabanas, 2002. Livro virtual.



JUCÁ, Pedro Rocha. Mato Grosso de hoje e sempre - I. Cuiabá: Editora Memórias

Cuiabanas, 2003. Livro virtual.



JUCÁ, Pedro Rocha. Mato Grosso de hoje e sempre - II. Cuiabá: Editora

Memórias Cuiabanas, 2004. Livro virtual.



JUCÁ, Pedro Rocha. Mato Grosso de hoje e sempre - III. Cuiabá: Editora

Memórias Cuiabanas, 2005. Livro virtual.



JUCA, Pedro Rocha. Da Linguagem Cuiabana. Cuiabá: Editora Memórias

Cuiabanas, 2007. Livro virtual.

3 comentários:

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